Musk tem razão em várias das denúncias apresentadas contra decisões de Moraes

Andre Marsiglia (@marsiglia_andre) / X

Sem decisão judicial, é abuso de autoridade, diz Marsiglia

Giullia Colombo
Poder360

O advogado constitucionalista André Marsiglia disse que a PF (Polícia Federal) e a PGR (Procuradoria Geral da República) deveriam investigar se houve “abuso de poder” do Judiciário ao pedir informações sobre usuários de redes sociais e moderação de conteúdo.

“Estamos tratando da necessidade que isso seja investigado pela PF e PGR e órgãos independentes, que se individualize a conduta da pessoa, ministro, magistrado responsável por abuso de poder, para que a gente possa pensar em qualquer responsabilização”, afirmou ao Poder360.

LIBERDADE DE EXPRESSÃO – A fala de Marsiglia se refere aos e-mails publicados pelo jornalista norte-americano Michael Shellenberger no X (antigo Twitter) na quarta-feira (dia 3), acusando o ministro de reprimir a liberdade de expressão ao tentar interferir no conteúdo de usuários e exigir dados pessoais.

O trabalho foi batizado como “Twitter Files Brazil”. Revela uma série de e-mails enviados pelo consultor jurídico da divisão brasileira do Twitter, Rafael Batista, a sua equipe.

Segundo Batista, ao longo de 2021 e 2022 ele respondeu a pedidos do tipo vindos do STF, do Congresso Nacional, do MP-SP (Ministério Público de São Paulo) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Diz ainda que, em agosto de 2021 o TSE exigiu a desmonetização de contas bolsonaristas envolvidas em ataques coordenados contra integrantes do STF e do TSE em diferentes plataformas.

ORDENS DO TSE – No e-mail enviado a sua equipe, o consultor jurídico afirmou que a Corte Eleitoral pediu que o Twitter, o YouTube, a TwitchTV, o Instagram e o Facebook: (i) não sugerissem algoritmicamente perfis e vídeos de conteúdo político que desacreditassem o sistema eleitoral e (ii) identificassem a origem de alguns conteúdos específicos.

No caso específico das solicitações do TSE, Marsiglia afirma que a possibilidade de “abuso de autoridade” ou “abuso por uso excessivo de poder” reside no fato de que “não há uma legislação que permite pressionar uma plataforma a entregar dados sensíveis dos seus usuários”.

Batista também informa que o ministro também solicitou dados de contas de usuários. Os autos do processo estão sob sigilo.

SEM ORDEM JUDICIAL – Em um processo do MP-SP de 2021 que também pedia informações de usuários, Rafael Batista disse que o promotor do caso argumentou que algumas plataformas como Google, Facebook, Uber, WhatsApp e Instagram forneceram dados cadastrais e números de telefone sem ordem judicial.

De acordo com o funcionário do departamento jurídico do “X”, foi aberta uma investigação policial pelo suposto “crime de desobediência” cometido por ele por não entregar as informações solicitadas.

O Marco Civil da Internet (lei nº 12.965/2014) assegura aos usuários o direito de manterem sob sigilo seus dados pessoais e o fluxo de suas comunicações pela internet, “salvo por ordem judicial, na forma de lei”. Para Marsiglia, a atitude das empresas que cederam cria um clima de insegurança jurídica.

CENSURA, MESMO – “O receio de uma plataforma pode fazer com que ela cometa irregularidades e censure seus usuários”, disse. Ele complementa que “com a pressão, podemos ter nossos dados entregues e a liberdade de expressão exposta”, destaca.

O advogado adverte que o fornecimento de dados sem decisão judicial viola os princípios da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).

“Art. 18. O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros”;

“Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”

Batista, o especialista do “X” afirma que exista necessidade de individualização do abuso de poder e eventual investigação, mas Marsiglia acha difícil que haja um desfecho. O motivo, segundo ele, é o sigilo dos processos, que impedem que o Legislativo, um dos atores que poderia pedir uma investigação, por meio de ADI (ação direta de inconstitucionalidade) tenha acesso aos inquéritos. Assim, somente o TSE poderia derrubar o sigilo dos próprios autos.

RESOLUÇÃO DO TSE – Em fevereiro, o TSE aprovou resoluções com regras para as eleições municipais de outubro. Dentre as normas aprovadas, estão as minutas que tratam sobre a propaganda eleitoral.

A corte define que as big techs donas de plataformas de aplicação deverão adotar e divulgar medidas para impedir ou diminuir a circulação de “fatos inverídicos ou descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral”.

Como medida corretiva, as empresas deverão divulgar conteúdo informativo que esclareça o conteúdo inverídico. As peças também deverão ser removidas imediatamente das redes sociais.

O dispositivo também demanda que as plataformas tomem providências a partir de ordem judicial, quando houver violação das normas.

NORMAS IMPORTANTES – Eis o que diz a resolução:

“Art. 9º-D: É dever do provedor de aplicação de internet, que permita a veiculação de conteúdo político-eleitoral, a adoção e a publicização de medidas para impedir ou diminuir a circulação de fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que possam atingir a integridade do processo eleitoral”;

“Art. 9º-E: Os provedores de aplicação serão solidariamente responsáveis, civil-administrativamente, quando não promoverem a indisponibilização imediata de conteúdos e contas, durante o período eleitoral, nos seguintes casos de risco: condutas, informações e atos antidemocráticos; grave ameaça, violência ou incitação à violência contra autoridades da Justiça eleitoral e Ministério Público; comportamento ou discurso de ódio, divulgação ou compartilhamento de conteúdo fabricado ou manipulado por tecnologias digitais, incluindo inteligência artificial”.

ABUSO DO PASSADO – O especialista argumenta que os artigos normalizam, na atualidade, o que, em 2022, publicado por Michael Shellenberger na quarta-feira (3.abr), foi classificado como abuso de autoridade.

Segundo ele, a resolução não serve para “aliviar o abuso do passado”. Ponderou que a norma, hoje, normaliza as condutas que, no passado, podem ser consideradas abusivas.

Procurada pelo Poder360 para um posicionamento, a assessoria do STF não respondeu. O espaço segue aberto para manifestações futuras.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– É claro que Moraes cometeu e ainda comete abusos de autoridade, porque faz parte do seu show, como diria Cazuza. Mas os demais operadores de Direito precisam respeitar o Marco Civil da Internet, que prevê existência de decisão judicial para fornecimento de informações pessoais. No caso de Moraes, ele personaliza a própria decisão judicial. A plataforma tem de lhe fornecer a informação, e fim de papo. (C.N.)

4 thoughts on “Musk tem razão em várias das denúncias apresentadas contra decisões de Moraes

  1. STF representa o judiciário, uma instituição de sanguessuga e alguns membros atuam como grilheiros e talvez coisa pior. Mas que existe fortes interesses financeiros e políticos nesse grupo que atualmente so vemos Elon Musk falando, com certeza isso tem.

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    Seguimos o dinheiro que movimenta os ataques de Elon Musk a Alexandre de Moraes

    A POSTURA DE ELON MUSK em relação ao Brasil, especialmente em confronto com o judiciário brasileiro, não é usual. Com desafios regulatórios em diversos países, o bilionário geralmente coloca em segundo plano seu ativismo de extrema direita para facilitar a entrada das empresas de seu conglomerado em outras nações.

    Na Índia, por exemplo, o X (antigo Twitter) até se posicionou contrário a decisões judiciais do país, chefiado pelo primeiro-ministro Narendra Modi, do partido de extrema direita Bharatiya Janata Party, há mais de uma década. Mas fez questão de dizer que acataria cada uma delas. Lá, Musk pretende investir US$ 3 bilhões em fábricas da Tesla para frear o avanço da sua principal concorrente, a chinesa BYD, na região.

    No Brasil, no entanto, o bilionário seguiu outra linha. Ao comprar o Twitter e transformá-lo no X, Musk comprou também uma poderosa ferramenta política, que reúne lideranças mundiais, comunicadores e pesquisadores de todo o mundo. Agora, ele está usando esse poder comunicacional para desestabilizar o país e impulsionar seus próprios negócios.

    A investida foi coordenada: primeiro, no dia 4, os Twitter Files, que mostram os advogados da empresa reclamando das ordens de Alexandre de Morais, que pediu o bloqueio de contas envolvidas em manifestações golpistas.

    Depois, um tuíte provocativo do próprio Musk, como apito de cachorro, para mobilizar bolsonaristas contra a ‘censura’. O circo foi armado: Bolsonaro pai e Eduardo fizeram uma live, Nikolas Ferreira, Paulo Figueiredo e Allan dos Santos, que estava banido, fizeram outra.

    A extrema direita se mobilizou, Musk usou sua rede para peitar uma ordem judicial do Supremo Brasileiro – o que é ilegal, segundo o Marco Civil da Internet – e pedir o impeachment de Alexandre de Moraes. O nosso ministro, por fim, acabou incluindo o bilionário em seu extenso inquérito de milícias digitais.

    O que explica a escalada de Elon Musk sobre o STF? Não é só alinhamento político com a extrema direita, golpismo e nem uma defesa incondicional da liberdade de expressão. É uma estratégia comercial que envolve interesses de outras empresas do conglomerado: a SpaceX, a Starlink e a Tesla.

    A corrida pelo ‘petróleo branco’
    Já na segunda-feira, 8, seguinte às afrontas ao ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, Elon Musk começou a seguir um poderoso investidor norueguês. Nicolai Tangen é CEO do Norges Bank Investment Management, um fundo de investimentos que tem negócios em várias partes do mundo – muitos deles na área de mineração.

    Os dois marcaram uma conversa em um círculo, a ferramenta de áudios ao vivo do X (antigo Twitter). Só Tangen divulgou o encontro; Musk foi mais discreto.

    O Norges Bank Investment, em 2023, tinha investimentos em mais de 8 mil empresas de 72 países. O Brasil está entre eles. O banco é dono de pouco mais de 1% da Petrobras, 3% da Cosan, 5% da construtora Tenda, só para citar alguns exemplos.

    Também é um investidor das mineradoras canadense Sigma (com 17,6 milhões de dólares, menos de 1% da empresa) e da espanhola Rio Tinto (com 2,5 bilhões investidos, mais de 2%). Também tem mais de 2% da metalúrgica holandesa AMG.

    É aqui que os interesses do CEO do Norges Bank e de Musk começam a se cruzar.

    Em 2023, uma reportagem da Bloomberg mostrou que Elon Musk estaria interessado em comprar a Sigma Lithium, uma das maiores mineradoras de lítio no mundo. O metal é fundamental na produção dos carros elétricos da Tesla. Uma das fornecedoras da empresa de Musk é a brasileira Vale, que vende lítio e níquel.

    Em 2022, quando Musk veio ao Brasil – oficialmente para lançar sua internet por satélite, a Starlink –, duas pesquisadoras da USP levantaram dúvidas sobre os reais interesses da visita. Em um artigo, Eliane Cristina Silva dos Santos, do Instituto de Estudos Avançados, e Maria da Penha Vasconcellos, professora da Faculdade de Saúde Pública, mostraram que a visita aconteceu em um momento extremamente estratégico na produção de lítio brasileiro.

    O lítio, o metal mais leve que existe, é considerado o “petróleo branco”. O material é essencial na produção de baterias, energia solar e eólica, além dos carros elétricos. Ou seja, em tempos de transição energética, é fundamental. A América Latina, sobretudo Argentina, Bolívia e Chile, concentra 68% das reservas mundiais do metal.

    Foi lá mesmo na Bolívia, em 2020, que Elon Musk se envolveu em uma intromissão semelhante à do Brasil. Naquele ano, o bilionário respondeu a um tuíte crítico ao seu apoio ao golpe contra o governo de Evo Morales por interesse no lítio boliviano. “Vamos dar golpe em quem quisermos! Lide com isso”, Musk respondeu. (O tuíte foi apagado, mas foi registrado nesta reportagem).

    Voltando ao Brasil: nos últimos anos, o Serviço Geológico brasileiro descobriu várias reservas de lítio, sobretudo no Vale do Jequitinhonha, norte de Minas Gerais. Três empresas exploram o minério na região: a Companhia Brasileira de Lítio, a canadense Sigma e a AMG Mineração.

    Só a primeira era nacional – o governo de Minas tinha 33% da companhia. O cenário parecia promissor para fabricarmos nossas baterias brasileiras. Só que a empresa parceira na empreitada, Oxys Energy, faliu em 2021– e o governo de Minas passou a defender que o estado não deveria entrar no negócio.

    Em outubro de 2022, a parte estatal foi vendida à britânica Ore Investimentos. O Vale do Lítio estava entregue; no final de 2023, o governador Romeu Zema, do Novo, foi à Nova York conseguir novos investimentos estrangeiros para a região.

    Segundo o Observatório da Mineração, que cobre o tema, três empresas, Latin Resources, Atlas Lithium e Lithium Ionic, já sondam a área para conseguir novas reservas de lítio. A Sigma Lithium e a AMG já estão em produção – e as duas têm investimentos do Norges Bank Investment.

    A Sigma, fundada em 2011, viu suas ações explodirem após descobrir reservas de lítio por aqui, e a demanda mundial pelo metal aumentar. Em 2023, a empresa confirmou que estava negociando com potenciais compradores.

    As negociações com Musk, no entanto, não avançaram, e o tema ficou urgente para o bilionário: neste ano, entrou uma concorrente chinesa no jogo.

    https://www.intercept.com.br/2024/04/08/seguimos-o-dinheiro-que-movimenta-os-ataques-de-elon-musk-a-alexandre-de-moraes/

    • Musk sabe que há um calcanhar de Aquiles nos excessos arbitrários e exibicionistas no Judiciário.

      Mas sua construção trabalha com prazos mais longos.

      De toda forma, uma autocrítica desses poderosos órgãos e seus abusos no Estado brasileiro é imprescindível.

      Não há sequer mecanismos efetivos de controle dessas ações.

      Mas duvido muito que essa demanda seja atendida de forma tempestiva.

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