Carlos Newton
Foi inacreditável e inaceitável a cobertura da TV sobre a morte de Silvio Santos. A disputa pela audiência levou a exageros emocionais que transformaram o famoso apresentador num personagem. humanitário e quase santificado. É assim no Brasil, sempre que algum personagem famoso morre, mas com Silvio Santos a mídia extrapolou qualquer limite, com uma cobertura irreal e bajulatória, que deixou no chinelo a repercussão da morte de um herói nacional como Pelé.
Silvio Santos não foi herói em nada do que fez. Seu maior mérito foi ser um vendedor nato, que na juventude morava em Niterói e trabalhava como camelô no centro do Rio. No dia-a-dia nas ruas, percebeu que poderia se tornar um grande comunicador, quando essa palavra ainda nem era usada como definidora de função profissional.
ESPERANÇA – Entre os “depoimentos” sobre Silvio Santos, muitos deles falavam que ele teria levado esperança a milhões de brasileiros, mas foi tudo ao contrário. Ele soube enriquecer justamente explorando a esperança dos brasileiros de classe média, através de seus empreendimentos empresariais, com o Baú da Felicidade, um negócio que comprara de Manuel da Nóbrega, criador da versão original de “A Praça é Nossa”, que o filho Carlos Alberto manteve no ar.
O programa “Tudo por Dinheiro” foi uma espécie de logomarca da carreira do apresentador-empresário. Tudo o que ele fazia era por dinheiro.
No governo Figueiredo, para vencer a concorrência pelo Canal de TV contra o Jornal do Brasil e outros concorrentes, ele contratou o jornalista Carlos Renato, primo-irmão da primeira-dama Dulce Figueiredo para resolver as coisas em Brasília, digamos assim.
BAJULAÇÃO TOTAL – Depois de colocar no ar seu primeiro canal, no Rio de Janeiro, passou a servir a qualquer presidente que estivesse no poder, entregando parte de seu programa dominical para enaltecer “A Semana do Presidente”. Ele próprio quis ser presidente, mas sua candidatura oportunista foi brecada pelo TSE pertinho da eleição.
Na onda do “Tudo por Dinheiro”, Silvio Santos foi abrindo cada vez mais empresas, nas mais diversas áreas, inclusive reflorestamento. O maior erro foi abrir um banco, o PanAmericano, cuja gestão entregou a parentes e amigos. Foi um fiasco colossal, que ameaçou a saúde financeira do grupo.
Em 2009 o PanAmericano estava quebrado, com prejuízos de R$ 2,39 bilhões. Segundo o Banco Central, enquanto o banco de Silvio Santos informava um total de R$ 1,60 bilhão em carteiras de crédito cedidas, os bancos compradores dessas carteiras elevavam esse total para espantosos R$ 5,59 bilhões. Além disso, no balanço do PanAmericano havia “ativos inexistentes” que somavam R$ 1,4 bilhão.
AMIGO LULA – Era o fim do império de Silvio Santos, que já tinha investido nos Estados Unidos o que restara de sua fortuna. Mas quem tem amigos não morre pagão. Bastou uma visita ao presidente Lula da Silva no Planalto, em 2010, para o chefe do governo resolver com apenas um telefonema todos os problemas do empresário-comunicador. Do outro lado da ligação estava a petista Maria Fernanda Ramos Coelho, que presidia a Caixa Econômica Federal e resolveu o problema.
A Caixa assumiu o caixa furado do PanAmericano, mas a gestão continuou com Silvio Santos, que se livrou dos bilhões de prejuízos e ainda levou R$ 739,2 milhões em dinheiro, para se recuperar do susto, pois Lula sabe ser amigo dos amigos, como foi revelado por seu relacionamento com a família Odebecht.
O negócio da Caixa foi um crime de lesa-pátría, mas ninguém foi processado, não houve nada, nada. E a ex-presidente da Caixa, Maria Fernanda Ramos Coelho, continuou sua carreira no petismo e até janeiro deste ano estava trabalhando no Planalto. Pediu demissão, mas Aloizio Mercadante teve de nomeá-la para a diretoria do BNDES, porque ela é uma mulher que sabe demais, como diria Hitchcock.
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P.S. – Lamento ter decepcionado os admiradores de Silvio Santos, mas realmente não posso concordar com essas louvações a quem nada fez por este país e enriqueceu ilicitamente mediante tráfico de influência e exploração do povo brasileiro, através de armações como a TeleSena, uma loteria que o governo considera ser um título de capitalização, vejam bem a que ponto chegamos. Quanto à louvação da imprensa ao legado de Silvio Santos, tenho mais o que fazer. (C.N.)