É a economia, estúpido!, que elege Trump e remodela a política dos EUA

Donald Trump discursa de trás de vídeo blindado durante comício na Pensilvânia

Vitória fácil de Trump desmoraliza o setor de pesquisas eleitorais

Flávia Barbosa
O Globo

À medida que a madrugada avançava, a eleição presidencial dos EUA foi ficando mais parecida com a de 2016, vencida por Donald Trump contra Hillary Clinton, do que com a de 2020, em que o republicano perdeu a reeleição para Joe Biden. Às 3h, os sinais eram inequívocos. Pouco depois das 4h, confirmou-se o que, desde o início da noite, se desenhava: com a vitória na Pensilvânia, o ex-presidente que dominou o Partido Republicano e radicalizou a política americana, com sua retórica incendiária, divisiva, misógina e xenófoba, voltará à Casa Branca.

E não será um retorno qualquer. Será retumbante. Entre os cenários absolutamente plausíveis para a corrida eleitoral deste ano, sempre houve a possibilidade do chamado landslide_ quando um candidato vence de lavada, especialmente carregando todos ou a maioria dos estados-pêndulo. Donald Trump já venceu 3 dos 7 estados decisivos e lidera nos outros 4, e pode claramente vencê-los todos.

ESMAGANDO – E mais: ele lidera o voto popular por mais de 5 milhões de votos, algo que um republicano não conseguia desde George W. Bush, duas décadas atrás. Seu partido obteve a maioria do Senado e tem grandes chances de obter a maioria na Câmara. Sua performance em cada estado é melhor em 2024 do que em 2020, com avanços de até 10 pontos percentuais em condados-chave. Barba, cabelo, bigode.

Como isso é possível? Muito resume-se ao mais famoso ensinamento político do genial estrategista democrata James Carville: “É a economia, estúpido!”.

Não era segredo para ninguém que a economia era o principal tema a mobilizar os eleitores.

TUDO ERRADO – A insatisfação com o custo de vida, a inflação acima do patamar histórico, a sensação de que as contas não fecham e de que o futuro será pior era gritante entre os americanos, que desaprovam por 56% a 41% a presidência de Joe Biden; e 59% desaprovam sua forma de conduzir a economia.

Para 63% da população, os EUA rumam na direção errada. A lembrança é de uma vida mais confortável sob Donald Trump _ considerado mais apto para lidar com a economia do que Kamala Harris, por uma margem de 6 pontos percentuais.

Isso mesmo com a economia americana sob Joe Biden ter tido uma excelente performance em baixar a inflação herdada da pandemia, em gerar empregos, em perdoar dívidas estudantis, em reduzir o preço dos planos de saúde… Mas simplesmente ninguém sente. E percepção é tudo.

MALDIÇÃO – Kamala Harris simplesmente não conseguiu fugir da maldição da Bidenomics. Afinal, ela é vice-presidente de Biden e parte do pacote. Quanto mais o mapa eleitoral foi sendo preenchido ao longo da noite e da madrugada, mais claro ficava o impacto do bolso nas decisões dos eleitores.

Sistematicamente, áreas mais atingidas pela inflação, preços de aluguel, alimentos, energia e gasolina cobravam votos de Kamala mesmo em regiões onde ela vencia com folga – suas margens, porém, encolheram em relação à votação de Biden, em estado após estado: Virgínia, Geórgia, Pensilvânia, Michigan, Wisconsin, Carolina do Norte.

A economia também serviu de combustível ao engajamento republicano e ao comparecimento às urnas. A identificação de eleitores com o Partido Republicano superou o alinhamento democrata pela primeira vez em décadas. Isso foi acompanhado do registro de mais eleitores republicanos.

VOTAÇÃO ANTECIPADA – Não à toa, os números de votação antecipada dos republicanos foram estrondosos. E o chamado turnout acompanhou, ontem, no dia derradeiro.

Não é a única mudança que a vitória de Trump catalisou nos EUA. De carona na insatisfação com a economia, com a falta de oportunidade, a dificuldade de avançar na escolaridade, notadamente mais forte entre os homens, o ex-presidente conseguiu em 2024 avançar nos votos de latinos, negros e mais jovens, um trio demográfico historicamente fiel aos democratas. Por largas margens. Este avanço se junta a outro observado já em 2016 e 2020, sobre trabalhadores brancos sem diploma universitário.

Juntos, esses movimentos cristalizam uma reconfiguração do voto nos EUA, com uma nova coalizão vencedora e radicalizada. Os “deixados para trás” pela globalização, o avanço tecnológico, o elevado custo de estudar parecem superar agora a coalizão que se alinhava em torno de pautas progressistas concretas: mulheres, latinos, negros.

POPULISMO – Parece que os EUA estão trocando uma coalizão popular por uma populista.

Este realinhamento empurrará ainda mais o Partido Republicano e a direita americana ao extremo, ou seja, a Trump. E forçará os democratas a redesenharem seu projeto de país e a redescobrirem o caminho para comunicá-lo.

Os EUA nunca mais serão os mesmos. Trump já mudou para sempre a América. E os próximos 4 anos podem mudar ainda mais, com reflexos nos quatro cantos do planeta.

Trump se declara vitorioso e agradece “um novo mandato sem precedentes”

O republicano Donald Trump discursa em West Palm Beach, na FlóridaJulia Chaib
Folha

Em um discurso após uma série de vitórias em estados-chave que podem consolidá-lo como o próximo presidente dos Estados Unidos, o republicano Donald Trump disse que vai curar o país, pediu união e destacou o que chamou de “surgimento de uma nova estrela”: o bilionário Elon Musk, um de seus maiores apoiadores da campanha.

Trump falou à nação por aproximadamente 20 minutos em West Palm Beach, na Flórida, estado que antes era um estado-pêndulo e que se consolidou, no atual pleito, como um bastião republicano.

VITÓRIA POLÍTICA – “É hora de deixar as divisões para trás. É hora da união”, disse ele ao celebrar o que chamou de “vitória política” sem precedentes, mesmo antes da divulgação do resultado oficial. “Nós alcançamos a coisa política mais incrível, uma vitória política que nosso país nunca viu antes.”

O republicano afirmou que os resultados lhe deram um “grande sentimento de amor” e que a nação lhe deu “um mandato poderoso”. Afirmando ter conquistado a maior parte do voto popular, além de ter vencido no Colégio Eleitoral, Trump disse que os resultados significaram “uma nova era de ouro” para os EUA.

“Nós retomamos o controle do Senado. O número de vitórias no Senado foi memorável”, disse ele. “Vocês terão ótimos senadores. E parece que vamos manter o controle da Câmara dos Representantes”, afirmou.

SEM CITAR KAMALA – Em nenhum momento do discurso Trump mencionou Kamala Harris, sua adversária na corrida eleitoral. Convidado a discursar brevemente, o vice na chapa de Trump, J.D. Vance, agradeceu o líder pela confiança e disse que sua vitória, tratada no discurso como certa, foi a “maior reviravolta política da história dos EUA”. Em resposta, Trump brincou dizendo que Vance havia sido “uma boa escolha”.

Além de Donald Trump e de seu vice, também estavam no palco Eric Trump e Donald Trump Jr. filhos do republicano, Melania Trump, a esposa do empresário, Dana White, o CEO do UFC, entre outros. Quase todos brancos —a exceção era Usha Vance, a esposa de V.D. Vance, cujos pais são da Índia.

O republicano ainda afirmou que a eleição representa “o maior movimento político de todos os tempos”. “Fizemos história essa noite”, disse.

APOIO DE MUSK – Ele mencionou os “trabalhadores americanos que se esforçaram para votar”. E agradeceu ao empresário Elon Musk, chamado por ele de “nova estrela”.

O clima no evento na Flórida foi se tornando de comemoração e euforia à medida que os resultados começaram a ser divulgados.

Apoiadores comemoraram a arrancada de Trump nos estados da Pensilvânia e da Carolina do Norte em meio a petiscos e chocolates oferecidos pela campanha.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Daqui para frente, é tudo festa dos republicanos. Entre os democratas, clima de velório, Kamala deixou a sede da campanha sem discursar, desanimada com os primeiros resultados. (C.N.)

Potencial volta de Trump à Casa Branca causa apreensão ao Brasil

A imagem mostra dois homens se cumprimentando de forma amigável, com um deles colocando a mão no ombro do outro. Ao fundo, há várias outras pessoas, algumas com expressões de interesse. O ambiente parece ser um evento formal, com um fundo azul.

Lula se dá bem com Biden, porque já estão com a validade vencida…

Fernanda Perrin e Patrícia Campos Mello
Folha

Integrantes do governo brasileiro estão apreensivos com um retorno de Donald Trump à Casa Branca e se preparam para o que um interlocutor descreveu como um “maior potencial de conflito”. A lista de preocupações inclui agenda climática, Venezuela, Elon Musk e as articulações internacionais de extrema direita.

Na sexta-feira (1º), o presidente Lula (PT) disse que está torcendo por Kamala Harris e incluiu o republicano no que vê como uma volta do “nazismo e fascismo com outra cara” no mundo. “Como sou amante da democracia, acho a coisa mais sagrada que nós humanos conseguimos construir para bem governar o nosso país, obviamente estou torcendo para Kamala ganhar as eleições”, disse.

A boa relação pessoal entre Lula e Joe Biden, que deve ir a Manaus e Brasília em novembro para a reunião do G20, não deve se manter entre Lula e Trump.

LADO PRAGMÁTICO – Ao mesmo tempo, membros do governo brasileiro dizem que há boa vontade para trabalhar com quem for e afirmam ver um lado pragmático no republicano.

Mas algumas derrotas já são vistas como prováveis. A primeira é o retrocesso na cooperação ambiental. Quando presidente, Trump retirou os EUA do Acordo de Paris e revogou uma série de regulações ambientais e incentivos à transição energética.

Neste ano, prometeu continuar apoiando os combustíveis fósseis —quarta maior doadora da campanha, a indústria de petróleo e gás deu US$ 14 milhões ao ex-presidente.

KAMALA X TRUMP – O que importa sobre a eleição dos EUA é que o Brasil se prepara para sediar a COP, a conferência do clima da ONU, em Belém, no ano que vem, e contava com a ajuda financeira e política dos EUA para transformar o evento em uma plataforma para novos mecanismos de financiamento para transição energética.

 O Brasil também apostava na cooperação dos EUA para desenvolvimento sustentável —Biden havia prometido repassar US$ 500 milhões ao Fundo Amazônia em cinco anos. No entanto, o grosso do montante ficou travado no Congresso.

Com Trump na Presidência e previsão de domínio republicano ao menos do Senado, diplomatas estimam que será o fim definitivo de qualquer esperança de o dinheiro chegar.

INCERTEZA – No restante dos temas, domina a incerteza. A principal delas é sobre a proximidade entre o republicano e Elon Musk. O bilionário, que recentemente entrou em choque com o ministro Alexandre de Moraes (STF), é um dos principais apoiadores de Trump, e sua influência em um governo dele é dada como certa, seja com um cargo formal ou não.

Já o analista Ian Bremmer, presidente da consultoria de risco Eurasia e colunista da Folha, diz que acredita que o confronto entre o dono do X e autoridades brasileiras deve escalar em um governo do republicano.

Bruna Santos, presidente do Brazil Institute, principal think tank sobre o país em Washington, relembra que já houve articulações no Congresso americano para tentar emplacar a pauta de supostas violações da liberdade de expressão no Brasil. Para ela, isso deve ganhar mais espaço sob Trump.

NOVAS INVESTIDAS – O movimento não teve um impacto maior, como queriam aliados de Jair Bolsonaro —que chegaram a falar em sanções—, diante da falta de apoio do Senado e da Casa Branca, ambos dominados por democratas. Mas, se houver uma inversão de forças, o temor é que essas investidas consigam avançar.

Para Santos, a relação entre os países seria marcada por uma guerra de narrativas “extremamente exaustiva e pouco produtiva”. A declaração recente de Lula sobre a corrida americana não surpreende, em sua visão.

Mas ela ressalta que, da parte do Itamaraty, já houve conversas com pessoas ligadas ao Partido Republicano para indicar que há uma intenção de manter o diálogo sob um governo Trump.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
No final, tudo se acerta, porque os interesses comerciais sempre falam mais alto do que os meramente políticos. (C.N.)

Alguém acredita quando Tarcísio de Freitas diz que desistiu do Planalto?

A aposta de ministros de Lula sobre o futuro de Tarcísio em 2026

Tarcísio vai apoiar Bolsonaro e dá por encerrado o assunto

Basília Rodrigues
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a CNN

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), reafirmou nesta segunda-feira (4) que vai tentar a reeleição em 2026. Desde o resultado das eleições municipais — com vitória para o grupo político dele em São Paulo — circula a tese de que o caminho é a Presidência da República. Tarcísio, no entanto, nega.

“A única coisa que eu vou concorrer é a reeleição ao governo”, disse à CNN.

PALAVRA MANTIDA – A declaração ocorreu durante a festa de lançamento do novo canal CNN Money, que reuniu políticos e outras autoridades, em São Paulo, na noite desta segunda-feira (4).

“A visão de hoje vai se manter daqui a dois anos”, reiterou sobre sua disposição de não concorrer à presidência. “Eu já venho dizendo isso, mas as pessoas não acreditam. Quero ver quando chegar 2026, e todo mundo ver que eu estava falando (o que era) para valer”, complementou.

Tarcísio disse acreditar que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) conseguirá voltar a ser elegível até 2026. “Os motivos da inelegibilidade são muito frágeis. O meu candidato é ele. Eu estarei com ele (Bolsonaro)”, disse.

EFEITO TRUMP – O governador de São Paulo avalia que os partidos ainda estão se organizando para 2026 e que uma eventual vitória de Donald Trump, nos Estados Unidos, poderia gerar pressão no Brasil sobre a condição de Bolsonaro.

Após o resultado de segundo turno, Tarcísio tem evitado entrevistas de vídeo porque não quer falar sobre o assunto. “A eleição (municipal) já passou. Agora é virar a página”, disse.

O governador de SP ressaltou que, desde as eleições, fez quatro leilões, e ainda neste mês irá inaugurar a rodovia que liga Caraguatatuba a São Sebastião.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
– É apenas uma declaração de momento, ainda muito longe do prazo legal, mas Bolsonaro e Lula estão desesperados com a possibilidade de Tarcísio se candidatar ao Planalto, parecem à beira de um ataque de nervos. Como se vê, pode continuar a chatice da polarização entre dois candidatos que competem entre si para ver quem é o mais despreparado. Aquele que vencer, se comprovar que é nesmo o pior, recebe de prêmio a Presidência da República. (C.N.)

Quem faz obras importantes tem mais chances de ganhar eleição municipal

Nota: Pelo SUS com financiamento mais justo! - Cebes

Charge do Amâncio (Arquivo Google)

Merval Pereira
O Globo

Esta eleição municipal ficou conhecida como a “das emendas parlamentares”. Mas poderia também ser chamada de “eleição dos fundos”. Nunca ficou tão claro o poder do dinheiro na definição dos resultados finais, especialmente na reeleição da maioria esmagadora dos prefeitos de capitais.

O sistema de reeleição ficou consolidado com a vitória de quase 80% dos incumbentes. Pode ser bom por garantir a permanência de gestores bem avaliados, mas também ser reflexo da máquina estatal, impulsionada pelas verbas públicas.

RENOVAÇÃO – Os prefeitos, de costume, são fundamentais para a eleição do Congresso e, como chamou a atenção o diretor da Quaest, Felipe Nunes, podem impedir que a renovação política se faça a partir das bases.

A supervisão do Tribunal Superior Eleitoral e dos Tribunais Regionais Eleitorais será cada vez mais necessária, para que o abuso do poder político e econômico não distorça os resultados das urnas. Ao mesmo tempo, ficou claro que saber gastar o dinheiro em obras importantes para os moradores é fundamental para obter resultados eleitorais positivos.

A mudança essencial é que os partidos políticos ganharam independência ante o governo central, cujo partido não detém o controle do Congresso.

MENOR INFLUÊNCIA – Nos tempos em que o Executivo controlava a distribuição de verbas e emendas parlamentares, era tradicional que seus partidos, fosse o PSDB, fosse o PT, ganhassem também as eleições, tanto municipais quanto federais.

Mesmo não fazendo maioria absoluta, tinham as maiores bancadas e atraíam deputados e senadores para suas legendas. Hoje, com as emendas parlamentares impositivas e os fundos eleitoral e partidário, a autonomia dos partidos permite que façam seus projetos eleitorais sem depender do governo central.

E o governo central não ousa se meter nas disputas regionais, como mostraram tanto Lula quanto Bolsonaro nas campanhas.

PIOR PARA LULA – Situação mais difícil hoje para Lula, que tem na sua base congressual partidos cujos objetivos de médio prazo não batem com o seu, são de centro-direita ou mesmo de direita.

O PSD foi o partido que mais elegeu prefeitos, mas apenas o quarto que mais recebeu dinheiro por meio das emendas parlamentares. Tem um pé na canoa petista e outro na bolsonarista, com Tarcísio de Freitas. E não quer abrir mão de nada.

O PT foi o que recebeu mais verbas parlamentares, mas elegeu apenas 252 prefeitos em todo o país, ante 887 do PSD. Segundo o Portal do Orçamento, R$ 617,8 milhões foram liberados à bancada petista, que tem 68 deputados. O volume destinado ao PL, maior partido da Câmara, foi de R$ 367 milhões.

FUNDOS ENORMES – O total recebido pelas legendas por meio dos fundos aumentou de R$ 2,5 bilhões em 2018, ano da primeira eleição com as novas regras, para R$ 6 bilhões em 2024, fortuna usada pelas siglas para bancar as campanhas de candidatos a prefeitos, vice-prefeitos e vereadores.

Pelo tamanho das bancadas no Congresso, o PL, que elegeu 99 deputados em 2022, foi a primeira legenda a ter mais de R$ 1 bilhão num único ano, quase 30% a mais do que o segundo colocado, o PT, que deveria ser seu principal adversário se a polarização tivesse prevalecido. O MDB foi a legenda que mais elegeu vereadores, 8.113, enquanto o PT elegeu apenas 3.130, embora tenha se saído melhor que na eleição municipal anterior.

Na mesma proporção em que as verbas foram distribuídas entre os 25 partidos que concorreram, também os resultados foram compartilhados. Mas sem dúvida partidos como PSD, MDB e PL foram os mais vitoriosos. Certamente receberão adesões ou farão federações com outras siglas que terão de cumprir as cláusulas de barreira nas eleições para o Congresso em 2026

Banir livros é uma medida típica de ditaduras, mas Dino nem está ligando

Lula anuncia Flávio Dino para Ministério da Justiça

Flavio Dino, para espantar o tédio, agora decidiu ser censor

Lygia Maria
Folha

É temerário deixar que o Estado escolha o que pode ser publicado, já que nunca se sabe qual visão de mundo pode vir a basear a decisão

“Se um homem se deitar com outro homem, ambos praticaram um ato repugnante. Deverão ser mortos e o seu sangue cairá sobre eles.” Essa é apenas uma das passagens da Bíblia que tratam homossexuais de modo degradante.

OBRAS ESQUECIDAS – Estou curiosa para saber quando Flávio Dino, ministro do STF, ordenará que o livro seja retirado de circulação e só possa ser editado sem os trechos preconceituosos.

Pois foi exatamente isso que o magistrado fez com quatro obras jurídicas que estavam esquecidas na biblioteca da Universidade de Londrina. Nelas, alunos acharam discursos contra homossexuais e mulheres e acionaram o Ministério Público. O caso foi parar no STF porque o Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou o pedido de banimento dos livros.

O teor das publicações é de fato abjeto, ao tratar a homossexualidade como “loucura psicológica tão devastadora como nos tempos de Hitler” e apoiar a demissão de gays e lésbicas. Os autores também chamam de promíscuas e insensatas as mulheres solteiras que têm vida sexual ativa.

PERDA DE TEMPO – Mas a corte constitucional não deveria tutelar a esfera do debate público, ainda mais com o banimento de livros — medida típica de ditaduras. Os disparates nas obras já são amplamente refutados por pesquisas acadêmicas e leis que garantem os direitos de homossexuais e mulheres.

Ademais, ao contrário da Bíblia, são livros obscuros sem qualquer divulgação digna de nota. Na verdade, foi a decisão de Dino que os tornou conhecidos.

No Brasil, não é só a esquerda que é afeita à censura. Para citar apenas um exemplo, Marcelo Crivella, quando era prefeito do Rio, tentou recolher da Bienal do Livro uma história em quadrinhos que mostrava um beijo gay.

CONTRA A HONRA – Exceto em casos de ataques individuais (como calúnia e difamação), é temerário deixar que o Estado, até por meio do Judiciário, escolha o que pode ser publicado, dado que nunca se sabe qual visão de mundo baseará a decisão.

E, como disse John Stuart Mill, “se toda a humanidade tivesse a mesma opinião, e só uma pessoa fosse contrária, a humanidade não estaria mais justificada a silenciar essa pessoa do que ela, se tivesse o poder, estaria justificada a silenciar a humanidade”.

Concordo. O tema interrupção voluntária da gravidez foi banido do debate público por direita e esquerda, por motivos distintos. Gostaria de pedir às jornalistas e aos homens também que se organizassem para tratar deste tema em suas colunas em sistema de rodízio, garantindo publicações semanais

LIVRE-PENSAR – Amigos da Folha de SP, ironias à parte, a censura se mascara com desculpas variadas, vestindo trajes de virtude, zelo pela ordem, proteção da moral ou, no caso mais recente, dignidade da pessoa humana. Mas a essência é a mesma: controlar o pensamento e restringir a liberdade de expressão.

Quando o Estado ergue as mãos e cerra o punho sobre as prateleiras, retirando de circulação qualquer ideia que considera perigosa, é o próprio cerne do livre pensar que se vê ameaçado.

EUA vão se tornar ainda mais protecionistas seja com Trump, seja com Harris

Lula diz que torce pela vitória de Kamala Harris nos EUA

Lula perdeu  mais uma bela oportunidade de ficar neutro

Diogo Schelp
Estadão

Em 2008, o furacão Barack Obama atropelou Hillary Clinton nas primárias do Partido Democrata e venceu a eleição para a Presidência dos Estados Unidos pela primeira vez, tendo como adversário um candidato com uma plataforma claramente mais pró-livre-comércio: John McCain, do Partido Republicano. Obama é que era considerado o protecionista. Em 2012, ele foi reeleito e, quatro anos depois, veio Donald Trump e inverteu tudo.

Uma das primeiras decisões de Trump foi jogar no lixo um tratado de livre-comércio fechado por Obama com onze países da Ásia e do Pacífico.

VISÕES ILUSÓRIAS – Atualmente, considera-se que o republicano representa o ideal do protecionismo e do isolacionismo, enquanto os democratas, nas figuras do presidente Joe Biden e da sua vice e candidata a sucessora Kamala Harris, seriam mais abertos para o mundo. Mas será que a diferença é tão grande assim entre eles?

O primeiro mandato de Trump, entre 2017 e 2020, de fato foi marcado pela criação de barreiras às importações, especialmente daquelas vindas da China. Ele aumentou as tarifas sobre produtos chineses de 3% para 20%, em média. No total, as novas taxas de importação criadas por Trump somaram o equivalente a US$ 80 bilhões.

A gestão do democrata Biden não reverteu esse cenário. Ao contrário, ele não apenas manteve a maioria das tarifas criadas por Trump como criou novas barreiras ao comércio externo, efetivamente aumentando o protecionismo americano.

NOME NA LISTA – Quando Biden derrotou Trump na disputa para a Presidência, havia 102 empresas chinesas sob sanção direta ou indireta que constavam em uma lista de alerta para investidores americanos, segundo a consultoria Rhodium Group.

Atualmente esse número está em cerca de 300. Se forem consideradas também as organizações que não estão listadas em Bolsa, o total de empresas chinesas que enfrentam restrições nos Estados Unidos chega a 1.300.

Por essas e outras, o economista Kenneth Rogoff, da Universidade Harvard, disse em março deste ano que Biden e Trump foram os presidentes mais protecionistas da história do país. A diferença entre os dois está mais nas motivações e nos métodos do que na essência.

ESTRATÉGIA – Trump vê a guerra comercial como uma forma de proteger empresários e trabalhadores americanos da concorrência externa, principalmente da China. Sua arma preferida é a taxação da importação.

Na campanha deste ano, prometeu elevar as tarifas para 10% para produtos em geral e para 60% no caso daqueles vindos da China.

Já Biden recorre mais às barreiras não tarifárias como método, ainda que tenha também elevado as tarifas sobre produtos como carros elétricos e painéis solares chineses. Sua motivação está ligada à disputa de longo prazo por poder com Pequim, via domínio tecnológico.

NA MESMA LINHA – De Kamala Harris pode-se esperar que siga a mesma estratégia adotada por Biden, ou seja, uma escalada gradual nas barreiras alfandegárias e tarifárias às importações, enquanto mantém negociações comerciais aqui e ali que dão uma pequena abertura no comércio com outros países.

O resultado geral, ainda assim, será de mais protecionismo. Pelo teor das propostas, é dado como certo que um segundo mandato de Trump faria dos Estados Unidos um país mais fechado comercialmente do que um primeiro mandato de Harris.

Mas a diferença está na intensidade, não na essência. Com qualquer um dos dois, os Estados Unidos vão se tornar mais protecionistas.

Um mundo entre a vida sórdida de Trump e o velho império de Kamala

Candidatos à Presidência dos EUA, Donald Trump e Kamala Harris, se cumprimentam em debate na Pensilvânia

Trump e Kamala são dois candidatos que deixam a desejar

Vinicius Torres Freire

Democratas do mundo inteiro torcem em desespero pela vitória de Kamala Harris. Se eleita, a candidata do Partido Democrata não vai reverter esta onda longa de degradação social e política, fora do controle até do poder de um império mais benevolente. Mas manteria no poder o establishment imperial mais comedido e racional, de resto com 10% de desconto social, o Partido Democrata e seus aliados na finança, na universidade ou na ciência em geral e em boa parte das “big” (“techs”, “pharma” e outros gigantes tecno).

De certo modo, é coalizão que vem desde Bill Clinton (1992-2001), em especial desde Barack Obama (2009-2017), com qualificações.

O QUE VEM – As consequências de Donald Trump são incertas, até se ele perder. Haveria guerra jurídica e tumulto na rua? Vitorioso, vai implementar seu programa? Plutocratas menos lunáticos do entorno de Trump dizem que não; pode haver revolta política; talvez o Congresso barre o pior.

O plano de Trump tende a acabar com o que resta da ordem mundial que os EUA comandaram desde 1945 e com uma ideia de governo que, na sua versão moderna, tem bem mais de um século.

Os aumentos de impostos de importação (“tarifas”) acelerariam a fragmentação econômica global, além de agravar perigosamente o conflito com a China. Bloqueios de comércio alteram também fluxos de investimento; reorganizam ou reforçam blocos políticos e econômicos. Teriam consequências imediatas: preços e juros maiores, comércio menor, menos atividade econômica.

DRIBLAR RESTRIÇÕES – Haveria tentativas de driblar as restrições, como já acontece com as tarifas de Trump 1 (e políticas de vários governos dos EUA). Parceiros, vizinhos e aliados da China tornam-se veículos ou intermediários do capital e da produção chinesas. O pequeno Vietnã ora tem o terceiro maior saldo comercial com os EUA (US$ 105 bilhões, em 2023; o déficit com a China, o maior, é de US$ 279 bilhões). A

 fim de fazer valer sua vontade, Trump viria a impor outras sanções contra países da conexão comercial ou de investimentos chineses e contra outros dribles?

Trump quer que países da Otan e do Leste da Ásia paguem a conta da proteção militar americana. Criaria problemas na endividada e lerda Europa e pânico em Taiwan, para começar. Mais importante, sem dinheiro e armas americanas, qual seria a atitude diplomática e econômica de tais países e blocos?

MOEDA MUNDIAL – Um exemplo menor. A conversa sobre a substituição do dólar subiu de tom com o confisco de reservas da Rússia e o banimento do país das redes financeiras ocidentais, entre outros rearranjos. A perda de peso do dólar ainda é pequena; o poder da moeda está longe de depender só de política. Mas as coisas se movem.

Trump quer trocar a burocracia, o governo racional, o serviço público de Estado, por um séquito. Ameaça meter a mão até no Banco Central, o que teria consequências para o financiamento da explosiva dívida americana e para taxas de juros mundiais, para nem mencionar a insegurança que causaria nos donos do dinheiro grosso, que estacionam seus haveres nos EUA.

O republicano quer dar cabo da transição ambiental; por tabela, ameaçaria compromissos do resto do mundo. A fim de deportar milhões de imigrantes ilegais (o que teria efeito econômico sério), criaria campos de concentração e um grupamento policial-militar de caça e intervenções? Os EUA têm Guantánamo, recorde-se.

A existência de advogados e juízes prova que tendemos ao mau-caratismo

Como Identificar Pessoas de Mau-Caráter - Associação Espírita Allan Kardec

Às vezes, não é nada fácil perceber que alguém é mau caráter

Luiz Felipe Pondé
Folha

Almas superficiais, as mais adaptadas à vida social e política —já que a democracia as premia—, diriam que a direita no Brasil deu no bolsonarismo e marçalismo —que alguns tratam como “vírus”, imagine se a direita tratasse elementos da esquerda como “vírus” num argumento tido como parte da inteligência pública!— e a esquerda deu no cu.

No entanto, as coisas não são assim tão simplesmente miseráveis. Elas são, sim, mais sofisticadamente miseráveis.

NATUREZA HUMANA – Hipótese em questão: todas as iniciativas políticas ou religiosas humanas, cada vez mais afins, morrem na praia por uma razão muito simples —a natureza humana.

Os progressistas, sejam eles de escopo socializante, sejam otimistas de mercado, erram num princípio avassalador: o ser humano é, basicamente, mau caráter quando tem a chance de ser, para servir aos seus objetivos. As raras exceções confirmam a tendência universalizante da regra.

E mais: essa tendência inexorável ao mau-caratismo é sofisticada nas suas formas materiais no mundo, isto é, posso ser mau caráter de modo tal que o seja em nome do bem público, em nome de uma causa, em nome de um grupo, em nome de melhoria salarial, em nome das populações mais vulneráveis, em nome da arte, em nome da educação, enfim, até em nome da deusa.

TESE CONCRETA – A história de longa duração comprova essa tese enquanto a tese contrária —a natureza humana tende a ser de bom caráter— só é passível de sustentação na utopia.

E, mesmo quando se tentou realizar historicamente essas utopias, a tendência ao mau-caratismo comportamental se mostrou mais verdadeira empiricamente. Sinto muito, o espelho das almas não mente.

Sei. Muitos estão a dizer que a hipótese aqui descrita não se sustenta porque a natureza humana não existe. Sempre achei esse argumento excepcionalmente fofo quando enunciado por adultos. Mas, antes de deixar claro ao que me refiro como natureza humana, devo lembrar que, mesmo que não existisse, a realidade pura e simples ainda sustentaria a hipótese de que há uma tendência inexorável ao mau-caratismo na espécie, assim o prova de forma definitiva a existência dos advogados e juízes.

DIREITO NECESSÁRIO – Enfim, enquanto existirem advogados e juízes, o ônus é de quem quiser negar essa hipótese. Sei que muitos profissionais da área poderão argumentar que o direito é necessário para a sociedade.

Quem seria louco de negar esse fato? A verdade desse fato, de novo, comprova a tese de que há uma tendência inexorável ao mau-caratismo na espécie.

Há aqueles que dirão que o direito pode estar a favor do bem social —e não apenas da manutenção da ordem, seja ela qual for. A estes eu diria que, seguindo o filósofo Blaise Pascal, do século 17, não fosse pelos salamaleques gestuais e de figurino do mundo do direito, todo mundo perceberia o vazio de qualquer vínculo das leis com o bem.

CRENÇA DE INGÊNUOS – Aliás, dizem que este não passa de uma abstração delirante do platonismo. E de uma crença de almas de pessoas ingênuas.

Pessoalmente, discordo de modo suave dessa hipótese que nega a existência de alguma forma de bem. Por exemplo, o filme dinamarquês “Bastardo”, com Mads Mikkelsen, apresenta, no meu entendimento, seguindo a evolução dramática do personagem principal representado pelo ator aqui citado, uma forma muito clara do que seria um tipo de comportamento moralmente consistente na vida de uma pessoa, entre a miséria repetitiva do mundo, mesmo que de formas variadas ao longo do tempo e do espaço.

Mais uma vez, o cinema dinamarquês, assim como o argentino, salva quem aprecia filmes não idiotamente ideológicos, melosos ou simplesmente estúpidos.

NATUREZA HUMANA – Mas devo dizer o que estou pressupondo como “natureza humana”. Generosamente, apresento aqui o que quero dizer por tal expressão, foco de tanto vespeiro ao longo da história da filosofia e das ciências humanas.

Não entendo por natureza humana nenhuma herança do pecado original, nenhuma estrutura biológica selecionada ao longo da evolução da espécie ou nenhuma forma pessimista de estrutura psíquica imutável. Poderia, sim, sustentar tais hipóteses, mas não seria este o momento, nem preciso fazê-lo para manter a hipótese aqui citada como sendo “a natureza humana tende inexoravelmente ao mau-caratismo” —já disse que a existência pura e simples dos advogados e juízes são uma prova incontestável dessa hipótese.

Por natureza humana, entendo o seguinte: dadas certas condições a priori que se repetem, se repetirão certos comportamentos. Você já disputou um apartamento na Praia Grande com irmãos e primos? Já viu alguém disputando uma eleição?

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Sensacional texto de Pondé. Fica comprovada a tese de que, quando não fala de política, Pondé faz as melhores análises políticas da espécie humana. Ave, Pondé reúna as crônicas e solte uns livros… (C.N.)

Quem é melhor para nós: Trump ou  Kamala? Resposta: nenhum dos dois

Lula diz que torce por vitória de Kamala nos EUA | AGORA CNN - YouTube

Quando Lula abre a boca, os interesses nacionais estremecem

Joel Pinheiro da Fonseca
Folha

Lula não deveria ter expressado sua torcida na eleição americana. Seja quem for o próximo presidente, é de nosso interesse ter uma boa relação. Ter chamado Trump de contrário à democracia, fascista e até mesmo nazista em nada nos ajudará se ele for eleito.

Dito isso, é fato que, no que diz respeito à democracia liberal, Kamala é melhor que Trump. O mundo vive um retrocesso democrático, que também se faz sentir no Brasil. A eleição de Trump será um duro golpe a todo o esforço de proteger as regras do processo democrático e as salvaguardas institucionais contra movimentos populistas que buscam derrubá-las. Ele não só criará um momentum favorável para o populismo de direita como também poderá criar embaraços para o STF, contra quem Elon Musk deve acalentar desejos de vingança.

MEIO AMBIENTE – Outra pauta em que Kamala é melhor para nós é o meio ambiente. Para Trump, restrições ambientais são um estorvo inútil. Ele deve desregulamentar a economia americana para crescer mais rápido no curto prazo e não participará de nenhuma iniciativa global contra a mudança climática.

O Brasil já paga um preço alto pelas mudanças climáticas. Nossos esforços de preservação da Amazônia precisam ser devidamente remunerados pelo resto do mundo, e nossa melhor chance dessa pauta progredir é com Kamala na Presidência. Um mundo no qual o meio ambiente é prioridade é um mundo em que o Brasil tem vantagens comparativas.

Nem Kamala, nem Trump (nem Lula) parecem querer novos acordos comerciais, o que é uma pena. Ambos são protecionistas e ambos entendem que é preciso conter a expansão econômica chinesa, mas não da mesma maneira.

“COMPETIDORES”  – Para Trump, todo o resto do mundo é composto de possíveis competidores dos EUA. Ele promete “tirar empregos” não só da China, como da Alemanha e do Reino Unido. Kamala deve favorecer seus aliados e melhorar relações com o continente.

Com a estabilidade democrática do México em dúvida, o Brasil cresce como alternativa do nearshoring. Com Kamala, essa alternativa provavelmente dependerá de cumprirmos critérios trabalhistas e ambientais, incentivo que é bom para o nosso desenvolvimento sustentável.

Não que Trump seja inteiramente ruim para nós. Sua maior dureza com a China cria uma oportunidade para o Brasil, já que, se o agro americano reduz suas vendas para a China, o nosso cresce. Ao mesmo tempo, nos deixará mais dependentes da China.

OUTRAS DIFERENÇAS – Trump enfraquecerá ainda mais os organismos multilaterais que, em algum momento, pareciam ser o futuro da governança global. Com ele, é cada um por si. Kamala tende a ser mais favorável (ou, ao menos, menos nociva) a um mundo baseado em regras e diplomacia, seja para o comércio, seja para o meio ambiente. Trump pode colocar mais medo nos inimigos dos EUA, mas Kamala oferece mais oportunidades para seus aliados.

Trump na Presidência pode ser mais desafiador para o Brasil, ambos terão seus riscos e suas oportunidades que caberá ao país saber aproveitar. Como sempre, nosso desenvolvimento (ou falta dele) depende mais de nós do que de qualquer fator externo, embora um vento a favor seja sempre bem-vindo.

Lula poderia torcer menos pela eleição dos EUA e atacar mais os problemas do Brasil.

Lula e Bolsonaro se unem e ensinam que “a política não é para amadores”

O presidente Lula e o ex-presidente Bolsonaro apoiam mesmo candidato à presidência da Câmara. Fotos: Wilton Junior / Estadão

Lula e Bolsonaro sabem se unir quando existe interesse mútuo

Francisco Leali
Estadão

Você é daqueles que não topa com o PT, o petismo e sua maior estrela, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva? Ou está entre os que não suportam bolsonaristas, bolsonarismo e o próprio Jair Bolsonaro? Esteja do lado que estiver, saiba que os dois grupos estão juntos agora. E vão ficar assim até que seja eleito o próximo presidente da Câmara dos Deputados. Traduzindo: Lula e o PT, Bolsonaro e seu PL, todos apoiam um mesmo candidato.

O anúncio com destino comum dos votos dos deputados de ambos os grupos foi divulgado na última quarta-feira, dia 30.

SEM AMADORISMO – PT e PL estão abraçados ao nome do deputado Hugo Motta (Republicanos-PB) para assumir o posto de presidente da Câmara quando o atual ocupante do cargo, o deputado Arthur Lira (PP-AL), terminar sua gestão no início de 2025.

Ver Lula e Bolsonaro juntos no palanque de mesmo candidato seria inacreditável se a política fosse arena para amadores. Não é. No mundo que os dois circulam o que anda valendo são gestos calculados com motivações claras.

O atual e o ex-presidente têm interesses diversos, obviamente, mas que resultam numa confluência conjuntural que os leva a bancar o nome de Motta, ungido pelo atual presidente da Câmara.

NA PAUTA – Lula depende de certa cortesia e diálogo com quem ocupa a direção da Casa Legislativa. Os atos de governo que pretende empreender dependem da concordância do deputado que estiver no posto máximo da Câmara que tem o poder de pôr para votar ou deixar na gaveta qualquer projeto.

Do mesmo modo, Bolsonaro também quer na cadeira alguém que não seja governista raiz e que faça andar os temas que lhe interessam. O prioritário é o projeto que o anistia e restitui seu direito de disputar uma eleição. Até onde se sabe, esse ponto foi colocado na mesa como condição para o PL apoiar o candidato de Lira.

Assim, o malabarismo político junta salvação de Bolsonaro com disputa pelo poder entre deputados. Reforça essa indicação o fato de Bolsonaro, até aqui, ter reagido com inusitada calma e tranquilidade ao fato de que o projeto da anistia, prestes a ser votado em uma comissão da Câmara, teve sua apreciação adiada por Lira. Mesmo assim, o ex-presidente declarou não se opor.

PT SEM INTERESSE – Já Lula, poder-se-ia acreditar, seria frontalmente contrário a um acordo para anistiar o antecessor que flertou com golpe e chegou a rascunhar minuta para anular as eleições. Mas, até onde se vê, o círculo petista não parece mobilizado ou se importar com o tema publicamente. Afinal, esse não é um problema que hoje diz respeito à gestão petista nem afeta o modo como governa.

Num livre pensar, haverá quem cogite que o presidente não descarta um eventual retorno de Bolsonaro às urnas na próxima eleição para ter como oponente um adversário já conhecido e derrotado. Melhor ir contra o sabido do que a um desconhecido embate.

Enquanto 2026 não chega, Lula e Bolsonaro se unem por Hugo Motta. A façanha acaba dando diploma de PHD em política profissional a um quarto personagem: Arthur Lira que vai saindo de cena dando as cartas e indicando para onde a Câmara deve seguir.

Hoje, a América pode estar prestes a se tornar um lugar bem mais sombrio

Utilizadores do Tik Tok e fãs de K-pop queriam Trump sozinho no palco - SIC  Notícias

Os democratas tentam demonizar Trump, mas parece ridículo

Paul Krugman
Folha (NYT)

Não sei quem vencerá a eleição presidencial. Ninguém sabe. Mas há, obviamente, uma chance substancial de que Donald Trump retorne ao poder. Estou preocupado com o nosso país e com o que minha própria vida seria sob um segundo mandato de Trump. E você também deveria estar.

O primeiro mandato de Trump, no qual nossa democracia permaneceu relativamente intacta, é um mau modelo para o que acontecerá se ele conseguir um segundo. As barreiras que o contiveram da última vez desapareceram. Se ele recuperar o poder, esta pode muito bem ser a última eleição mais ou menos livre e justa da América por um longo tempo.

E ENTÃO? – Alguns sugeriram que podemos estar caminhando para uma “autocracia suave” como a de Viktor Orban na Hungria, na qual o partido governante mantém o poder manipulando eleições, controlando os tribunais e silenciando a mídia, em vez de através de repressão violenta.

Deveríamos ter tanta sorte. Porém, há muitas razões para pensar que Trump e seus apoiadores mais fervorosos estão ansiosos para usar a violência contra seus oponentes: Quase quatro anos atrás, uma multidão violenta desceu sobre o Capitólio dos Estados Unidos e tentou reverter os resultados da última eleição presidencial.

Mais recentemente, Trump, que chamou seus adversários políticos de “vermes”, sugeriu usar nosso exército contra “o inimigo interno”.

COM UM RIFLE -Na semana passada, ele criticou as visões belicistas de Liz Cheney —que endossou Kamala Harris— e então fantasiou: “vamos colocá-la com um rifle ali” e ver como ela se sentiria “quando as armas estivessem apontadas para o rosto dela”.

No domingo, em um comício, ele declarou que alguém tentando pegá-lo “teria que atirar através das notícias falsas e eu não me importo tanto com isso.”

Também é importante perceber que Trump não precisaria usar o exército contra cidadãos americanos para criar um clima de medo e repressão. Tudo o que ele teria que fazer é tacitamente conceder permissão aos muitos extremistas que estão entre seus apoiadores para agir como vigilantes.

RECONSIDERAR -Ainda assim, você pode imaginar que, mesmo se a América se tornar “Magafied”, você não estará pessoalmente em risco. Se é isso que você acredita, talvez queira reconsiderar.

No final, não importará se você não está vivendo ilegalmente nos EUA ou se é porto-riquenho ou um democrata vocal.

Você trabalha para uma organização de notícias? A menos que seu veículo tenha sido um torcedor fervoroso dele e de sua agenda, Trump considera você um “inimigo do povo”. E o apoio deve ter sido alto; Trump até acusou a Fox News de ser “fraca e suave com os democratas.”

É ESTATÍSTICO? – Você trabalha em uma agência estatística do governo? Alegações falsas de que números que o Maga não gosta são fraudulentos agora são prática padrão republicana. Se, como sugerem pesquisas de economistas, as políticas de Trump se mostrarem altamente inflacionárias, eu não ficaria nem um pouco surpreso se houver uma purga no Bureau of Labor Statistics, com funcionários civis profissionais sendo forçados a sair e substituídos por leais que produzirão números mais favoráveis.

Finalmente, você é um apoiador de longa data de Trump? Movimentos radicais que tomam o poder muitas vezes acabam devorando os seus próprios. Às vezes isso acontece porque eles não eram radicais o suficiente —eram como John Kelly, que foi um dos secretários de Segurança Interna de Trump e um de seus chefes de gabinete da Casa Branca, mas agora descreve Trump como “um autoritário” que “certamente se enquadra na definição geral de fascista.”

. Às vezes, no entanto, antigos apoiadores acabam punidos simplesmente porque estavam do lado errado de uma luta interna pelo poder

Em suma: a América pode estar prestes a se tornar um lugar muito sombrio. E aqueles que imaginam que suas vidas simplesmente continuariam como antes, intocadas de qualquer maneira significativa pelo potencial medo e caos, estão cometendo um grande erro.

Lula e Lula e governadores debatem segurança e o resultado é nada sobre nada

Charge/Cartum – Junião (Arquivo Google)

J.R.Guzzo
Estadão

É óbvio, por qualquer critério que se queira adotar, que o brasileiro é um dos seres humanos mais oprimidos do mundo pelo crime. A ameaça real, imediata e perigosa, no seu dia a dia, não é a faixa de Gaza, a “crise climática” ou a bancarrota da indústria naval. É o revólver apontado para a sua cabeça pelo bandido que quer tomar a moto que ele usa para trabalhar, o cartão do banco e o celular. A única atitude pública eficaz para proteger o cidadão do crime é tratar o crime como crime. É tudo o que não se faz.

SÓ MARKETING – Após quase dois anos de meditações, o governo da União achou que estava na hora de conversar um pouco sobre a questão prioritária para o brasileiro comum – a defesa da sua vida, da sua família e da sua propriedade. Mas o que fez, no mundo dos fatos, foi só isso: conversar.

Conversaram durante mais de quatro horas seguidas: os magnatas da máquina federal, os gatos gordos da polícia e os governadores. Obviamente, não se resolveu nada. Como seria possível resolver alguma coisa numa reunião com dezenas de pessoas na mesa? Isso não existe.

Mais uma vez, como ensina o Barão de Itararé, de onde menos se espera é de onde não sai nada, mesmo. O Brasil vive hoje numa situação de território invadido e progressivamente ocupado pelo inimigo – o crime organizado, desorganizado e convencido, cada vez mais, que a polícia, a justiça e quem mais vier são impotentes contra ele.

VENCER OU VENCER  – Num mundo racional, a única opção do aparelho do Estado seria combater o inimigo, como se combate uma tropa invasora. Foi a única coisa que não fizeram na reunião.

Em vez de saírem com algum consenso quanto à necessidade primária de enfrentar de verdade os criminosos, as autoridades presentes ao Concílio de Brasília ficaram discutindo os quadrinhos de cada um no organograma dos governos.

Em vez de atacar o crime, ficaram brigando entre si para saber quem manda nisso ou naquilo, quanto de verbas devem ter e questões administrativas que só interessam a eles. Falaram, até, em “pacto federativo”.

VOLTAR VIVO – O cidadão brasileiro que sai todo dia de casa sem saber se vai voltar vivo, ou se as suas filhas foram violentadas, não precisa de “pacto federativo”. Precisa que a autoridade pública tire de sua frente o bandido que transforma sua vida num inferno.

Ele está na rua por um motivo básico: a impunidade, que vem sendo imposta ao País, há 30 anos seguidos, por uma legislação claramente suicida. As leis penais e a justiça protegem agressivamente o criminoso. Decidiram que ele tem de ser ajudado, e não punido. O resultado está aí.

O governo faz o “enfrentamento” de tudo, de fake news a atos golpistas. Poderia, talvez, enfrentar o crime.

Desaceleração da China é inevitável e o Brasil precisa se situar melhor

China: o que problemas da segunda maior economia global significam para o  mundo - BBC News Brasil

Queda da população está enfraquecendo a economia da China

José Roberto Mendonça de Barros
Estadão

Retomo meu último artigo: a desaceleração da China é inevitável e terá grandes consequências na arena global e em nosso País. Vejam os leitores que há várias semanas o governo chinês vem soltando medidas para reativar os mercados, sem grande sucesso.

Outro indicador do ceticismo dos analistas, com o qual concordo e que reputo importante, é a fraqueza do mercado de petróleo. Mesmo com todo o pacote chinês, a cotação do Brent não descola dos US$ 70 por barril. A demanda por óleo vem sendo revisada para baixo e parece claro que, ante o mínimo sinal da possibilidade de um cessar-fogo no Oriente Médio, veremos os preços irem para a faixa dos US$ 65 – vale lembrar que a Arábia Saudita começará a bombar mais produto a partir de setembro. Não será a demanda chinesa que vai sustentar o mercado.

POPULAÇÃO – Mas, a meu ver, a acelerada queda da população e seu envelhecimento são o centro do problema. Os jovens não querem ou postergam os filhos porque têm idosos para sustentar e têm receio de não poder pagar os custos de uma boa educação, especialmente em um momento de alto desemprego dos recém-formados.

A projetada queda de 200 milhões de pessoas até 2054 é sem precedentes num país onde a renda per capita ainda é baixa. O temor de ficar velho antes de ficar rico parece ter fundamento.

Com isso, o consumo interno tende a crescer mais lentamente, ao contrário do que acontece em outros países da Ásia, até porque parte dos investimentos estrangeiros antes canalizados à China agora busca Índia e outros destinos na região.

BLOQUEIO DE COMERCIO – Ao mesmo tempo, a preocupação com segurança tem limitado a expansão de empresas inovadoras. As exportações também terão mais dificuldades de crescer porque, especialmente nos países ricos, uma ativa política de bloqueio de comércio está se desenvolvendo. Isso é particularmente visível no segmento de carros elétricos e de matérias-primas básicas.

Somando tudo, a economia chinesa irá desacelerar lentamente para a faixa de 4% ao ano. Por outro lado, a população americana seguirá crescendo: a ONU estima que, entre 2023 e 2050, passará de 343 milhões para 380 milhões de habitantes. O consumo e o PIB vêm se expandindo de forma robusta e o progresso técnico tem sido impressionante.

Apostar que a China será a ganhadora na arena global, sobrepujando um “império decadente”, parece um lance excessivamente ousado. Melhor faria o Brasil cultivar relações amistosas e construtivas com todos os líderes globais.

Partidos não se manifestam sobre novo ajuste, à exceção do PT, que está contra

Ajuste fiscal significa respeito ao pagador de impostos – Campal Serviços Contábeis

Charge do Jônatas (Arquivo Google)

Carlos Alberto Sardenberg
O Globo

Considerem o MDB, um dos vencedores nas eleições municipais. Uma ala do partido, pessoal do Norte e Nordeste, acha que o resultado dá o lugar de vice na chapa de Lula em 2026. Outra ala considera uma candidatura de centro. Uma terceira, caminhando pela direita, acaba de derrotar o PT de Lula em capitais importantes como São Paulo e Porto Alegre. Por que não continuar por aí?

Considerem o PSD, mais conhecido como partido do Kassab, outro vencedor nas últimas eleições. Como o MDB, tem três ministérios no governo Lula. E Kassab como um dos principais articuladores do governador paulista, Tarcísio de Freitas. Como no MDB, uma ala do PSD também acha que tem vaga na vice de Lula. Desde já, os dois partidos entendem que merecem ministérios mais robustos, com mais dinheiro para gastar.

DEBATE VAZIO – Essa conversa circulou nos meios políticos nesta semana pós-pleito municipal. Na economia, a semana começou com a expectativa em torno do pacote de corte de gastos a ser anunciado pelo governo Lula. E terminou do mesmo modo, sem pacote e com muita incerteza.

O que aqueles dois partidos, vitoriosos, disseram sobre esse que é, de longe, o tema mais importante do momento? Nada. Mesmo porque, se fossem dizer alguma coisa, seria mais ou menos assim: baita problema do Haddad e do Lula.

É verdade que a economia tem um lado bom. Há crescimento, geração de emprego e de renda. Isso até oferece um álibi aos políticos. Tipo assim: se a economia real vai bem, o resto é especulação do mercado. Cabe também para o PT. Aliás, a bem da verdade, o PT é o único partido que se manifestou sobre o corte de gastos: e é contra.

PROBLEMAS GRAVES – Mas há muitos sinais de problemas concretos. O dólar, que abriu o ano abaixo dos R$ 5, era negociado a R$ 5,87 ontem à tarde. A bolsa B3, que chegou a passar dos 137 mil pontos em agosto, rodava ontem nos 128 mil, em queda há semanas.

Afetando diretamente o bolso das pessoas, a inflação, que estava em queda na primeira metade do ano, está agora em alta. Se a discussão ontem era saber quando o IPCA chegaria à meta de 3% ao ano, hoje o índice ultrapassa o teto da meta, de 4,5%. O dólar caro é uma causa importante dessa alta.

Afetando diretamente os negócios, os juros, que estavam em queda no começo deste ano, agora estão em alta. Até julho, o Banco Central estava em redução da taxa básica de juros. A especulação era otimista: quando a taxa cairia abaixo de 10%? Hoje, é o contrário. A taxa está em 10,75% ao ano, e a pergunta que ocupa os meios econômicos é saber quando passará dos 13%.

CAIU A FICHA – Não seria preciso, mas convém dizer: juros altos limitam investimento e consumo, reduzindo, pois, o ritmo de crescimento. Portanto, não estamos falando de especulação, mas da economia real.

O que houve? Caiu a ficha. Entre os agentes econômicos formou-se a expectativa de que o arcabouço fiscal não produzirá o superávit prometido nas contas públicas. Ao contrário, caminha para déficits em todos os anos do governo Lula. Não conseguindo pagar suas contas com as receitas, o governo precisou tomar dinheiro emprestado. Faz isso vendendo títulos do Tesouro. Problema: a juros cada vez mais caros, o que aumenta o gasto financeiro.

Como têm notado os economistas — e parece que são os únicos preocupados —, o Tesouro tem pagado juros reais (acima da inflação) na casa dos absurdos 7% ao ano. Uma dívida caríssima. E os juros pagos pelo governo contaminam todo o mercado.

AJUSTE DE GASTOS – Logo, é preciso fazer um programa de ajuste de gastos, como sabe muito bem a equipe econômica. Ocorre que não se faz o corte sem afetar programas sociais, coisa que o presidente Lula não quer.

Daí as incertezas. Bem a propósito do que dizia Jean-Claude Juncker, então presidente da Comissão Europeia: sabemos que ajuste devemos fazer; o que não sabemos é como ganhar a eleição depois disso.

Tudo considerado, é praticamente impossível que saia um programa consistente de ajuste das despesas. Faltam condições políticas. O governo empurrará o problema. Gostaria de ficar sem ajuste para ganhar as eleições. Pode acumular déficit e derrotas.

Lula e Jair Bolsonaro demonstram que foram feitos um para o outro

Debate na Globo: Lula e Bolsonaro não poderão tocar um no outro

Lula e Bolsonaro têm pavor de enfrentar Tarcísio em 2026

Mario Sabino
Metrópoles

Arthur Lira tirou o projeto de lei que anistia os implicados no 8 de janeiro da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, que o votaria nesta semana, e criou uma Comissão Especial para discutir o troço. Com isso, adiou a votação sobre o assunto para as calendas de 2025 ou até o início de 2026. Jair Bolsonaro e PT apoiaram a decisão por motivos aparentemente opostos.

O pretexto de Lira é que o projeto de lei estava sendo usado irresponsavelmente como moeda de troca por apoios aos nomes que disputam a sua sucessão na presidência da Câmara. É uma verdade parcial. A verdade inteira é que o cenário político em data mais próxima à eleição presidencial determinará o caminho a ser seguido pelos deputados.

BOLSONARO NA LISTA – Jair Bolsonaro, que está para ser indiciado pela PF no inquérito que investiga a “tentativa de golpe”, acredita que haverá condição para o seu nome ser incluído entre os anistiados e limpar a sua ficha de uma vez. Com isso, ele se livrará da inelegibilidade e será candidato a presidente, em 2026.

 Ele se preocupa muito mais com si próprio do que com os presos do 8 de janeiro, apesar do apelo cínico ao coração de Lula..

O PT, por sua vez, trabalhará à luz do sol para que o sonho de Jair Bolsonaro não se concretize. Sob a lua, contudo, pode deixar o barco do ex-presidente correr, porque ele é o oponente ideal para concorrer com Lula, como este sexagenário aqui não se cansa de repetir, embora tomado por certa sonolência…

DISPUTA DE REJEIÇÃO – A campanha com Jair Bolsonaro se tornaria, assim, apenas um campeonato de rejeição, como ocorreu em 2022: quem tiver a mais baixa, será eleito.

Lula acha que será menos rejeitado pelo eleitorado do que Jair Bolsonaro, ao contrário do que ocorreria em relação a outro candidato da direita, como Tarcísio de Freitas ou Ronaldo Caiado.

Jair Bolsonaro pensa diferente, claro, mas na mesma linha de raciocínio. Aposta que a rejeição a Lula, depois de um terceiro mandato decepcionante, será maior do que a dele.

ÚLTIMA PALAVRA – Se o projeto de lei passar na Câmara, restará saber qual será a posição do STF, que irremediavelmente dará a última palavra, em julgamento ou não. Se os senhores ministros concluírem que Jair Bolsonaro elegível é bom para Lula, eles vão liberar o cavalo bolsonarista para a corrida.

Lula e Jair Bolsonaro são os candidatos perfeitos tanto para um quanto para outro, não para o Brasil. Para o país, o melhor seria Lula pendurar as chuteiras gastas e Jair Bolsonaro enfiar a sua viola desafinada no saco.

No mínimo, o nível das metáforas seria outro. Como sempre, porém, o Brasil não importa quase nada no jogo brasiliense.

Por que o PT pode amargar a mesma  sina de derrocada do PSDB?

STIMEPA - Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Porto Alegre

Ilustração reproduzida no sindicalismo

Marcus André Melo
Folha

Os resultados eleitorais pífios do PT excluíram uma reflexão mais ampla sobre o seu significado. Uma das razões da perplexidade diz respeito ao chamado “efeito incumbência”, que foi praticamente nulo nas eleições. O que, registre-se, não aconteceu com o PSDB, em sua trajetória de declínio terminal. O número de prefeituras conquistadas pelo PT é irrisório; 4/5 delas estão em pequenos municípios no Nordeste.

Um município —Fortaleza— responde pela maior parte da população a ser governada, mas o prefeito eleito se filiou ao partido em 2023, após três mandatos pelo PDT.

EM DECLÍNIO – O fato de que Lula foi eleito em 2022 obscureceu o brutal enfraquecimento do partido no Congresso e na sociedade em geral.

O declínio do PT e do PSDB não interessa só porque vertebraram uma competição política por duas décadas: trata-se dos únicos partidos programáticos “presidenciáveis” do país. O percentual de votos combinados das duas siglas no primeiro turno foi de 44% (1989), 85% (1994 e 1998), 70% (2002), 90% (2006) e 80% (2010) e 75% (2014) .

Até 1998 ganharam centralidade no sistema partidário, que ganhou musculatura. Entre 1989 e 1998, os três maiores partidos expandiram sua participação no total das cadeiras de 46% a 56% do total; mas a partir deste ano caíram monotonamente: 48% (2002), 46% (2006), 42% (2010), 37% (2014) e 28% (2018).

MAIS PARTIDOS – Durante 13 anos o número efetivo de partidos políticos (NEPP) também declinou e depois explodiu: oscilou em torno de 8: 9,1 (1989), 8,1 (1994), 7,1 (1998), 8,4 (2002), sobe a 9,3 (2006), dispara para alcançar 13,4 (2014) e inacreditáveis ​​16,4 (2018).

Há vários fatores que explicam o declínio do PT e do PSDB, mas os escândalos de corrupção —mensalão, petrolão, JBS/Aécio— foram decisivos para esse resultado. O grau de visibilidade política proporcionada pela exposição pornográfica da corrupção no Petrolão —através de vídeos e gravações— tem alguns paralelos no mundo.

Tais escândalos não tiveram impacto sobre os demais partidos que foram membros das coalizões de governo e foram profundamente implicados, mas que se fortaleceram simultaneamente à fragmentação paulatina partidária a que se assistiu. Por que apenas os dois partidos programáticos foram afetados pelos escândalos de corrupção?
EXPLICAÇÃO S – Aqui há dois fatores explicativos, como   argumentamos em trabalho recente coautorado com Ivan Jucá (Cepesp-FGV).

O primeiro é que PT e PSDB ascenderam à Presidência, onde se concentraram a responsabilização política. O segundo é que foram os partidos programáticos que tiveram grande visibilidade à bandeira de governo limpa quando na oposição.

Há assim uma inconsistência dinâmica perversa no sistema político: os partidos programáticos têm sucumbido, enquanto os partidos fisiológicos que “gravitam em torno do Executivo” —independentemente de sua coloração ideológica—, dão suporte parlamentar e sobrevivem a presidentes minoritários.

CARTELIZAR – Mais do que isso, estes lograram cartelizar o sistema criando barreiras à entrada (leia-se fundos partidários/campanha bilionários) que criam vitórias fortíssimas pró-incumbente.

Contrariando as expectativas teóricas, esses partidos fisiológicos, como mostra Ivan Jucá, são fortemente centralizados, o que lhes garante o controle vertical sobre os fundos públicos turbinados.

Eleições mostram que o populismo vale mais que o carisma do político

Lula e Bolsonaro em momentos na presidência

Lula e Bolsonaro pretendem reencarnar outra vez o populismo

Merval Pereira
O Globo

Já fizemos duas consultas populares sobre o melhor sistema de governo para o país, uma em janeiro de 1963, outra em abril de 1993. Nas duas o presidencialismo venceu o parlamentarismo. Não é à toa, portanto, que o ex-presidente Jair Bolsonaro esnoba as alternativas que se colocam no campo da direita, e Lula continua imbatível como grande líder da esquerda.

Os dois sabem que, numa disputa presidencial no Brasil, vale mais o carisma dos candidatos que programas de governo.

CONSTATAÇÃO – A vitória da centro-direita nas eleições municipais recentes demonstra que os partidos dessa tendência estão mais organizados nacionalmente que a esquerda, e Bolsonaro, mesmo tendo evidentemente saído menor desta eleição, continua sendo a melhor opção eleitoral da direita.

Errou em São Paulo, quando ficou tentado a apoiar Pablo Marçal e disse que o prefeito Ricardo Nunes, afinal reeleito, não era o seu candidato ideal. O governador Tarcísio de Freitas bancou o prefeito desde o início, ganhou e cacifou-se como principal alternativa na corrida presidencial.

Se Marçal não fosse uma ameaça a sua própria liderança, Bolsonaro se sentiria mais à vontade o apoiando. Como tem a desvantagem de estar inelegível — e acredito que dificilmente terá permissão para concorrer —, muitos candidatos já se apresentam.

ALTERNATIVAS – Os candidatos alternativos são especialmente governadores, como Tarcísio em São Paulo, Ronaldo Caiado em Goiás, Romeu Zema em Minas, Ratinho Júnior no Paraná, Eduardo Leite no Rio Grande do Sul. Mas Bolsonaro tem uma vantagem: é o único líder popular da direita que pode se contrapor a Lula. Nenhum outro governador, entre os que podem se candidatar a presidente em 2026, tem liderança popular.

Embora a polarização não tenha se efetivado nesta última eleição, a política corre entre esses dois polos, Lula na esquerda, Bolsonaro na direita.

Nenhum deles tem força para eleger um sucessor. Mesmo Dilma Rousseff era “a mulher do Lula” na campanha presidencial. Até porque o presidencialismo é muito pessoal, depende menos de projetos ou programas e mais da figura patriarcal.

POPULISMO – Historicamente, no Brasil, os candidatos populistas se elegeram, fossem Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros, Fernando Collor.

Desde a redemocratização, só se elegeram políticos populistas, com exceção de Fernando Henrique Cardoso, que, sem ser populista de raiz, no entanto, deve duas eleições seguidas ao Plano Real, que tocou no bolso do brasileiro e mudou sua vida. Os populistas têm muita força no Brasil, por isso Bolsonaro desdenha seus supostos concorrentes:

— Colocam quantos no aeroporto quando chegam? — pergunta. Mas Bolsonaro não tem força para transferir votos a outros candidatos, como Lula também não.

LULA SOZINHO – Se não for candidato à reeleição, Lula não terá ninguém para pegar o bastão. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é um líder moderno dentro do PT, mas não tem a popularidade necessária para uma campanha presidencial, nem influência política para se impor.

Com Bolsonaro inelegível, será difícil para a direita conseguir um substituto com apelo popular. Caiado acredita que o eleitorado brasileiro amadureceu nesse período histórico — ele foi candidato a presidente em 1989 — e procurará não um líder populista, mas um candidato que seja bom gestor.

Caso cheguemos a 2026 sem que apareça uma novidade populista — sempre lembrando o perigo que representa Marçal —, podemos voltar várias casas atrás, repetindo a primeira eleição presidencial direta depois da ditadura, uma campanha com 22 candidatos. Mesmo naquele caso, os três populistas foram os primeiros colocados: Collor, Lula e Brizola.

Não há salvação para o artigo 19 na revisão do Marco da Internet

Marco Civil da Internet e Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais: entenda  as leis que regulamentam o mundo digital - Blog do Escavador

Atual Marco Civil da Internet fatalmente será modificado

Gustavo Binenbojm
O Globo

O STF marcou para novembro o julgamento sobre a constitucionalidade do art. 19 do Marco Civil da Internet (MCI). Trata-se da norma que prevê que os provedores de serviços digitais, como o YouTube e o Facebook, só poderão ser responsabilizados pelas postagens feitas em suas redes quando e se vierem a receber uma decisão judicial que lhes imponha a remoção daquele conteúdo específico e, ainda assim, decidam não retirá-lo.

Antes disso, as plataformas estão livres para distribuir mensagens com crimes de ódio, terrorismo, racismo ou qualquer outro atentado à vida, à saúde ou às instituições democráticas, sem responder pelos danos resultantes dessas postagens, ainda que tenham tomado ciência prévia da natureza ilícita daqueles conteúdos.

IMUNIDADE – O art. 19 apresenta uma curiosa autojustificativa: a liberdade de expressão. Foi um argumento comum em alguns círculos, quando a internet ainda era idealizada como a nova Ágora: se as plataformas respondessem pelos danos que causam à sociedade, acabariam por adotar uma postura de indesejável censura privada, passando a derrubar qualquer conteúdo controvertido postado em suas redes.

Necessitariam por isso do privilégio da imunidade conferido pelo art. 19 para manter um espaço livre às diversas formas de expressão. Nenhuma pessoa minimamente informada acredita mais nisso.

As plataformas digitais se tornaram o escoadouro de terríveis características humanas: desinformam, disseminam ódio e promovem divisão social. É como se a lei tivesse permitido que, em ambientes específicos, diversas atividades ilícitas pudessem ser praticadas livremente e sem qualquer consequência legal.

EXCEÇÕES – Existem duas exceções a essa benesse: para a divulgação sem consentimento de cenas de nudez e pornografia ou de conteúdos protegidos pelo direito autoral (como filmes, músicas e espetáculos esportivos), a notificação da vítima gera a responsabilidade da plataforma.

Ciente da ilegalidade, ela pode tomar as providências para a retirada do conteúdo ou, caso entenda de modo diferente, arcar com os danos que causar. Não custa lembrar, a regra para todos os demais mortais é a de responsabilizarem-se pelas consequências de seus atos, independentemente de qualquer notificação.

A Constituição contém extensa lista de direitos individuais e coletivos e prevê a responsabilidade de reparação dos danos decorrentes da sua violação. Entre eles estão os direitos à honra e à privacidade, que a exceção da pornografia protege, e o direitos dos autores sobre suas obras.

SOMENTE DOIS – Mas o que justifica que apenas esses dois direitos recebam a proteção da lei, e não os demais? Por que uma vítima de racismo ou homofobia tem que recorrer ao Judiciário para que seja retirada de uma plataforma digital a mensagem em que é humilhada, ofendida ou discriminada, enquanto ao titular de direitos autorais basta notificar o provedor?

Existe na Constituição alguma previsão que justifique esse tratamento assimétrico dos direitos fundamentais?

Só quem sente na pele o horror de uma mensagem difamante ou preconceituosa sabe o quanto é inútil buscar proteção em um processo judicial, que levará meses, às vezes anos, para fazer cessar a ofensa postada.

INCITAÇÃO AO ÓDIO – Ainda piores são os casos de ofensa a direitos coletivos, como em discursos de incitação ao ódio e à violência contra minorias, o abuso de crianças e adolescentes, terrorismo, além de ações coordenadas de desinformação em campos sensíveis como saúde pública, eleições e funcionamento da democracia.

Em todos esses casos, a retirada dos conteúdos ofensivos depende de decisão judicial — e até que seja intimada da decisão, a plataforma digital, que dissemina e lucra com o conteúdo ilícito, não pode ser responsabilizada — ou seja, nada tem a temer.

As plataformas detêm a tecnologia e os meios para monitorar e retirar de circulação os conteúdos ilícitos postados em suas redes (a ausência de conteúdo pornográfico nas grandes plataformas é um exemplo cabal).

CONTROLE AMENO – O regime de notice and take down (sistema de aviso e retirada) permite que esse processo se dê de forma ainda mais confortável para as plataformas, uma vez que a responsabilidade só nasce a partir da notificação do conteúdo ilícito.

Não é razoável que elas pretendam continuar a se eximir de qualquer responsabilidade, enquanto lucram de forma astronômica com mensagens que ofendem pessoas indefesas e corroem o tecido social.

A isenção de responsabilidade prevista no art. 19 é inconstitucional. O STF acertará se resistir à tentação de criar soluções heterodoxas para o problema, como o acréscimo de algumas exceções ao malfadado dispositivo. A sua concepção está caduca e deve ruir, sendo substituída pela solução do notice and take down, já adotada para a divulgação de mensagens pornográficas, tal como previsto no art. 21 do Marco Civil da Internet.

EXEMPLO CONCRETO – Em episódio recente, o próprio STF teve dificuldades para fazer uma big tech cumprir simples ordens judiciais de bloqueio de contas. Não é difícil imaginar o que passa um cidadão comum que tem seu nome injustamente enxovalhado em uma rede social.

A União Europeia, por exemplo, adotou no Digital Services Act o modelo do notice and take down, para sinalizar o conteúdo ilícito e deflagrar a responsabilidade das plataformas. Não cabe ao Brasil inventar novamente a roda, mas seguir o bom exemplo que vem de democracias avançadas, adotando também como regra geral o sistema de notificação.

Para situações mais graves, das quais possam advir riscos sistêmicos para a sociedade (como terrorismo, ódio contra minorias e ataques ao regime democrático), o STF também deve levar em conta a experiência estrangeira, com destaque para o Online Safety Act, do Reino Unido, e reconhecer a existência de um dever de cuidado das plataformas, o que inclui obrigação de moderação e sua responsabilidade desde a circulação inicial do conteúdo, o que, afinal, é a regra para todos os veículos de comunicação.

Entenda que a racialização é hoje um engano histórico, científico e cultural

Nota Oficial - Atentados xenofóbicos contra haitianos em São Paulo — Portal  da Câmara dos Deputados

Problema dos haitianos é que eles parecem ser negros demais 

Muniz Sodré
Folha

Paris, fins do século 19, num conto de Guy de Maupassant, um lixeiro de origem camponesa se apaixona pela servente africana de um bistrô. Propõe-lhe casamento, que depende de aprovação dos pais, por isso ambos viajam ao campo. A mãe do noivo fica encantada com a futura nora, bonita além de prendada nas artes domésticas. Para apresentá-la à aldeia, passeiam de mãos dadas. Mas os vizinhos se assustam, as janelas se fecham. A matriarca nega ao filho o consentimento.

Sempre apaixonado, ele se lamenta tempos depois, perguntando à mãe se o obstáculo tinha sido a cor da jovem. Responde a camponesa: “Não porque ela fosse negra, meu filho, mas era negra demais”

NEGROS DEMAIS – Esse insight agudo sobre a diferença etnocultural sobreveio semanas atrás quando, numa mesa-redonda, ouvimos de uma pesquisadora sobre imigração no Rio de Janeiro um relato inabitual.

Segundo ela, é impossível para haitianos encontrar postos de trabalho na zona sul da cidade, nem sequer como peões de obra, porque as senhoras de classe alta se assustam com a cútis negro-retinta dos imigrantes.

No conto de Maupassant, não estava em jogo o racismo stricto-sensu, pois a província ainda não conhecia africanos, era mais o medo primitivo à diferença. No caso dos haitianos, é também isso, acrescido de racismo pós-abolicionista.

SEM DIFERENÇAS – Essa questão pode ser cansativa, mas vale repisar sempre que algo aparece para mostrar que o identitarismo racial não toca o fundamento do racismo, que não precisa de raça para existir.

Relembrando que não há raças humanas, um site opinativo francês evocou há pouco o hematologista Jean Bernard, que enumerava três condições para uma diferença entre a raça A e a raça B:

(1) “as propriedades intrínsecas da raça A deveriam ser muito diferentes da raça B (2) a raça A e a raça B não poderiam se misturar (3) todos os membros de cada raça deveriam ter propriedades genéticas comuns, senão idênticas”. Nenhuma delas acontece na espécie humana, seja no plano biológico ou cultural.

O Visto

Têm carteira de trabalho, mas ninguém os contrata…

ENGANO HISTÓRICO – A racialização é de fato um engano histórico, científico e cultural. Encerrar alguém em identidades forjadas a partir de características fenotípicas, culturais e religiosas é um prolongamento do erro.

Mas a redefinição da esquerda pelo viés dito “identitário” (socio-corporal, na realidade) é um compromisso pragmático com a liberação de minorias das correntes em que foram aprisionadas por racismo e patriarcalismo.

Autoafirmação e autodeterminação são os valores progressistas em jogo. O jogador Vini Jr., atacado na Europa, neles se apoia em seu ativismo antirracista.

GARGALHADA – Vini Jr. é um negro que responde, trocando a tortura da gargalheira escravista pela gargalhada.

Mas essas pautas podem ter o mesmo efeito da jovem africana na aldeia. As janelas do “andar de cima” fecham-se ao que não é espelho. Hoje o racismo não mais tem a ver com identidade humana, como no período colonial, e sim com domínio social do ego moldado pelo corpo-imagem do mercado.

A “aldeia global” (metáfora de McLuhan) é tecno-narcisista, perpassada por um aturdimento inerente tanto à madame zona sul quanto ao pobre capturado por aberrações. Racismo é como uma pedra anticivilizatória que, lançada na água, reverbera. Suas raízes fizeram ecologia própria.