Combate contra Hamas não legitima os crimes de guerra de Israel em Gaza

Relatora da ONU critica países por não pedirem cessar-fogo em Gaza

Tem de haver um cessar´fogo imediato na Faixa de Caza

Demétrio Magnoli
Folha

Gilad Erdan, embaixador de Israel na ONU, prendeu a seu paletó uma estrela de Davi durante o discurso que pronunciou na sessão do Conselho de Segurança de 30/10. O gesto valeu-lhe uma admoestação de Dani Dayan, presidente do Yad Vashem, o Museu do Holocausto em Jerusalém. Dayan lembrou que o símbolo alude “ao desamparo dos judeus” exterminados pelo nazismo e registrou a impropriedade do paralelo implícito.

O antissemitismo puro e duro nega o Holocausto. O antissemitismo maroto, difundido por intelectuais que perderam um sentido mínimo de decoro, prefere uma tática mais “sofisticada”: acusar Israel de reeditar a Alemanha nazista promovendo um “genocídio” dos palestinos. Erdan talvez quisesse responder à acusação absurda, mas acabou desnundando o que há de pior no governo de Netanyahu: a manipulação do Holocausto como justificativa do injustificável.

BANALIZAÇÃO DO MAL – Desde as atrocidades do 7/10, o atual governo de Israel habituou-se a identificar o Hamas ao nazismo. A banalização do mal absoluto serve ao propósito propagandístico de descrever a guerra contra o Hamas como um confronto existencial, o que propiciaria um álibi para circundar as leis de guerra.

O Hamas é uma organização abominável que perpetrou centenas de assassinatos bárbaros de civis indefesos, inclusive crianças, a sangue-frio e fora de um contexto de combate.

Mas seu objetivo programático de eliminar o Estado judeu não se aproxima, nem de longe, do extermínio real de milhões de judeus nas câmaras de gás do nazismo. O Yad Vashem existe precisamente para ensinar a singularidade do Holocausto.

GUERRA DE VINGANÇA – Dayan recomendou a Erdan portar a bandeira de Israel. O embaixador representa um Estado, não os judeus europeus colhidos na fúria degenerada de Hitler. Estados têm direito à autodefesa, o que abrange a destruição militar do aparato governamental e bélico do Hamas. Não podem, entretanto, como faz o governo de Netanyahu, invocar a “ira” para promover uma guerra de “vingança”.

O Tribunal Penal Internacional (TPI) abriu investigação sobre os atos do Hamas e de Israel. Os crimes da organização terrorista estão à vista de todos: sequestro de civis, uso de reféns para propaganda de guerra, uso de civis palestinos como escudos humanos, lançamento aleatório de foguetes contra cidades israelenses.

O combate contra um inimigo sórdido não legitima, porém, a sanguinária punição coletiva imposta aos palestinos de Gaza. Israel precisa ser submetido a uma régua mais rigorosa que o Hamas justamente por ser um poder estatal.

CRIME DE GUERRA – O bloqueio quase completo de entrada de ajuda humanitária, alegadamente para forçar a devolução dos reféns, forma um crime de guerra de primeira magnitude.

A Quarta Convenção de Genebra admite mortes inevitáveis de civis no curso dos combates, mas não concede um passaporte para matar.

A BBC provou que Israel atacou zonas específicas indicadas como refúgios seguros para os habitantes de Gaza. Na guerra, admite-se a transferência provisória de civis para afastá-los de linhas de tiro, mas nunca a limpeza étnica. Contudo, um documento do Ministério da Inteligência de Israel sugere a remoção definitiva da população de Gaza.

AUSCHWITZ – O avô do embaixador Erdan pereceu no campo de Auschwitz. Honrar sua memória é, antes de tudo, abster-se de usar o nome de Auschwitz para justificar violações flagrantes do direito humanitário.

O ombudsman teima em ocultar as investigações sobre a explosão no hospital de Gaza em 17/10 alegando, puerilmente, a ausência de “verdades definitivas”.

Mas o leitor da Folha merece conhecer a verdade provisória disponível aos leitores do Guardian, do NYT, do Washington Post, da BBC e da Economist: a hipótese mais provável é que a tragédia resultou de foguetes errantes lançados a partir de Gaza. Nem tudo que acontece são crimes de guerra israelenses.

8 thoughts on “Combate contra Hamas não legitima os crimes de guerra de Israel em Gaza

  1. Atacar agora Israel é ótimo, nos dá a chance perfeita de podermos extravasar o nosso ódio camuflado por Israel e pelos judeus em geral. Tentar passar terroristas por refugiados é o que estão tentando os terroristas da Hamas. Estocar armas e munições debaixo de hospitais ou terroristas de abrigarem entre refugiados não é crime de guerra também? Esta rede de televisão que não merece que cite seu nome é a porta-voz
    informal do governo do Stalinácio, declarado apoiador do grupo terrorista.

  2. É preciso separar o povo judeu que não tem nada a ver com o governo de extrema direita corrupta de Netanyahu.

    Asfixiar o povo palestino e dominar a Faixa de Gaza tem um propósito econômico maior tanto de Israel como dos EUA.
    No mar pertencente a Faixa de Gaza tem gás e petróleo e com a destruição da Faixa de Gaze e a vitória na guerra, o espolio deve ficar para os EUA e Israel.

    Depois da “guerra” do Iraque o espólio em especial o petróleo do Iraque está em poder da multinacionais americanas.
    Esse é o mundo cão em que vivemos.

  3. 1) Li alhures que Ministro de Israel sugeriu bomba atômica em Gaza… já foi trocado por um outro…

    2) Não entendo de armas… mas será que a poeira radioativa da bomba atômica se espalharia pela região e iria para o território israelense?

  4. Vejo elementos dos partidos e da imprensa partidária, conservadores do sistema apodrecido, tão indignados com as loucuras que estão acontecendo na “Terra Santa” que ficamos com a impressão de que no Brasil tudo corre às mil maravilhas. Na verdade, o que está acontecendo na “Terra Santa”l, que mais parece do Diabo do que de Deus, é inaceitável, mas o que acontece no Brasil em termos de assassinatos de seres humanos, há décadas, é tão ou mais lamentável que a guerra na “Terra Santa”, pena que a politicalha brasuca demagoga, hipócrita, cínica…, teima em não enxergar e nem se indignar com o holocausto brasuca, e muito menos faz alguma coisa séria para resolvê-lo, pelo contrário pensam apenas em votos e na próxima eleição . “Mesmo com queda de 6%, Brasil registrou, em 2021, 47,5 mil mortes violentas intencionais – uma média de 130 homicídios por dia –, o que coloca o país no topo de uma trágica estatística mundial.”

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