Comissão de Justiça quer acelerar o processo para cassar Zambelli

Se Roberto Carlos quiser falar com Deus, tem de consultar Gilberto Gil?

Gilberto Gil canta com Roberto Carlos e faz homenagem a Preta Gil em último  show em SP - Novabrasil

Roberto Carlos e Gilberto Gil são grandes amigos

Paulo Peres
Poemas & Canções

Em 1981, Roberto Carlos pediu uma canção a Gilberto Gil, para gravar. “Do que eu vou falar?” – perguntou-se Gil. “Ele é tão religioso… E se eu quiser falar de Deus? E se eu quiser falar de falar com Deus?”

Com esses pensamentos e inquirições,  Gil deu início a uma exaustiva enumeração: ‘Se eu quiser falar com Deus, tenho que isso, que aquilo, que aquilo outro’. E saiu de casa. À noite, voltou e organizou as frases em três estrofes.

Roberto não gravou, porque sua concepção de Deus é diferente. Elis Regina e o próprio Gil gravaram. Hoje em dia, mais de três décadas depois, Gil é pouco religioso, mas de vez em quando reza um “Pai Nosso”, por via das dúvidas.

SE EU QUISER FALAR COM DEUS
Gilberto Gil

Se eu quiser falar com Deus
Tenho que ficar a sós
Tenho que apagar a luz
Tenho que calar a voz
Tenho que encontrar a paz
Tenho que folgar os nós
Dos sapatos, da gravata
Dos desejos, dos receios
Tenho que esquecer a data
Tenho que perder a conta
Tenho que ter mãos vazias
Ter a alma e o corpo nus

Se eu quiser falar com Deus
Tenho que aceitar a dor
Tenho que comer o pão
Que o diabo amassou
Tenho que virar um cão
Tenho que lamber o chão
Dos palácios, dos castelos
Suntuosos do meu sonho
Tenho que me ver tristonho
Tenho que me achar medonho
E apesar de um mal tamanho
Alegrar meu coração

Se eu quiser falar com Deus
Tenho que me aventurar
Tenho que subir aos céus
Sem cordas pra segurar
Tenho que dizer adeus
Dar as costas, caminhar
Decidido, pela estrada
Que ao findar vai dar em nada
Nada, nada, nada, nada
Nada, nada, nada, nada
Nada, nada, nada, nada
Do que eu pensava encontrar

Defensoria pede rejeição da denúncia de que Eduardo Bolsonaro coagiu o STF

A verdadeira segurança se constrói com investimento social e presença do Estado

É preciso discutir o peso real da dívida pública, mas o Brasil insiste em ignorar

Charge reproduzida do Arquivo do Google

Pedro do Coutto

Na entrevista concedida  na última sexta-feira à jornalista Natuza Nery na GloboNews, a economista Zeina Latif chamou atenção para um ponto que raramente é compreendido de forma clara pelo público: o tamanho do endividamento brasileiro.

Disse que a dívida bruta do país alcança cerca de 78% do Produto Interno Bruto, o que é tecnicamente correto, mas percentuais, quando não traduzidos em números absolutos, acabam criando uma discussão abstrata, distante da realidade concreta.

DÍVIDA BRUTA – Para que essa proporção seja compreendida, é necessário atravessar o cálculo: o PIB brasileiro está hoje em torno de R$ 10 trilhões; portanto, a dívida bruta se aproxima de R$ 7,8 trilhões. É um montante que não se paga da noite para o dia, tampouco sem uma estratégia de crescimento consistente. Quanto maior a dívida, maior o peso dos juros; quanto mais se gasta com juros, menos sobra para investimento em áreas essenciais como infraestrutura, saúde, educação e desenvolvimento produtivo.

É nesse ponto que entra a política monetária. O Banco Central, agora sob a presidência de Gabriel Galípolo, mantém a taxa de juros em patamar elevado para garantir atratividade dos títulos públicos, controlar expectativas de inflação e assegurar que o governo consiga rolar sua dívida. Juros altos, porém, têm um custo social.

Encarecem o crédito, inibem o investimento produtivo e limitam a capacidade de expansão do setor privado. A economia real — aquela que pesa no bolso do trabalhador, no preço do alimento, no financiamento da casa, na pequena empresa que decide contratar ou não — sente esse impacto de forma direta.

TENSÃO POLÍTICA – É por isso que o tema dos juros volta e meia gera tensão política: o governo Lula, que criticou duramente Roberto Campos Neto por manter taxas elevadas, agora vê que a troca de comando não significou automaticamente uma mudança de orientação. Há aí um desconforto compreensível, porque a política monetária segue uma lógica que não se move no ritmo das expectativas políticas.

Ainda assim, há sinais de dinamismo na economia. O desemprego caiu para 5,6%, segundo o IBGE, o menor índice em anos, representando cerca de 6 milhões de pessoas sem trabalho — número ainda alto, mas muito inferior aos quase 14% registrados durante a pandemia.

Além disso, o rendimento médio subiu para cerca de R$ 3.500, o maior da série histórica desde 2012, indicando que parte das famílias voltou a ter algum fôlego no consumo. Isso não significa prosperidade plena, mas indica um país que respira, que se reorganiza, que tenta retomar seu ritmo.

DIMENSÃO REAL – O ponto central, no entanto, permanece: indicadores percentuais, sozinhos, não revelam a dimensão real dos problemas ou avanços. Como dizia Roberto Campos, números só ganham sentido quando traduzidos em valores absolutos. E essa tradução é indispensável para que a sociedade compreenda para onde o país está indo e quais escolhas serão necessárias.

O Brasil, portanto, vive um paradoxo: ao mesmo tempo em que melhora indicadores sociais importantes, carrega uma âncora fiscal pesada e difícil de administrar. Não é possível sustentar indefinidamente juros elevados e dívida crescente sem comprometer o futuro.

Também não é possível resolver o problema com ajustes bruscos que destruam empregos e renda. O caminho exige crescimento sustentado, produtividade, reforma tributária eficiente e, sobretudo, planejamento de longo prazo — algo que ultrapassa governos, ciclos eleitorais e interesses momentâneos. A questão que se impõe, então, é simples, ainda que difícil: queremos continuar discutindo percentuais ou finalmente encarar o tamanho real da conta?

Rótulo de terrorista para o CV tem peso político e diplomático, alertam autoridades

Bolsonaro pode obter “empate” no STF com recurso baseado no voto de Fux  

O caso no STF que deve entrar recurso de Bolsonaro na trama golpista – CartaCapital

Defesa de Bolsonaro vai apresentar recurso infringente

Carlos Newton

Depois de sua votação de 13 horas, em que inocentou o ex-presidente Jair Bolsonaro de participação no golpe de Estado, o ministro Luiz Fux continua levantando polêmicas no Supremo Tribunal Federal. Na semana passada, ele pediu para fazer ajustes gramaticais no voto que proferiu justamente neste julgamento, e isso vai atrasar a decisão final do STF.

Fux já tinha liberado seu voto para a elaboração do julgamento, mas mudou de ideia na última semana e solicitou o documento novamente, para fazer ajustes. A informação foi divulgada inicialmente pela “Folha de S.Paulo” e divulgada pela CNN Brasil.

ALEGAÇÃO TOLA – A justificativa oficial apresentada por Fux foi a “necessidade de realizar ajustes gramaticais” no extenso voto, numa alegação que logo gerou questionamentos, já que o pedido do ministro impediu a conclusão e publicação do acordão que decidiu pela prisão de Bolsonaro e dos outros sete militares que foram considerados membros do núcleo central do golpe.

A revisão a ser feita por Fux atrasará a publicação, impedindo a possibilidade de prisão de Bolsonaro numa penitenciária, condenado a 27 anos e 3 meses de prisão por crimes contra a democracia.

O Regimento do Supremo prevê 60 dias para publicação do acórdão e depois passam a correr os prazos para embargos de declaração, quando a defesa ou a acusação pedem para esclarecer algum ponto do julgamento, ou embargos infringentes, quando a decisão não é unânime.

HAVERÁ RECURSO – É certo que a defesa de Bolsonaro apresente embargo infringente, com base no voto de Fux. Trata-se de um recurso criminal, previsto no artigo 609 do Código de Processo Penal, que cabe contra um acórdão (decisão colegiada) não unânime, desfavorável ao réu.

O objetivo é garantir que o ponto divergente seja reexaminado por outro órgão colegiado, no caso, a Segunda Turma do STF, o que permitiria a correção de erro jurídico e garantiria maior segurança ao julgamento.

A interposição desse embargo infringente deve ser feita em 10 dias da publicação do acórdão e é um recurso exclusivo de defesa. 

SEM CHANCE – Hipoteticamente, Bolsonaro poderá até não ser condenado pela Segunda Turma, com dois votos a favor dele (Nunes Marques e André Mendonça) e dois votos contra (Gilmar Mendes e Dias Toffoli). Mesmo assim, prevalecerá a decisão da Primeira Turma, por não ter sorte maioria para alterá-la. A situação, portanto, não é de “empate” no sentido de paridade, mas de que a decisão-base será mantida, porque o recurso não foi recolhido por maioria. 

Em tradução simultânea, nada de novo no front ocidental. Bolsonaro deve cumprir pelo menos um sexto da longa pena, em prisão domiciliar, porque Alexandre de Moraes não fez a burrice de mandar o ex-presidente para a Penitenciária da Papuda, embora todos saibam que esse ministro é muito capaz, no sentido de que é capaz de tudo, exigir assim.

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P.S.
A dúvida é saber se Fux conseguirá votar na Segunda Turma. Se tiver esse direito, seu voto será confirmado por André Mendonça e Nunes Marques, garantindo a absolvição de Bolsonaro. É uma possibilidade real, que vamos analisar amanhã. (C.N.)

Tralli no lugar de Bonner é mais uma tremenda mancada da TV Globo

César Tralli deixa 'Jornal Hoje'; veja o presente que ele ganhou - Contigo!

Tralli terá a missão de substituir o melhor âncora do país

Vicente Limongi Netto

O clima era de furo internacional. Faltaram balões e salgadinhos. A emoção tomou conta dos estúdios platinados. A TV Globo antecipou o halloween. Parecia hora de um longo recreio no mundo da bruxaria. Abissal pantomima.

Saiu William Bonner, entrou Cesar Tralli. O jornalismo brasileiro está salvo. Palmas, lágrimas, abraços, beijos marcaram os novos caminhos do Jornal Nacional.

ABISMO DO FRACASSO – O frio Bonner, como ele mesmo se definiu, estava mais feliz do que pinto no lixo. Vai poder voltar a andar na rua mais sossegado. Tralli, que adora falar pelos cotovelos depois de cada notícia, levará a audiência do JN ao abismo do fracasso.

Bonner gostava de fazer matérias nas ruas. Trabalhou bem, cobrindo as enchentes no Rio Grande do Sul. Tralli não fica atrás. Cobriu terremoto na Turquia e prisão de traficante internacional.

Telespectadores vibrariam, vendo o falante Tralli voltando a trabalhar nas ruas tranquilas do Rio de Janeiro. Cobrindo, ao vivo, por exemplo, as batalhas sangrentas da polícia nas favelas cariocas contra facções de bandidos, traficantes e assassinos. Pauta desafiadora para Tralli. 

SUPERTÉCNICO – Amado e idolatrado pela torcida, o português Abel Ferreira é o cara. Tem o apoio e respeito dos jogadores. Não mastiga chiclete. Cospe fogo quando o Palmeiras é prejudicado em campo. Não para de levar o Palmeiras a conquistas gloriosas e heroicas. Não usa paletó. Prefere moletom e tênis. É muito mais técnico do que Carlo Ancelotti. Em todos os sentidos.

Quando muitos estavam empolgados com a fama de Ancelotti, Abel chegou a ser cotado para comandar a seleção. Foi vencido pelo lobby de ex-jogadores, junto a CBF, que trabalharam com ele, no futebol italiano.

NO OLHO MÁGICO – Hoje, seguramente, diante dos jogos medíocres da seleção, conseguindo no olho mágico, a duras penas a classificação para a Copa do Mundo, aqueles que cegamente idolatravam Ancelotti agora estão arrependidos.

Ancelotti não é de nada. Tem muitos títulos, mas Abel Ferreira também tem. É notável a força e a fibra que Abel passa aos jogadores. Não existe jogo perdido para eles. Exemplo marcante: agora mesmo, entrando em campo perdendo de 3 a zero, contra o LDU, do Equador, virou o jogo. Venceu com sensacional 4 a 3. 

Façam pesquisa, hoje, entre torcedores, jornalistas e jogadores, para ver qual é o melhor para comandar a seleção. Abel ganharia de goleada do mafioso Ancelotti.  

Apoio à democracia no Brasil convive com nostalgia por soluções autoritárias

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Paulo Mendes Campos tinha momentos de uma poesia autodestrutiva

Não te espantes quando o mundo... Paulo Mendes Campos - PensadorPaulo Peres
Poemas& Canções

O jornalista, escritor e poeta mineiro Paulo Mendes Campos (1922-1991), no poema “Balada do Homem de Fora”,  divaga que o mundo foi feito para quem dele tire proveito.

BALADA DO HOMEM DE FORA
Paulo Mendes Campos

Na alma dos outros há
searas de poesia;
em mim poeiras de prosa,
humilhação, vilania.

O pensamento dos outros
ala-se em frases castiças;
o meu é boi atolado
em palavras movediças.

No gesto dos outros vai
a elegância do traço;
no gesto torto que faço
surge a ponta do palhaço.

O trato dos outros tem
desprendimento, altruísmo;
venho do ressentimento
para os brejos do egoísmo.

O amor de muitos floresce
em sentimento complexo;
mas o meu é desconexo
anacoluto: do sexo.

Na face dos outros vi
a sintaxe do cristal;
na amálgama dos espelhos
embrulhei o bem no mal.

A virtude contra o crime
é um cartaz luminoso
dos outros todos; mas eu
posso ser o criminoso.

Os outros brincam de roda
(carneirinho, carneirão);
são puros como a verdade;
mas eu minto como um cão.

Há quem leia Luluzinha,
há quem leia pergaminhos;
leio notícias reversas
nos jornais de meus vizinhos.

Os outros ficaram bravos
ao pôr de lado o brinquedo,
bravos, leais, sans reproche;
mas eu guardei o meu medo.

Encaminha a mente deles
uma repulsa moral;
na minha pulsa o High Life
do mais turvo Carnaval.

Todos foram tão bacanas
na quadra colegial;
só eu não fui (mea culpa)
nem bacana, nem legal.

O trem dos outros tem
um ar etéreo e eterno;
às vezes ando vestido
como um profeta do inferno.

Muitos voam pelas pautas
que se desfazem nos astros;
amei Vivaldi, Beethoven,
Bach, Debussy, mas de rastros.

Certos olhos são vitrais
onde dá a luz de Deus;
Deus me deu os meus e os teus
para a dor dar-te adeus.

Há tanto moço perfeito
like a nice boy (inglês);
eu falo mais palavrões
que meu avô português.

Os outros são teoremas
lindos de geometria;
eu me apronto para a noite
nos pentes da ventania.

Para quem foi feito o mundo?
Para aquele que o goze.
Como gozá-lo quem gira
no perigeu das neuroses?

Copiei com canivete
este grifo de Stendhal:
“Nunca tive consciência
nem sentimento moral”.

Faço meu Murilo Mendes
quanto à força de vontade:
“Sou firme que nem areia
em noite de tempestade”.

Há gente que não duvida
quando quer ir ao cinema;
duvido de minha dúvida
no meu bar em Ipanema.

Outros, felizes, não bebem,
não fumam; eu bebo, fumo,
faço, finjo, forço, fungo,
fuço na noite sem rumo.

Outros amam Paris, praias,
cataventos, livros, flores,
apartamentos – a vida;
eu nem amo meus amores.

Os outros podem jurar
que me conhecem demais;
quando acaso penso o mesmo,
o demônio diz: há mais…

A infância dos outros era
o céu no tanque da praça;
a minha não teve tanque,
nem céu, nem praça, nem graça.

Até na morte encontrei
a divergência da sorte:
a deles, flecha de luz,
a minha, faca sem corte.

O espaço deles é onde
circunda a casa o jardim;
mas o meu espaço é quando
um parafuso sem fim.

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Na engrenagem invisível do crime, a propina sustenta o poder do Comando Vermelho

O crime sobrevive ao se infiltrar nas brechas do poder

Pedro do Coutto

A recente reportagem de O Globo sobre o Comando Vermelho (CV) lança luz sobre um aspecto pouco discutido, porém decisivo, da atuação da facção: a profissionalização da corrupção. Segundo as investigações, dentro da estrutura da organização criminosa há até um “especialista em propinas” — alguém cuja função é administrar pagamentos a agentes públicos e negociar vantagens que mantenham o império do tráfico funcionando com mínima interferência do Estado.

Essa revelação, mais do que um detalhe, expõe a essência do crime organizado no Brasil: ele não sobrevive apenas à base da violência, mas sobretudo pela capacidade de corromper e se infiltrar nas brechas do poder.

ALIANÇA – O Comando Vermelho, nascido nas prisões cariocas durante a ditadura, evoluiu de uma aliança de detentos para uma máquina empresarial do crime, expandindo-se por diversos estados e até alcançando conexões internacionais.

O que antes era um grupo armado, hoje é uma rede que movimenta bilhões e controla territórios com a mesma eficiência de uma corporação. O tráfico de drogas e de armas continua sendo a espinha dorsal, mas o diferencial contemporâneo é a capacidade de operar financeiramente — lavar dinheiro, investir em empresas de fachada e comprar silêncio.

É a economia paralela do crime, sustentada por um mercado de propinas que vai desde o policial de base até setores mais sofisticados da máquina pública. O caso revelado no Complexo da Penha, onde um integrante da facção atua exclusivamente como articulador de propinas, é o retrato dessa engrenagem invisível. Ele não dispara armas, não negocia drogas — negocia impunidade.

FERRAMENTA ESTRATÉGICA – Essa função demonstra que a corrupção deixou de ser uma consequência eventual e se tornou uma ferramenta estratégica. A propina garante o fluxo de informações, o alívio em fiscalizações, a liberdade de circulação de drogas e armas. Em outras palavras, é o óleo que faz girar a máquina do crime.

O problema é que esse sistema corrompe não apenas as instituições, mas a própria ideia de Estado. Quando o crime consegue comprar tolerância ou inação, o poder público deixa de ser a instância legítima do território. Nas comunidades dominadas, o Comando Vermelho dita regras, impõe horários, regula conflitos e até presta “serviços” sociais — papel que deveria ser do Estado. O dinheiro da propina, nesse contexto, não é apenas um suborno: é uma forma de poder.

ESQUEMA – As investigações recentes mostram o tamanho da estrutura financeira envolvida. Em 2025, a polícia descobriu um esquema de lavagem de dinheiro do CV que movimentou cerca de R$ 6 bilhões em um ano, com notas mofadas e marcadas pelo cheiro de drogas.

Em outro caso, planilhas apreendidas indicavam um caixa de R$ 13,8 milhões em apenas um mês, usado para custear advogados, armas e operações. Tudo isso revela um modelo de negócio altamente sofisticado, que depende tanto da violência quanto da capacidade de corromper.

O Estado, por sua vez, continua refém de uma lógica reativa: operações policiais grandiosas, confrontos em favelas, prisões pontuais — sem atacar o núcleo do problema, que é o dinheiro. Enquanto a repressão se concentra no varejo do tráfico, a elite do crime aperfeiçoa seus mecanismos de lavagem e influência.

FRONTEIRA – O enfrentamento eficaz exigiria outro tipo de estratégia: investigação financeira, rastreamento de fluxos, transparência institucional e controle rigoroso sobre servidores e empresas que interagem com o poder público. O que está em jogo vai além da segurança. É uma disputa pelo controle simbólico e prático do Estado. A propina, nesse contexto, é o instrumento que dilui a fronteira entre legalidade e ilegalidade. Cada agente comprado, cada licitação desviada, cada olhar desviado diante de um crime alimenta essa fronteira cinzenta onde o Comando Vermelho prospera.

A reportagem do Globo não apenas revela um crime — revela um sistema. E enquanto o país continuar tratando a corrupção como uma anomalia, e não como parte essencial da engrenagem que sustenta o poder paralelo, continuará condenado a enxugar gelo. O verdadeiro combate ao crime organizado não se faz apenas com fuzis ou helicópteros, mas com integridade, investigação e vontade política. Porque o poder do Comando Vermelho não está apenas nas armas — está, sobretudo, no bolso de quem se vende para mantê-lo.

Especialistas apontam diferentes destinos para pena de Bolsonaro após decisão final do STF

Maioria absoluta dos favelados (88%) aplaude com entusiasmo a operação

Traficante do Comando Vermelho na PB é preso em megaoperação no Rio de Janeiro

As facções e milícias oprimem e exploram os favelados

Fabiano Lana
Estadão

Se há um calcanhar de Aquiles eleitoral na esquerda é a questão de como combater a criminalidade. Se fizermos uma generalização de como pensam esses militantes, a ideia é que o pequeno criminoso só age de maneira violenta porque não tem opções nem perspectivas de vida. Seria vítima de um sistema injusto que alimenta a desigualdade.

Um dos grandes problemas desse tipo de avaliação é o elitismo alienante. Até porque, nem mesmo as pessoas mais pobres, que vivenciam as dificuldades sociais, concordam com a tese. Ao contrário.

BRASIL REAL – A pesquisa da AtlasIntel divulgada nesta sexta-feira, 31, coloca mais luz sobre o problema. De acordo com a sondagem: 88% dos entrevistados que moram em favelas no Rio de Janeiro aprovaram a megaoperação ocorrida esta semana no Rio de Janeiro. O dado é avassalador.

Nem mesmo as 120 mortes foram suficientes para fazer os moradores das comunidades rejeitarem o trabalho policial. Não consideram seus “vizinhos” mortos como vítimas da sociedade.

Um detalhe: 70% dos moradores das favelas consideraram “inapropriado” o minuto de silêncio solicitado pelo ministro Guilherme Boulos pelas vítimas da operação carioca.

ALIENAÇÃO – Ou seja, muita gente, muitas vezes do conforto de seus lares de classe média, de bairros ricos, de cafés afrancesados, quer ensinar como os que sofrem com o problema devem lidar com ele.

Talvez só quem não experimenta diretamente a questão pode vir com teses generalizantes como “o traficante é vítima”, “ele roubou o celular para tomar uma cervejinha”, “nós, ricos, precisamos pagar o pedágio da desigualdade brasileira”, dizem, na arrogância de não sentir a questão na pele e dar lições sobre o assunto.

BOBAGENS – Quem é de esquerda acredita, em geral, que as sociedades humanas são desiguais e injustas, e os oprimidos pelos mais poderosos – os antigos escravos, os atuais assalariados, os informais – devem ser liberados, seja por meios pacíficos, seja pela violência revolucionária.

O traficante, no final das contas, estaria em linha direta com sua ascendência escrava e teria direito à redenção. Sua periculosidade, portanto, se justificaria. Confiram como há uma série de obras de arte, seja no cinema, na música, na literatura, que corroboram essas hipóteses do bandido-herói.

O quase silêncio constrangido do governo petista em relação à megaoperação tem razão de ser. É um tema que os deixa acuados. A direita – mesmo com toda a hipocrisia que sempre acompanha os temas morais – tem a linguagem que a maioria da população aprova quando se trata de crimes: que venha o castigo.

LIÇÃO DE VIDA – Nada de compreensão, nada de análise sociológica, nada de tentativa de realizar os fatos. É a vida como ela é. A pesquisa Atlas também mostrou que a maioria dos brasileiros quer ver operações como essas repetidas.

A questão, entretanto, é que há chance de todas essas operações estarem combatendo as consequências do problema, não a sua causa. Afinal, o dinheiro do tráfico não brota do chão. Há milhões de pessoas dispostas a gastar muito para comprar um produto ilegal. E há outras milhares dispostas a matar e morrer para entrar nesse negócio.

Até hoje, as guerras às drogas, que ocorrem de maneira até mundial, fracassaram. Os EUA e parte da Europa Ocidental partiram para tentativas de legalização, mas os resultados seguem inconclusos.