A lei não vale mais para todos; só para aqueles que Moraes e o STF apontam

O Ministro do STF Alexandre de Moraes preside seminário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre inteligência artificial, democracia e eleições

Moraes adapta as leis às suas necessidades processuais

J.R. Guzzo
Estadão

Está valendo no Brasil de hoje uma nova modalidade de “enfrentamento”, palavra requerida pelo vocabulário político da moda, a tudo que o regime considera como ameaça à democracia. A lei, no entendimento do STF e do seu público, tornou-se um estorvo para a defesa do Estado democrático. Há ali direitos para os acusados e deveres para a polícia – e a soma dessas duas exigências pode trazer todo o tipo de inconveniências para o ministro Alexandre de Moraes e suas esquadras de repressão às práticas golpistas.

A solução para a charada, na visão da autoridade suprema, tem sido simples: a lei continua valendo, mas não para todos. Para os que são definidos como indesejáveis, só vale o que o STF diz.

LADRÃO CONFESSO – Digamos que você seja um ladrão confesso do Tesouro Nacional e que tenha concordado em devolver o que roubou para não ser trancado numa penitenciária. A recomendação é ir para o STF, de preferência ao ministro Dias Toffoli, e dizer que os seus direitos foram violados: você na verdade não queria pagar nada, mas foi constrangido a aceitar o acordo. A “Suprema Corte” vai zerar o que você deve – e lhe entregar de volta quaisquer valores que tenha pagado.

Digamos, agora, que você seja Elon Musk e opere a maior plataforma de comunicação social do Brasil – onde cada um pode escrever o que quiser e a junta de governo STF-Lula estava debaixo de pancadaria grossa. A rede X se vê expulsa do Brasil, por “não cumprimento de ordens judiciais” e leva R$ 18 milhões de multas no lombo.

As “ordens judiciais” são despachos de Moraes, sem processo legal e sem direito de defesa para os acusados, mandando o X praticar censura. A lei proíbe isso – mas não no caso de Musk, segundo a ciência jurídica ora em vigor no País.

ERRO DE MORAES – Da mesma forma, está escrito na lei que uma empresa não pode ser obrigada a pagar dívidas de outra só porque têm ligações entre si. Não passa pela cabeça de ninguém, por exemplo, que o STF tire dinheiro do Itaú para pagar obrigações devidas pela Alpargatas, ou dinheiro da Ambev para pagar o rombo das Americanas.

Mas o X não é nem o Itaú e nem a Ambev e, portanto, a lei não vale para ele. Alexandre de Moraes, por conta disso, expropriou depósitos bancários da Starlink e transferiu para o governo, para pagar multas que ele mesmo aplicou no X. São do “mesmo grupo econômico”, decidiu ele. E daí?

Isso só poderia ser feito em caso de fraude – e fraude é coisa que tem de ser apurada em processo penal regular, com provas e a plena defesa do acusado por seus advogados. Mas a lei, aí, é um estorvo para o STF. Tudo bem que ela proteja o Itaú ou a Ambev. Tudo mal que ela proteja o X. Azar do X, então.

Esquerda agora é dona dos conceitos de liberdade, democracia e censura

Charge do Solda (Arquivo Google)

André Marsiglia
Poder360

Tenho insistido que a perseguição às redes sociais promovida pelo establishment de esquerda do Estado nos últimos anos sedimentou no país uma visão moralista a respeito de conceitos como: liberdade de expressão, democracia, verdade e ciência. Moralizados, tais conceitos se tornaram verdadeiros dogmas inúteis para o debate, e muito úteis para ap= política que os manipula em favor de projetos autoritários de poder.

Não à toa que, mesmo sem qualquer previsão legal, conceitos opostos ao de liberdade de expressão (como desinformação), ao de democracia (como conduta antidemocrática), ao de verdade (como fake news) e ao de ciência (como negacionismo) têm sido utilizados para condenar e banir discursos de opositores e até mesmo para prender críticos das autoridades do país.

ARES MORALIZANTES – Nada mais conveniente à manipulação do que tornar crime o oposto a um conceito que sequer é jurídico, dando-lhe ares moralizantes, como se, dessa forma, se estivesse promovendo uma higienização do debate público. A situação, que já não era boa, ficou agora ainda pior. Está sendo moralizado também o conceito de censura.

Desde que que o Supremo Tribunal Federal suspendeu as atividades do X no Brasil, a decisão passou a ser chamada por boa parte das pessoas, por mim, inclusive, de censura. No entanto, advogados, professores e jornalistas andam dizendo que não se pode nomear a suspensão do X dessa forma, pois censura mesmo é só a que aconteceu no período da ditadura militar.

Ou seja, para essas pessoas, censura é um conceito moral que só pode ser manejado quando destinado a fatos históricos que se encaixam na gaveta ideológica da esquerda. É como se dissessem: censura é o que ocorreu no passado, jamais no presente, censura é o que aconteceu à esquerda, jamais à direita.

ROUBARAM OS CONCEITOS – Dessa forma, o establishment de esquerda se torna dono dos conceitos de democracia, verdade, ciência, liberdade de expressão e censura. Por serem donos, tais pessoas fazem dos conceitos o que bem quiserem, inclusive inventando crimes para quem não segue sua cartilha, para quem age de forma oposta ao que pregam.

Ninguém mais sofre censura senão sob o carimbo destes porteiros do debate público, ninguém mais exerce sua liberdade, diz a verdade ou é democrático senão por eles.

Roubaram a reflexão, roubaram o debate, acabaram com o Direito.

O risco maior na América Latina é a tirania da maioria, não da minoria

Flávio Dino afirma que esforços contra incêndios buscam 'evitar o colapso  ambiental' - Diário do Acre

Dino errou ao liberar verba e foi aplaudido pelo erro

Marcus André Melo
Folha

O debate sobre o modelo institucional nos EUA tem sido feito em chave negativa, como discuti aqui na coluna. Para Levitsky e Ziblatt, o país está sob tirania da minoria. Um conjunto de instituições contramajoritárias não só supostamente travam a mudança institucional, mas também garantem a ascensão de populistas autoritários de direita – colégio eleitoral; Suprema Corte vitalícia com robusto controle de constitucionalidade; Senado e Câmara com forte malapportionment (distorção de representação); regras de obstrução no Senado; e Constituição com fortes limitações ao emendamento.

Curiosamente, o que está sob ataque são instituições contramajoritárias. Para o eleitor latino americano e brasileiro isto deveria causar perplexidade. Afinal, grave abuso de poder tem ocorrido na região em contextos de tirania da maioria, não da minoria.

SUPREMO USURPADOR – Aliás, para o eleitor brasileiro o sinal político das críticas muda: se os grotões elegem Trump, ou se a Suprema Corte é bastião do status quo, aqui temos uma imagem invertida. Nos EUA historicamente também, durante o período dos direitos civis —a Corte Warren (1953-1969), o Supremo era atacado como usurpador por setores que defendiam o status quo.

Sim, líderes populistas que contam com maiorias legislativas abusam do poder. Chavez é o arquétipo, o Senado mexicano acaba de aprovar uma emenda Constitucional do presidente populista de esquerda para a eleição de juízes por uma maioria de mais de 2/3, com perda do cargo dos atuais magistrados.

Mas na Colômbia, foi uma Suprema Corte independente que barrou a reeleição de Alvaro Uribe (2002-2010), que contava com amplo apoio legislativo e popular. A corte julgou inconstitucional seu plano de reeleição para um terceiro mandato. Ao assumir a cadeira presidencial Uribe havia proposto um referendum para destituir os membros do congresso, e criar um parlamento unicameral de tamanho reduzido. Atualmente está no banco dos réus sendo julgado por abuso de poder.

ALÉM DO LIMITE – O protagonismo do STF lembra o colombiano, mas entre nós há outro coprotagonista —o Congresso— que também foi ponto de veto nas pretensões hegemônicas do presidente. Mas isso não significa que o STF tenha só virtudes: ele tem cruzado a linha vermelha recorrentemente.

O debate em torno dos limites entre democracia e constitucionalismo —entre a regra da maioria e proteção de direitos— é legítimo (o debate sobre “a dificuldade contramajoritária” é clássico).

No entanto, a crítica ao protagonismo de “juízes não eleitos” —recorrente no discurso populista, independente de coloração política— é problemática porque mistura meias verdades e argumentos descabidos.

ERRO DE DINO – Não há escassez de exemplos bizarros que levam a críticas legítimas. O último deles é a decisão do ministro Flávio Dino, que numa canetada monocrática determinou ações de combate a incêndios a serem cumpridas pela Polícia Federal, especificando o uso de fundos para tal, e ao tempo em que autorizou gastos ao arrepio do arcabouço fiscal. Como se membro do poder Legislativo e Executivo fosse.

Assim, um erro anterior de nomeação de ocupante de cargo no Executivo para o Supremo se soma a outro: o ativismo deflagrado em resposta à inação e falta de liderança do próprio Executivo.

Vivemos num Estado-bandido, onde habituar-se ao crime não é anomalia

Envolvidas com o crime, as instituições se vulgarizam

Muniz Sodré
Folha

O fato de 61 candidatos em 44 cidades do país portarem tornozeleiras eletrônicas e terem mandados de prisão em aberto é sintoma de uma mutação nas relações sociais em que a criminalidade passa por novas inflexões de natureza moral. O crime, parece, começa a ganhar legitimidade. Não só entre nós: nos EUA, vários estados têm leis que descriminalizam furtos de baixo valor. Em Nova York, o comércio já tranca vitrines.

Lá, tenta-se evitar a superlotação das prisões por ladrões de bens considerados essenciais, aqui o fenômeno pertence à mafialização da vida social. Algo começa a ferir o princípio do Estado liberal, cujo modelo francês é o “État-gendarme”, Estado mínimo, restrito às funções de Exército, Justiça e polícia, portanto, de manutenção inflexível do status-quo burguês. A prática sempre velou para que a Justiça visasse com prioridade as classes subalternas.

OS MISERÁVEIS – A fúria contra quem rouba um simples pão é tipificada no clássico “Os Miseráveis”, de     Victor Hugo, sobre a perseguição implacável de Jean Valjean pelo inspetor Javert. Desdobra-se na consciência em um ânimo punitivo com visão geralmente toldada para os grandes criminosos, porém, muito aguçada para os menores, que afetam em cheio a vida privada.

Em princípio, não existe um “État-bandit”, mas autoridades sempre compactuaram com criminosos. Às vezes, em busca de equilíbrio na violência pública, outras, por motivos escusos. Disso é ilustrativa a história da máfia americana, que registra pactos secretos com figuras dos Poderes. Ou a da russa, que ajudou a montar a cleptocracia de Putin, o homem mais rico do mundo, um Don Corleone de quilate global.

EUA E BRASIL – A flexibilização da repressão antifurto nos EUA contempla o descompasso entre a macroeconomia e a vida concreta, preços altíssimos. Não é o caso do Brasil, onde em data recente um juiz do Supremo manteve a pena da mulher que havia furtado um tubo de pasta de dente. Admirador de Javert, talvez.

Mas aqui se trata mesmo da infiltração do crime em todas as instâncias dos Poderes: ministros suspeitos, bancadas parlamentares cancerígenas. E segurança interna ameaçada por máfias nacionais, como PCC e Comando Vermelho.

O Rio é vitrine do descontrole: massacres, tiroteios diários, drones de guerra. Expropria-se celular, carro, moto (39 por dia) e o bronze da memória da cidade. Roubam-se desde macacos do Jardim Botânico até britadeira de operário em construção na rua.

ANESTESIA COLETIVA – Mafialização é o fenômeno, que contamina moralmente a cidadania nacional. Não só infiltração no Estado, porém, em estado nascente, anestesia coletiva para absorção psicossocial e banalização do delito. De insensibilidade à violência, até a tomada de cargos públicos por malfeitores. Governabilidade virou álibi para pacto com o crime. A própria linguagem dos políticos lembra o jargão do submundo.

Toda sociabilidade tem caracterizações psíquicas inerentes às regulações morais das instituições. Habituar-se ao crime é anomalia, senão mutação nas formas de associação estabelecidas. Na ausência de uma política antitética à mafialização pode estar sendo gestado um Estado-bandido.

Daí o sábio temor de Oscar Niemeyer: “Hoje eu vejo, tristemente, que Brasília nunca deveria ter sido projetada em forma de avião, mas sim de camburão”.

Um belo chão de estrelas no caminho do poeta Orestes Barbosa

Paulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, escritor, compositor e poeta carioca Orestes Dias Barbosa (1893-1966) fez do samba-canção “Chão de Estrelas”, um dos maiores clássicos da MPB, gravado por Silvio Caldas, em 1937, pela Continental, cuja letra explora o sofrimento amoroso, que, aliás, é principal característica do gênero musical samba-canção.

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Orestes Barbosa | Enciclopédia Itaú Cultural

Orestes, no desenho de Nássara

CHÃO DE ESTRELAS
Silvio Caldas e Orestes Barbosa

Minha vida era um palco iluminado
Eu vivia vestido de dourado
Palhaço das perdidas ilusões…
Cheio dos guizos falsos da alegria
Andei cantando a minha fantasia
Entre as palmas febris dos corações.

Meu barracão no morro do Salgueiro
Tinha o cantar alegre de um viveiro
Foste a sonoridade que acabou…
E hoje, quando do sol a claridade
Forra o meu barracão, sinto saudade
Da mulher pomba-rola que voou.

Nossas roupas comuns dependuradas
Na corda, qual bandeiras agitadas
Pareciam estranho festival:
Festa dos nossos trapos coloridos
A mostrar que nos morros mal vestidos
É sempre feriado nacional!

A porta do barraco era sem trinco
Mas a lua, furando o nosso zinco,
Salpicava de estrelas nosso chão…
Tu pisavas os astros, distraída,
Sem saber que a ventura desta vida
É a cabrocha, o luar e o violão.

Incêndios florestais expõem Brasil a retaliação global nas exportações

ChargeDeu em O Globo

Além da devastação ambiental, os incêndios florestais que castigam o Brasil criarão graves problemas econômicos, em particular no comércio internacional. A ameaça mais urgente vem da entrada em vigor na União Europeia, em 1º de janeiro de 2025, da regra que proíbe importações de produtos de áreas desmatadas ilegalmente.

Se as queimadas forem vinculadas ao desmatamento ilegal — e, dada a proliferação de incêndios criminosos, não será difícil fazer a conexão —, o país poderá perder US$ 15 bilhões em receitas, o equivalente a mais de um terço das exportações para o bloco europeu. Entre as mercadorias mais atingidas estão café, carne, cacau, soja e os próprios produtos florestais, como madeira ou móveis.

SOB MEDIDA – A norma da UE pode ser considerada um mecanismo protecionista, criado sob medida para agradar a pequenos e médios agricultores do continente que não conseguem competir com as exportações brasileiras. Mas ela também coincide com o interesse do Brasil. O país precisa reprimir o desmatamento ilegal. Se isso evitar dificuldades nas exportações de produtos primários, tanto melhor.

O secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Roberto Perosa, afirma que o governo concorda com a nova diretriz da UE, mas reivindica mais tempo para os países exportadores se estruturarem para cumpri-la. Nessa negociação, além dos contatos bilaterais, o Brasil tem chamado para as conversas outros exportadores de produtos agrícolas, como Colômbia, Equador, Malásia, Indonésia e Congo.

O principal argumento para expandir a discussão é alegar que os incêndios não ocorrem apenas no Brasil, pois os eventos climáticos extremos que resultam do aquecimento global atingem todo o mundo.

OUTROS PARCEIROS – Na Europa, Portugal está em chamas. As temporadas de incêndios que costumam ocorrer no meio do ano em vários países do Hemisfério Norte, como Estados Unidos e Canadá, têm sido especialmente preocupantes. Mas seria ingênuo acreditar que essa realidade ajudará a diminuir as pressões contra o desmatamento.

De acordo com Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e consultor internacional, outros parceiros comerciais do Brasil deverão adotar a mesma atitude do bloco europeu. Ele cita Estados Unidos e Reino Unido.

A posição brasileira é vulnerável porque a maioria esmagadora das queimadas tem origem criminosa. Os incêndios têm exposto a leniência dos governos federal e estaduais, que, em meio a uma seca atroz, não fiscalizam nem forçam a mudança de costumes, principalmente de pequenos produtores ainda habituados a limpar o terreno com fogo para o plantio.

CERTIFICAÇÕES – O enfrentamento dessa situação está há muito tempo na agenda do Brasil. Para atender à norma da UE e se precaver contra novas retaliações comerciais devido ao descaso com o meio ambiente, o país precisa ter um sistema eficiente para rastrear produtos importantes da pauta de exportações, certificá-los de modo confiável e garantir sua origem.

Não é mais aceitável que florestas sejam derrubadas por grileiros sem que haja vigilância ou punição, a madeira seja exportada e o terreno transformado em pasto.

Para colocar ordem no acesso à terra já existem leis como o Código Florestal. Basta aplicá-las. Trata-se de assunto estratégico.

Lula vai à ONU falar das promessas que fez em 2023, mas não cumpriu

Por falar muito, Lula tem microfone cortado na ONU

Lula prometeu renovar o desenvolvimento sustentável

Diogo Schelp
Estadão

Lula abre a 79ª Assembleia Geral da ONU nessa terça-feira (23) com um discurso que abordará, entre outros temas, o desafio das mudanças climáticas. O presidente chegou mais cedo a Nova York para participar da Cúpula do Futuro, também na ONU, onde apresentou uma prévia das lições que pretende dar aos líderes mundiais.

Em sua curta fala, reclamou que o mundo não está reduzindo as emissões de gases do efeito estufa em níveis suficientes e citou uma falta de “financiamento climático”, leia-se pagamento de países ricos, que poluem mais, para que nações em desenvolvimento invistam em ações de mitigação e adaptação aos efeitos do aquecimento global. Disse também que, nesse e em outros temas, a comunidade internacional caminha para o “fracasso coletivo”.

LÍDER MUNDIAL – Lula voltou ao poder crente de que seria capaz de exercer um papel de liderança no cenário externo, algo mais difícil de alcançar hoje do que há catorze anos, quando se encerrava o seu segundo mandato. O Brasil não tem a mesma relevância econômica relativa de antes, a China ganhou uma força geopolítica que desmente a visão multipolar difundida pelos Amorins da vida e a América Latina está mais fragmentada politicamente. Para compensar, a diplomacia lulista pôs-se a caçar novas causas universais em que pudesse liderar. Assim, engajou-se nas ideias de taxar os ricaços globalmente e de regular a Inteligência Artificial.

A defesa do meio ambiente sempre foi o terreno natural para o protagonismo do Brasil, que abriga a maior floresta tropical do mundo e outros biomas importantes. O país possui um dos códigos de preservação mais avançados e um potencial de geração de energia verde inigualável.

Mas a aparente convicção de que só a mudança de retórica em relação ao antecessor, Jair Bolsonaro, seria suficiente para manter as árvores de pé transformou-se em empáfia e resultou numa política ambiental de resultados pífios.

PROMESSA FURADA – No ano passado, no seu primeiro discurso na ONU depois de retornar à Presidência, Lula apontou o dedo para os países ricos pelo carbono que jogam na atmosfera e garantiu que ia provar como se faz um “modelo socialmente justo e ambientalmente sustentável”.

O modelo de Lula está aí, no ar que respiramos enquanto ele dá lições ambientais. Nos sete primeiros meses deste ano, os focos de incêndio dobraram em relação ao mesmo período de 2023. Não faltaram alertas.

Lula falou muito, mas não mostrou como se faz.

Quase trilionário, Musk não liga para o X no Brasil, é de direita e trumpista

ELON MUSK E O X DA QUESTÃO

Musk vai se tornar o primeiro trilionário da História

José Padilha
Do UOL

As reviravoltas e desgastes da rede social X no Brasil, incluindo os bloqueios de bens, não parecem estressar o bilionário Elon Musk — que deve se tornar o primeiro trilionário da “história da humanidade”, afirmou José Padilha, comentarista do UOL News, com base em um relatório da consultoria Connect Academy.

“Só não sei se o dinheiro está doendo nele, porque saiu aqui no UOL que ele será o primeiro trilionário da história da humanidade. Não sei se ele está preocupado com quanto dinheiro ele faz ou perde no Brasil”, disse José Padilha.

X BLOQUEADO – Enquanto isso, a rede continua bloqueada no país pela falta de um representante legal. A advogada que teria essa função desistiu do cargo antes mesmo de ser oficialmente anunciada, aponta reportagem da Reuters.

O X, para Padilha, não deveria ser visto mais como uma rede social, mas sim como uma “plataforma política” de Elon Musk, baseado nos apoios políticos do empresário e em sua resistência em começar a cumprir ordens do Supremo Tribunal Federal.

“O X virou uma plataforma política do Musk. O STF, além de estar balizado pela lei, não tem que ter medo do Musk, porque não temos que olhar para o X como uma rede social: o X é uma plataforma política de um sujeito. Ele é de direita, ele é de Bolsonaro, ele disse que iria trabalhar no governo do Trump, é um cara querendo desarticular politicamente o país.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Caramba! Quanto ódio a Musk, pelo simples fato de ser de direita… Por que execrá-lo assim, de forma tão fútil? Sou de esquerda, tenho admiração declarada por Engels, que considero um dos maiores benfeitores da Humanidade. Apesar de ser um dos primeiros industriais multinacionais do mundo, Engels dedicou sua vida à defesa do proletariado, ao lado de Marx, e assim obrigaram o capitalismo a evoluir para a social-democracia do bem estar. Tenho parentes e amigos de direita, a quem amo e respeito, lhes dou o direito de serem assim, e eles me respeitam também. Como dizia Nelson Rodrigues, que era inteiramente de direita, toda unanimidade é burra. Vamos deixar a direita existir. (C.N.)

Com estratégias próprias, candidatos de Bolsonaro crescem em 17 capitais

Eleições 2020: prepare-se para votar! | by Rodolfo Nascimento | Revista  Brado | Medium

Charge do Cazo (Arquivo Google)

Luis Felipe Azevedo e Lauriberto Pompeu
O Globo

A nova rodada da pesquisa Quaest mostra que, a pouco mais de duas semanas da eleição, os candidatos apoiados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que têm adotado estratégias distintas em relação à exposição do padrinho nas campanhas, tiveram variações mais positivas do que os nomes apoiados pelo presidente Lula da Silva (PT) nas capitais. É o que aponta um levantamento do GLOBO com base nas intenções de voto medidas em 24 cidades nos últimos dias e que considera os dois últimos levantamentos feitos pelo instituto.

Em 17 capitais, aliados de Bolsonaro registraram melhora nas intenções de voto. Nesse grupo, seis tiveram crescimento, considerando a margem de erro. Já entre os apoiados pelo petista, houve oscilação positiva em sete capitais e crescimento apenas em Fortaleza, onde Evandro Leitão (PT) passou de 14% para 21%.

ESTRATÉGIAS DIVERSAS – Os resultados passam tanto pela tática de se colar em Bolsonaro quanto em se distanciar. Os candidatos do PL que lideram as pesquisas eleitorais em capitais do Nordeste, por exemplo, vêm se desvencilhando do ex-presidente, em uma estratégia para escapar do impacto de sua rejeição em uma região majoritariamente lulista. Emília Correia, em Aracaju; João Henrique Caldas, o JHC, em Maceió; e André Fernandes, em Fortaleza, evitam nacionalizar a disputa e associar a imagem ao ex-presidente, em um plano oposto, por exemplo, ao de Alexandre Ramagem, que ganhou fôlego no Rio após intensificar a presença do aliado na TV.

À frente dos rivais em Aracaju, Emília Correia passou de 26% para 36%. Ainda na pré-campanha, Bolsonaro esteve na capital sergipana, mas a candidata do PL ignorou a visita nas redes sociais. Como justificativa, ela disse que “nunca foi ativista de nada”.

Em menor grau, a distância também acontece em Fortaleza, onde André Fernandes chegou a participar de um evento com Bolsonaro em agosto, mas não tem usado a figura do ex-presidente na propaganda eleitoral e também evita se associar a ele nos debates com outros candidatos. Na cidade, Fernandes subiu sete pontos e empata com Capitão Wagner (União) e Evandro Leitão na liderança.

SEM MENCIONAR – Desde que começou a campanha, os candidatos do PL em Fortaleza e Aracaju citaram Bolsonaro em publicações no feed do Instagram apenas uma vez, ainda em agosto, quando o ex-presidente visitou Fortaleza e no dia em que Emília se reuniu com ele em Brasília, respectivamente. Já o prefeito de Maceió não se referiu ao ex-presidente nenhuma vez. Ele manteve os mesmos 74% de intenções de voto contabilizados em agosto na pesquisada Quaest divulgada ontem.

Ao GLOBO, Emília diz que votou em Bolsonaro em 2018 e 2022 e que é “uma política cristã de berço, com os ideais da direita” com uma “excelente relação” com o ex-presidente. Apesar disso, ela fez uma ressalva de que a disputa tem características locais e, por isso, evita nacionalizá-la:

— Estamos disputando uma eleição municipal cujas pautas são mais ligadas aos problemas enfrentados por milhares de moradores de Aracaju, que sofrem com um transporte precário, saúde totalmente deficitária, desemprego e falta de infraestrutura.

OUTRAS CAPITAIS – No Rio, Ramagem adotou a estratégia oposta e conseguiu reduzir a vantagem de Eduardo Paes (PSD), variando positivamente de 13% para 18% das intenções de voto, ao avançar entre os eleitores que votaram em Bolsonaro. Nesse grupo, ele agora aparece com 41%, contra 39% de Paes.

Em outras capitais, houve movimentação semelhante. Em Curitiba, o vice-prefeito Eduardo Pimentel (PSD) foi de 27% para 45% das intenções de voto no eleitorado do ex-presidente em 2022. Entre os candidatos apoiados por Bolsonaro, ele registrou a maior alta nas pesquisas. No quadro geral da população, o também aliado do governador Ratinho Jr. (PSD) se descolou dos demais concorrentes, avançando de 19% para 36%.

— As pesquisas mostram que o eleitorado bolsonarista está começando a se posicionar ou estava em dúvida entre candidatos, e agora definiu qual será o seu. A tendência é que esse eleitor fixe o voto com a liderança — avalia Josué Medeiros, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

EM SÃO PAULO – Mesmo em São Paulo, onde Ricardo Nunes (MDB) manteve os 24% no quadro geral da corrida, o prefeito conseguiu reduzir a vantagem de Pablo Marçal (PRTB) nesse segmento, ao oscilar positivamente três pontos, para 35% de preferência desse grupo, contra 42% do ex-coach.

Também houve crescimento de nomes apoiados por Bolsonaro em Campo Grande, Natal e Salvador. Já as variações positivas dentro da margem de erro ocorreram, ao todo, em 11 cidades. Na capital mineira, Bruno Engler (PL) conseguiu se descolar dos rivais e aparece empatado com o prefeito Fuad Noman (PSD) na segunda posição, atrás de Mauro Tramonte (Republicanos).

— Os resultados da Quaest, em geral, mostram a força da direita. Dentro dela, onde o próprio candidato não é o garantidor das realizações no município, Bolsonaro tem servido como padrinho e trazido apoio — afirma Luciana Veiga, professora de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio).

E A ESQUERDA? – No lado petista, a nova rodada da Quaest mostrou crescimento de nome apoiado por Lula apenas em Fortaleza. Evandro Leitão, que antes ficava numericamente atrás do prefeito José Sarto (PDT) e de Capitão Wagner entre os eleitores do petista em 2022, deu salto nesse grupo, de 22% para 40% das intenções de voto.

Houve variação positiva de aliados de Lula, dentro da margem de erro, em oito cidades, entre elas São Paulo, e ela foi negativa em nove. Na capital paulista, Guilherme Boulos oscilou de 21% para 23%, mas tem demonstrado dificuldade em avançar no eleitorado de Lula na cidade. Nesse grupo, também houve variação tímida, de três pontos percentuais, para 46%. No Recife, o prefeito João Campos (PSB) lidera com folga a corrida, com 77% das intenções de voto, e não tem buscado se associar ao presidente.

Os aliados do presidente mantiveram a intenção de voto em Belo Horizonte, Florianópolis, Goiânia e Aracaju. Na cidade mineira, o deputado Rogério Correia (PT) tem apenas 5% das intenções de voto, e aparece atrás da pedetista Duda Salabert, que marca 10%. Na cidade, Tramonte, Duda e Fuad ainda aparecem à frente do petista na preferência do eleitor do presidente.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Eleição municipal é muito diferente, as capitais têm tamanho diversos, há influências de todo tipo, não é possível fazer conceituações genéricas. (C.N.)

Lula culpa fracasso coletivo da ONU, estoura tempo e o microfone é cortado

Lula tem discurso cortado na ONU

Lula aponta as falhas da ONU, num rol interminável

Jamil Chade
Do UOL

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou neste domingo na ONU, em Nova York, que o Pacto da ONU aprovado neste domingo não é suficiente ainda para lidar com as crises estruturais, criticou o Conselho de Segurança e a falta de ambição da comunidade internacional em reformar as instituições. O conteúdo de sua fala foi antecipado pelo UOL. Em seu discurso, ele ainda alertou que, no atual ritmo, o mundo caminho para um “fracasso coletivo” e que não atingirá metas de redução de fome e pobreza.

SEM MICROFONE – Mas o brasileiro, que tinha apenas cinco minutos para falar, teve seu microfone cortado na ONU, por passar do tempo. Os dois líderes que o antecederam também sofreram com a limitação do tempo e tiveram de interromper a fala, por determinação do presidente da Assembleia Geral da ONU. Lula, porém, continuou a discursar, sem o microfone, até concluir sua mensagem.

O brasileiro participou da Cúpula do Futuro, iniciativa da ONU para tentar resgatar os organismos multilaterais. O objetivo era de que o acordo fosse aprovado por consenso. Mas, de forma inesperada, a delegação russa decidiu apresentar novas exigências e ameaçou bloquear a adoção do Pacto do Futuro

Para Lula, ainda que o acordo sirva de um guia para o futuro, faltou “ambição e ousadia”. “O Pacto para o Futuro nos aponta a direção a seguir”, disse. “O documento trata de forma inédita temas importantes como a dívida de países em desenvolvimento e a tributação internacional”, afirmou, citando avanços como a criação de uma instância de diálogo entre presidentes e líderes de instituições financeiras internacionais que promete recolocar a ONU no centro do debate econômico mundial.

AMBIÇÃO E OUSADIA – Lula também destacou o avanço de uma governança digital inclusiva, “que reduza as assimetrias de uma economia baseada em dados e mitigue o impacto de novas tecnologias como a Inteligência Artificial”. “Todos esses avanços serão louváveis e significativos”, disse.

Mas ele deixou claro que isso não é suficiente. “Nos faltam ambição e ousadia”, disse. “A crise da governança global requer transformações estruturais”, insistiu.

Para ele, a pandemia, os conflitos na Europa e no Oriente Médio, a corrida armamentista e a mudança do clima escancaram as limitações das instâncias multilaterais. “A maioria dos órgãos carece de autoridade e meios de implementação para fazer cumprir suas decisões”, afirmou . “A Assembleia Geral perdeu sua vitalidade e o Conselho Econômico e Social foi esvaziado”, alertou.

CONSELHO DE SEGURANÇA – Lula ainda destacou como a “legitimidade do Conselho de Segurança encolhe a cada vez que ele aplica duplos padrões ou se omite diante de atrocidades”.

O presidente também criticou o fato de as instituições de Bretton Woods desconsiderarem as prioridades e as necessidades do mundo em desenvolvimento. “O Sul Global não está representado de forma condizente com seu atual peso político, econômico e demográfico”, afirmou.

Foi nesta parte que o microfone deixou de funcionar. “A Carta da ONU não faz referência à promoção do desenvolvimento sustentável”, disse o presidente, já sem a transmissão ou tradução. “Precisamos de coragem e vontade política para mudar, criando hoje o amanhã que queremos. O melhor legado que podemos deixar às gerações futuras é uma governança capaz de responder de forma efetiva aos desafios que persistem e aos que surgirão”, completou. Para ele, a comunidade internacional tem a responsabilidade de não deixar que avanços possam ser minados. “Não podemos recuar na promoção da igualdade de gêneros, nem na luta contra o racismo e todas as formas de discriminação”, defendeu Lula.

NOTA DA REDAÇÃO DO BLOGCom ou sem microfone, a conversa fiada é a mesma. Sua única referência ao clima foi uma cobrança, principalmente aos países ricos. “Os níveis atuais de redução de emissões de gases do efeito estufa e financiamento climático são insuficientes para manter o planeta seguro”, disse, como se as queimadas não tivessem efeito algum. (C.N.)

Para o Supremo, o respeito aos direitos do trabalhador não seria “obrigatório”

Os direitos trabalhistas sob o fogo cruzado da crise política - Jorge Luiz  Souto Maior

Charge do Amorim (Arquivo Google)

Oscar Vilhena Vieira
Folha

Pablo Marçal tem feito da carteira de trabalho uma arma de sua campanha para Prefeitura de São Paulo. Quando perguntado sobre o fato de algumas de suas empresas não terem nenhum empregado com carteira assinada, respondeu sem cerimônia: “a maior parte é terceirizada, pois a gente mexe com muita tecnologia”. Como se a economia digital não estivesse subordinada às regras da Constituição.

A resposta fala não apenas dos princípios do controvertido candidato, ou da falta deles, mas reflete também uma percepção, cada vez mais generalizada, de que o regime dos direitos fundamentais do trabalhador, tal como estabelecido pelo artigo 7º da Constituição Federal, tornou-se facultativo. Respeita quem quiser.

SUPREMO ERRA – Entre os principais responsáveis pela difusão dessa ideia de que o respeito à Constituição é voluntário, encontram-se, paradoxalmente, diversos ministros do Supremo Tribunal Federal. O fato é que nos últimos anos temos testemunhado um crescente desacordo entre ministros do Supremo Tribunal Federal e magistrados trabalhistas, em torno de novas formas de contratação de mão de obra.

No centro da controvérsia estão questões como terceirização, contratação de trabalhadores por meio de pessoas jurídicas e, mais recentemente, do trabalho no âmbito da economia digital, além da própria competência da Justiça do Trabalho.

Embora o Supremo Tribunal Federal venha reconhecendo diversas formas de contratação de trabalho, deixou claro na ADPF 324 e no tema de repercussão geral 725 que esses contratos não podem ser utilizados para encobrir fraudulentamente autênticas relações de emprego, em que haja subordinação, pessoalidade, constância e onerosidade.

FRAUDES CONTRATUAIS – Na prática, entretanto, inúmeros ministros têm proferido decisões monocráticas, em sede de reclamações constitucionais, afastando da Justiça do Trabalho a tarefa de verificar, a partir dos fatos narrados no processo, a ocorrência de fraudes contratuais.

O próprio ministro Alexandre de Moraes, empenhadíssimo em impedir que as redes sociais e plataformas se transformem em uma terra sem lei, parece confortável que as relações de trabalho no âmbito da economia digital ocorram à margem da Constituição e fora do alcance da Justiça do Trabalho (Reclamação constitucional 59795/MG).

As mudanças tecnológicas e econômicas devem evidentemente vir acompanhadas de reformas que atualizem a legislação trabalhista. Não podemos ignorar que numa economia globalizada e altamente competitiva os modelos institucionais que regulam o mercado de trabalho são relevantes para o desempenho da economia e, consequentemente, para a prosperidade dos trabalhadores.

PAPEL DO CONGRESSO – Não cabe ao Supremo Tribunal Federal, no entanto, promover essas reformas, ainda mais quando suas decisões se encontram em conflito com cláusulas pétreas da própria Constituição.

Ao transformar os direitos fundamentais do trabalhador em um regime facultativo e ao afastar a Justiça do Trabalho de sua missão constitucional, o Supremo estará não apenas premiando o oportunismo dos que desrespeitam a lei, como também colocando em risco uma série de conquistas civilizatórias do trabalhador, indispensáveis à manutenção da coesão social e da própria estabilidade democrática.

Quer ser criminoso? Prefira um crime ambiental, porque jamais será punido

Você sabe o que são crimes ambientais? | Jusbrasil

Crimes ambientais são tranquilos, ninguém se importa

Conrado Hübner Mendes
Folha

A agenda nacional de desastres ambientais tem alternado chuva e seca, calor e incêndio. Os autores do script da distopia programaram eventos climáticos cuja dimensão territorial, frequência e intensidade vão aumentar. Se nada inovador for feito dentro do que dá para fazer, vão aumentar ainda mais.

Mal sabemos calcular os danos comensuráveis dos desastres. Nem temos tido coragem de reconhecer, olho no olho, os danos incomensuráveis a nossos projetos de vida. A não ser que seu projeto de futuro seja o crime ambiental. Pode não ser uma vida digna, mas é rentável. O Estado brasileiro lhe oferece boas oportunidades de negócio.

PÂNICO E CIRCO – Conhecemos o roteiro da desinteligência penal brasileira: criminalizar novas condutas; aumentar pena de condutas criminalizadas; apertar regime de execução da pena; encarcerar pretos pobres; multiplicar população prisional com réus sem condenação; transformar presídios em propulsores do crime organizado. Premiamos o político que pratica o populismo do pânico e circo. Justamente ele, que se esmera na manutenção do crime para continuar a ser eleito na plataforma de guerra ao crime.

Mas a desinteligência penal brasileira também se destaca no sentido inverso: não criminaliza, ou criminaliza com pena irrisória, ou deixa de fiscalizar e processar crimes que produzem graves consequências para a vida coletiva e o desenvolvimento. Ou ainda pune e depois anistia. Alguns são crimes de causalidades complexas, multiautorais, pouco cênicos, estruturados em cadeias de comando com gente poderosa. Outros são crimes visíveis numa fotografia.

A leniência com o crime ambiental se inscreve nessa tradição. Pesquise pela frase “crime ambiental compensa”. A inércia legislativa e judicial diante de empresas mineradoras depois do “maior crime ambiental da história do Brasil” na cidade de Mariana, ou diante de incendiários, desmatadores, traficantes e poluidores, mesmo quando a fiscalização ambiental consegue fazer autuações, dá incentivos insuperáveis à devastação que enriquece indivíduos e empobrece o país.

EXISTEM PROJETOS – Para entender o tamanho do problema e vislumbrar soluções possíveis, vale ler “O Ecossistema do Crime Ambiental na Amazônia” (Instituto Igarapé), e “Crimes Ambientais na Amazônia” (Plataforma Cipó), para citar publicações mais recentes.

Há mais de dez anos tramitam no Congresso Nacional projetos de lei que buscam tornar o sistema sancionatório ambiental um instrumento que de fato auxilie na proteção e desencoraje a destruição do meio ambiente. A articulação liderada pelo agronegócio foi bem-sucedida em bloquear avanços nesse período.

Com margens de avenidas e estradas ao redor de Brasília em chamas, com fumaça e fuligem espalhadas pelo território do país, novos projetos de lei começam a surgir. Tentam aumentar sanções penais e administrativas, limitar incentivos fiscais e concessões de financiamentos públicos e privados, proibir participar de licitações e contratar com o poder público, suspender o Cadastro Ambiental Rural. Outro tenta tipificar o ecocídio. O nexo de causalidade entre a inércia do Congresso Nacional e o colapso climático está evidente.

Governo se recusa a dar informações sobre hospedagem de Janja em NY

A primeira-dama Janja Lula da Silva (ao centro) durante evento na Columbia University, em Nova York. Participaram também Thomas J. Treta, diretor do centro global da instituição no Brasil (à esquerda) e Angela Olinto, pró-reitora da universidade

Janja denuncia que as queimadas são “atos de terrorismo”

Renato Machado e Marianna Holanda
Folha

O governo Lula (PT) se recusa a responder um pedido via Lei de Acesso à Informação com dados completos sobre uma viagem da primeira-dama, Rosângela Silva, a Janja, para Nova York, em março deste ano. Houve negativa em três instâncias sobre o local de hospedagem, valores gastos e a fonte dos recursos.

Janja foi em março para um evento da ONU (Organização das Nações Unidas) em Nova York, cidade onde está novamente. A primeira-dama vai acompanhar Lula durante a agenda da Assembleia-Geral da ONU, mas chegou com dias de antecedência para alguns compromissos.

“COMPLEXIDADE” – A Folha pede as informações sobre a viagem de Janja por meio da LAI (Lei de Acesso à Informação) desde 24 de abril. O último recurso está em análise pela CGU (Controladoria-Geral da União), que iria julgá-lo até o fim de setembro mas prorrogou o prazo até o 1º de outubro ao alegar “complexidade da matéria”.

Janja esteve em Nova York em março para integrar a comitiva brasileira do Ministério das Mulheres durante a 68ª sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher, da ONU. Ela foi designada por Lula para participar do evento na condição de socióloga, segundo publicado no Diário Oficial da União.

Os questionamentos da reportagem passaram por vários ministérios, além da assessoria da própria primeira-dama. Mas ainda há lacunas sobre a viagem. A assessoria de Janja apresentou informações desencontradas. Inicialmente, respondeu que ela havia se hospedado na casa de terceiros. Depois, alterou a mensagem e passou a afirmar que ficara na residência oficial brasileira em Nova York.

RESPOSTA INICIAL – Ao responder a um primeiro pedido de LAI, o Ministério das Mulheres informou que Janja recebeu da pasta apenas passagens aéreas e o seguro viagem sem pagamento de diárias para hospedagem e alimentação. O painel de viagens do governo mostra que os trajetos de ida e volta da primeira-dama entre Brasília e Nova York saíram por R$ 43,4 mil.

A Folha ingressou com um novo pedido via LAI, dessa vez para o Palácio do Planalto. Esse pedido questionava onde Janja se hospedou, a fonte de recursos para hospedagem e alimentação, valor total gasto e número de servidores que a acompanharam.

O gabinete pessoal do presidente da República respondeu inicialmente que o assunto caberia ao Ministério das Mulheres, em uma resposta classificada como conclusiva —procedimento diferente do usual, uma vez que há previsão de transferência interna de pedidos entre pastas, com nova contagem de prazo.

NEGATIVAS – A secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, negou depois um recurso em que se argumentava que o Ministério das Mulheres já havia se manifestado (embora não tenha atendido ao pedido integralmente). A resposta nessa instância justificou a negativa reforçando que Janja não havia recebido diárias, seja do Ministério das Mulheres, seja da Presidência da República.

Diárias, no entanto, são apenas um dos mecanismos usados para gastos em viagens. As despesas do presidente, seus familiares diretos e os agentes que fazem sua segurança costumam ser feitos por outros meios.

A secretária-executiva ainda lançou mão de outra justificativa para negar o recurso. Citou que a legislação prevê que “informações cuja divulgação possam pôr em risco a segurança de altas autoridades e seus familiares são reservadas e têm sua divulgação restrita”.

MAIS RECUSAS – Já o terceiro recurso foi negado pelo ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Marcos Antonio Amaro. Este apenas ratificou a resposta da instância anterior.

Questionado por que o Planalto se recusou a fornecer os dados, em três instâncias, sendo que as mesmas informações referentes às viagens do próprio presidente Lula são tornadas públicas, a Secom disse em nota que os questionamentos por LAI “são respondido dentro dos próprios processos”. A Secom também não respondeu aos pedidos sobre hospedagem e custos de viagem.

A assessoria de Janja reforçou que “não houve custos com hospedagem” porque “a primeira-dama e seus assessores ficaram todos na residência oficial”. Questionada em qual residência oficial ela teria ficado, a assessoria não disse – o Brasil tem dois chefes de postos diplomáticos na cidade, o cônsul-geral e o chefe da missão junto à ONU.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
Janja é uma primeira-dama expansiva e que dá muita mão-de-obra. Na Universidade Columbia, inventou que as queimadas são atos de terrorismo. As primeiras-damas anteriores, Marisa da Silva e Rosemary Noronha, eram mais discretas nas idas ao exterior. Rosemary aceitava até viajar como clandestina no AeroLula, dando grandes exemplos de desprendimento e espírito público. (C.N.)

Brasil e China atendem a Putin e voltam a articular acordo de paz

Os chanceleres do Brasil, Mauro Vieira (esq.), e da Rússia, Sergei Lavrov, no Itamaraty em abril de 2023

Chanceleres de Brasil e Rússia procuram entendimento

Eliane Cantanhêde
Estadão

Depois do excesso de ambição e sucessivos fracassos na tentativa de recuperar o protagonismo do Brasil e o prestígio internacional de Lula, o governo agora trabalha com a China, em silêncio e comedidamente, na busca de algum acordo de cessar-fogo entre Rússia e Ucrânia. O momento é propício, já que os dois lados dão sinais de exaustão diante de uma guerra que se prolonga sem perspectiva de vitória para um ou para o outro.

O primeiro sinal de abertura da Rússia ao diálogo foi dado por Vladimir Putin, quando citou Brasil, China e Índia, publicamente, como potenciais mediadores. A partir daí, a diplomacia voltou a agir. Na semana passada, o chanceler russo Sergei Lavrov conversou com o brasileiro Mauro Vieira em Riad, na Arábia Saudita, e depois com o assessor internacional Celso Amorim, em Moscou. E Amorim já engatou contatos com seu correspondente chinês, que integra o Politburo do seu país.

REAÇÃO DE PUTIN – Essa sinalização, ou convocação, de Putin ocorreu após a reação considerada “branda” de Moscou aos ataques ucranianos ao território russo, também entendida como sinal de flexão de Putin e de esgotamento da própria guerra. O grande temor, no primeiro momento, era que Putin contra-atacasse de forma avassaladora, o que não ocorreu. Juntando as pontas, Brasil e China puseram-se a postos, mas a Índia, nem tanto, ao menos até onde a vista alcança e os ouvidos captam.

O pano de fundo para as conversas tem sido a ampliação dos Brics (Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul) com quatro novos parceiros já integrados (Emirados Árabes, Etiópia, Egito e Irã) e outros tantos ainda em negociação. Essa também foi a pauta oficial do telefonema de Putin para Lula na quarta-feira, mas mal disfarça os avanços nas conversas sobre a guerra Rússia-Ucrânia, que têm até cronograma e um rascunho com quatro condições para os dois países.

O próximo passo será na semana que vem, com mais uma rodada de conversas entre Brasil e China, em paralelo à abertura da Assembleia-Geral da ONU, em Nova York.

ENTENDIMENTO – E a proposta rabiscada prevê redução das hostilidades, preservação de alvos e cidadãos civis e troca de prisioneiros, compromisso de não uso de armas atômicas em nenhuma circunstância e, por fim, uma conferência internacional de paz que inclua tanto a Ucrânia quanto a Rússia. Essa conferência poderá ser lançada já na semana que vem, em Nova York, envolvendo um conjunto de países e um pré-acerto: todas as propostas de cessar-fogo deverão ser consideradas.

Ainda embrionária, essa construção exige paciência e tempo, mas uma coisa é certa: é uma faca de dois gumes para Lula. O envolvimento direto joga holofotes e confere status a ele e ao Brasil, reduzindo as legítimas críticas de muita ambição, pouco resultado; muito falatório, pouca ação.

Além do alto risco de virar mais um tiro n’agua, a articulação tende a aumentar as suspeitas sobre os rumos dos Brics, da política externa brasileira e de suas alianças com China e Rússia, que de democracias não têm nada.

Com o modelo institucional colocado em xeque, Trump é sintoma de quê?

Trump: o que pode acontecer com o presidente até 20 de janeiro? – Mundo –  CartaCapital

Trump mostrou que a direita tem muita força nos EUA

Marcus André Melo
Folha

O debate sobre o modelo institucional americano sofreu inflexão notável nas duas últimas décadas: as instituições políticas passaram a ser pensadas em chave negativa. Durante muito tempo o desenho institucional americano emulava, para muitos, o britânico como modelo ideal. A crítica limitava-se a apontar sua incompletude: o desenho era exemplar, mas fora insuficientemente implementado no Sul do país.

“Tyranny of the Minority” (2023), de autoria de Levitsky e Ziblatt, é o último exemplo dessa crítica revisionista. Há poucos argumentos que já não estejam discutidos por Robert Dahl no clássico instantâneo “How democratic is the american constitution?”, ou Levinson e Balkin, em “Democracy and dysfunction”.

QUESTIONAMENTO – Aqui as novidades são duas. A primeira é um questionamento: se uma minoria (20 a 25% do eleitorado) nas democracias avançadas tem preferências políticas associadas à direita radical, por que apenas nos Estados Unidos ela já chegou ao poder? A resposta: as instituições. A combinação de regra eleitoral distrital, baixo comparecimento às urnas (pouco mais de 50%) e partidarismo forte (mais de 90% dos eleitores registrados dos partidos votam no escolhido em suas primárias) permite que uma minoria partidária hipermilitante chegue à Presidência.

Esta possibilidade é magnificada pelo colégio eleitoral permitindo que um candidato minoritário no voto popular seja eleito, o que já aconteceu cinco vezes, desde 1824. As fontes das distorções são conhecidas. Escrevi coluna sobre o tema aqui.

A primeira é que o número de delegados em cada estado é igual a soma do número de deputados na câmara dos representantes e de senadores, favorecendo estados menores. A segunda é que o candidato vitorioso nos estados leva todos os delegados (com apenas duas exceções), e não de forma proporcional.

QUÓRUM ALTO – Outra distorção é que o Congresso hiper-representa estados menores e rurais. O bicameralismo implica assim em poder de veto da minoria sobre a maioria. E mais: no Senado, a prática do filibuster (o obstrutor) implica quórum de 60% para aprovação de leis (e não 50%).

Caso ocorra obstrução, ela só poderá ser superada por esse quorum hipermajoritário. Por isso, quase mil propostas para derrubar o colégio eleitoral foram derrotadas embora contassem com a aprovação de maiorias de cerca de 80% do eleitorado.

Outras supostas disfunções seriam a Suprema Corte, que estaria atuando como um ponto de veto sobre preferências majoritárias, e uma Constituição cujas dificuldades de emenda são quase intransponíveis.

POPULAÇÃO – A segunda novidade do livro é o argumento que certa hegemonia republicana desde Reagan (1981-1989) —quando o controle dos democratas sobre o Congresso foi rompido— estaria ameaçada pela mudança sócio-demográfica devido sobretudo à imigração.

O espectro da maioria branca tornar-se minoria teria produzido a radicalização antidemocrática da qual Trump seria expressão. Os múltiplos pontos institucionais de veto estariam travando a mudança.

Mas aqui há muito mais em jogo do que os autores examinam.

Fed baixando juros e Copom subindo, eis o retrato da oportunidade que Lula perdeu

Charge: Batendo na taxa de juros - Blog do AFTM

Charge do Cazo (Blog do AFTM)

William Waack
Estadão

A principal causa das taxas de juros mais altas por aqui, enquanto descem nos EUA, vem de escolhas políticas do atual governo. A principal delas foi apostar no tratamento das contas públicas via aumento da receita, com pouco empenho em cortar gastos. A oportunidade de fazer algum ajuste nas contas via cortes foi perdida logo no começo do mandato, quando Lula deixou claro que nem queria ouvir falar disso. Apostou na expansão do gasto público como motor do crescimento e impulso do consumo.

TRUQUES MANJADOS – Produziu um deficit permanente nas contas — e a desconfiança nos agentes econômicos. Reforçada por “atalhos fiscais”, “contabilidade criativa” ou como se queira chamar os truques para dizer que despesas não são despesas.

Naquele momento, há quase dois anos, uma outra oportunidade foi desprezada: a de compor um governo de genuína “frente nacional”. Escorado no núcleo duro do PT, Lula perdeu talvez a única chance de mobilizar forças políticas que o ajudassem de fato a se contrapor aos poderes ampliados do Legislativo frente ao Executivo. Acabou formando uma aliança com o STF.

Para o mundo lá fora, Lula assumiu o atual mandato exibindo o que considerava excelentes credenciais para tratar de questões ambientais e transição energética. Esse crédito já vinha se dissipando pela demora do Brasil em regular mercado de carbono, entender-se com blocos protecionistas (como a Europa) e definir como pretende ser campeão das energias renováveis e das fósseis ao mesmo tempo.

CHANCE PERDIDA – A tragédia das queimadas e dos incêndios consolidou ainda mais a noção de uma oportunidade perdida para o Brasil demonstrar ser uma solução, e não um problema no tratamento de questões ambientais em escala planetária. Lula imaginou que pudesse exercer essa “liderança”, uma oportunidade que literalmente está virando fumaça.

O conjunto de oportunidades perdidas cobra um preço alto em dois grandes âmbitos dos quais depende, no fundo, a sorte de qualquer governo. O primeiro é a capacidade política de ser “dono” de uma agenda que garanta mais influência e capacidade de articulação, não só na relação com o Legislativo, mas, por exemplo, na escolha de prefeitos nos grandes centros urbanos.

O segundo âmbito tem relevância ainda maior: ajudar as condições que fazem uma economia crescer e gerar prosperidade em voos de alcance maior do que são capazes as galinhas. É o que o Lula 3 poderia estar comemorando agora, em vez de bufar por conta de juros altos — o preço amargo da oportunidade perdida.

Demonizar imigrantes arruinaria países europeus e cidades do interior nos EUA

EUA abrigam mais imigrantes do que qualquer outro país – Noticias R7

EUA abrigam mais imigrantes do que qualquer outro país

Paul Krugman
The New York Times

Em outra época e lugar, a decisão da campanha de Trump e Vance de apostar na alegação infundada de que haitianos em Springfield, Ohio, estão roubando e comendo animais de estimação poderia ser meio engraçada. Mas, dado o estado atual da nação, isso não é piada. A cidade foi forçada a fechar escolas e edifícios públicos devido a recentes ameaças de bomba.

Diante dessa realidade, parece quase de mau gosto falar sobre as consequências econômicas desse tipo de retórica. Mas essas consequências são reais e esmagadoramente negativas —especialmente para municípios como Springfield, que conseguiram reverter o declínio populacional e impulsionar o crescimento do emprego ao abraçar a imigração.

Aqui, podemos ver como o ódio pode destruir as chances de renovação econômica em partes do interior dos Estados Unidos.

PROBLEMA COMUM – Já escrevi antes sobre o problema das regiões deixadas para trás pela economia do século 21, um problema comum a muitas nações ricas. O declínio em partes da antiga Alemanha Oriental alimentou o extremismo de direita de maneiras que se assemelham à ascensão do trumpismo em algumas partes deprimidas do nosso país.

Existem, no entanto, algumas pequenas cidades que conseguiram contrariar a tendência; e, em muitos casos, os imigrantes foram centrais para seu renascimento. Springfield, com sua comunidade de migrantes haitianos (legais!), é um exemplo.

Outros exemplos incluem minha cidade natal, Utica, Nova York, impulsionada por refugiados da Bósnia e Mianmar; Springdale, Arkansas, que atraiu pessoas de vários lugares, incluindo as Ilhas Marshall; e muitos outros.

PONTOS DE IMIGRAÇÃO – Esses pontos de imigração locais tendem a envolver etnias específicas pelo mesmo motivo que muitos imigrantes noruegueses se estabeleceram em Minnesota e muitos judeus da Europa Oriental se dirigiram para o Lower East Side de Nova York: alguns pioneiros enviam notícias para pessoas que conhecem, e eventualmente surgem comunidades com massa crítica para ajudar a sustentar algumas de suas tradições culturais.

Por que os imigrantes se mudam para algumas pequenas cidades? Em parte em resposta aos custos de habitação que eram, pelo menos até recentemente, relativamente baixos (como tendem a ser em cidades em declínio). Em alguns casos, eles também se mudam para aproveitar empregos que alguns americanos nativos, por qualquer motivo, relutam em fazer.

Em Springdale, lar da Tyson Foods, esses são frequentemente empregos em abatedouros de aves. Em Springfield, que, segundo o The New York Times, viu “um boom em empregos de manufatura e armazéns”, os empregadores sugerem que alguns jovens adultos nativos evitam “trabalhos repetitivos e de nível inicial”.

TIRANDO EMPREGOS – Mas os trabalhadores imigrantes estão tirando empregos dos americanos nativos? Donald Trump e JD Vance têm feito essa alegação repetidamente. E é verdade que, a nível nacional, a força de trabalho nativa realmente diminuiu desde 2019. Mas, em termos gerais, a explicação não é que os imigrantes estão tirando empregos; é que os baby boomers estão chegando à idade de aposentadoria.

Americanos nativos em seus anos de trabalho mais produtivos têm mais probabilidade de estar empregados do que antes da pandemia, ou em qualquer momento durante a administração Trump.

Essa é a situação a nível macro. No nível de algumas das comunidades que atraíram grandes números de trabalhadores imigrantes, o quadro é ainda mais claro. Ao fomentar o crescimento geral da economia de uma cidade, os imigrantes frequentemente aumentam o emprego entre os nativos. Por quê? Porque gastam grande parte de seus ganhos onde vivem e trabalham, ajudando a criar empregos locais; um estudo de 2015 descobriu que “cada imigrante cria 1,2 emprego para trabalhadores locais, a maioria deles indo para trabalhadores nativos”.

HÁ PROBLEMAS… – Um rápido influxo de imigrantes pode apresentar problemas? Certamente. Pode aumentar os custos de habitação, pelo menos temporariamente, embora os preços das casas sejam um problema em todo o país, e o aumento em Springfield, que ainda tem habitação barata pelos padrões nacionais, desde a pandemia tem sido semelhante ao do país como um todo. Um aumento repentino na população imigrante também pode pressionar os serviços locais, incluindo escolas e hospitais.

Mas os sistemas escolares e hospitalares podem ser ampliados, especialmente quando a imigração está aumentando a receita do governo local. E certamente é melhor ter os desafios de infraestrutura de Springfield do que os de áreas com população em queda, onde o fechamento de hospitais e escolas está criando desertos de saúde e educação.

É compreensível a preocupação em Springfield após a morte de um menino de 11 anos cujo ônibus escolar foi atingido por um imigrante dirigindo sem licença. Mas isso não justifica demonizar toda uma comunidade imigrante.

NO INTERIOR – No geral, a mudança de imigrantes para algumas pequenas cidades tem sido muito benéfica, uma das melhores esperanças que essas cidades têm para um ressurgimento econômico. Mas essa esperança desaparecerá se os imigrantes forem afastados pelo clima de ódio.

Já mencionei a Alemanha, onde alguns líderes empresariais temem que a ascensão do extremismo de direita leve a uma “catástrofe econômica” no leste do país, que precisa de imigração para sustentar sua economia. A mesma coisa poderia acontecer nos EUA? Sim.

Nenhum relato deste terrível episódio em nossa política está completo se não mencionar que falsas alegações de que estamos enfrentando uma onda de crimes de migrantes e afirmações bizarras sobre imigrantes comendo animais de estimação podem facilmente acabar aprofundando os problemas econômicos em partes do interior dos EUA.

Ditadura de Maduro prende e tortura até crianças deficientes, afirma a ONU

Manifestantes protestam em Caracas após vitória de Maduro ser declarada |  Mundo | G1

Crianças que protestam também são presas e torturadas

José Casado
Veja

Dias atrás, Lula combinou com Gustavo Petro, presidente da Colômbia, e Manuel López Obrador, presidente do México, uma videoconferência com Nicolás Maduro, ditador da Venezuela. Na quarta-feira (8/9), estava tudo pronto, quando o chanceler da cleptocracia venezuelana Yvan Gil avisou que, infelizmente, Maduro estaria ocupado na hora previamente acertada: viajaria ao interior do país, onde o sinal de telefonia costuma ser “muito instável”.

Lula deve ter razões pessoais para a complacência com Maduro, a quem atribui “um comportamento que deixa a desejar”, como disse aos repórteres Diego Joaquim e Edmilson Santos, da rádio Difusora de Goiânia.

FORA DO NORMAL – Essa benevolência tem surpreendido diplomatas profissionais porque é incoerente e incompatível com a defesa dos direitos humanos na tradição da política externa brasileira.

Nesta terça-feira (17/9) circulou no Itamaraty, em Brasília, cópia do relatório da Missão Independente do Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre a repressão na Venezuela antes e nos dias seguintes à eleição presidencial fraudada por Maduro, no dia 28 de julho.

O levantamento foi feito entre outubro do ano passado e agosto. Resume o horror imposto por uma ditadura, que admite a morte de pelo menos 25 pessoas nas 48 horas seguintes à fraude eleitoral entre elas, dois menores de idade.

FILME DE TERROR – As formas de repressão adotadas pelo regime comandado por Nicolás Maduro incluem tortura e humilhações sexuais na prisão.

Ao menos 1.619 pessoas foram detidas como “terroristas” durante a temporada eleitoral. Confirmou-se a detenção de 158 crianças “em alguns casos, as vítimas foram meninos e meninas com deficiência”.

O relatório da Missão Independente do Conselho de Direitos Humanos da ONU tem 21 páginas de iniciativas inaceitáveis tomadas por um regime de terror e horror.

A lama que rola na campanha mostra a política em processo de degradação

A degradação da política é uma ameaça à democracia

Dora Kramer
Folha

O lamaçal que assola a disputa eleitoral em São Paulo à parte, mas ele incluído como símbolo do fenômeno de que falaremos a seguir, nosso ambiente político sofre acelerado processo de degradação e não é de hoje. Há pelo menos uns 20 anos o nível dos meios e modos na política vem baixando de modo permanente. Uma maravilha nunca foi, mas havia qualidade em meio a nichos de desqualificação nos partidos e no Congresso.

Tanto que a Constituição que nos rege, lembremos, foi elaborada, votada e aprovada por senadores e deputados há 36 anos. Em legislatura anterior, senadores e deputados rejeitaram o candidato à Presidência da ditadura e, antes disso, fizeram a Lei da Anistia. Imperfeita? Era o possível à época.

FRUTO DA POLÍTICA – A transição do regime autoritário para o Estado de Direito foi fruto da política, atividade sem a qual não se tem um país democrático. Portanto, a navegação em ondas de sentimentos antipolítica corresponde ao embarque no barco do autoritarismo.

Personagens que encarnavam esse figurino faziam sucesso pontual, mas acabavam sendo expelidos ou extintos por inanição. O que temos hoje é um cenário onde a exceção está em via de se tornar quase numa regra de mau espetáculo.

Assusta, embora não surpreenda, ver o circo mambembe exibido nos debates da eleição municipal da maior cidade do país. Se essa canoa virou foi porque deixaram ela virar.

CULPADOS – E nisso a culpa é coletiva: dos partidos em sua distorção de critérios para escolha de candidatos, do eleitorado em seu apreço pelo baixo entretenimento, dos políticos mais qualificados que se deixam levar e aderem ao deboche, mas também dos organizadores dos encontros em sua busca por audiência.

As cenas de ofensas e agressões se repetem no Parlamento, onde hoje não é mais fato raro reuniões de comissões e até sessões em plenário se transformarem em tablados de vale-tudo enquanto nos bastidores se administram balcões de negócios. Já disse e repito: não foi sempre assim.

Em nome da saúde da democracia urge que a política entre em processo de reabilitação, antes da degradação total.

Herdeiros do rinoceronte Cacareco têm espaço, mas quem se lembra do Enéas?

homem careca de farta barba preta, bigode preto e óculo preto

Enéas Carneiro foi eleito deputado federal duas vezes

Elio Gaspari
O Globo/Folha

Desde 1959, quando o rinoceronte Cacareco teve 100 mil votos para uma cadeira de vereador na eleição municipal de São Paulo, os candidatos pitorescos ganharam um espaço inédito. Só na noite de 6 de outubro se saberá se ganharam peso político. As pesquisas de outros estados mostram o contrário. Na vida real, a baixaria é alimentada por dois candidatos, só em São Paulo. No Rio, Recife, Porto Alegre e Belo Horizonte e nas outras capitais, a campanha vai bem, obrigado.

Depois de Cacareco, vieram fenômenos como Enéas Carneiro e o comediante Tiririca. Enéas disputou três vezes a Presidência da República e chegou a conseguir 1,4 milhão de votos. Em 2002, elegeu-se deputado federal por São Paulo com a maior votação da época, 1,6 milhão de votos. Reelegeu-se em 2006 e morreu no ano seguinte. Tiririca elegeu-se deputado federal por São Paulo em 2010, também como o mais votado (1,3 milhão de votos), e está até hoje na Câmara.

ENÉAS E TITIRICA – Cacareco morreu no zoológico em 1962. O quadrúpede passou pela vida pública sem deixar vestígios. Seus similares também. Ganha um archote para produzir uma queimada quem souber das contribuições de Enéas e Tiririca para a vida do país. Representaram um desconforto dos eleitores, nada mais que isso. Ninguém votou em Cacareco, Enéas ou Tiririca esperando alguma coisa. Afinal, o voto é obrigatório. Se não fosse, esse eleitor ficaria em casa.

Um cidadão que acompanhou por dez anos a Operação Lava Jato e viu seu funeral melancólico tem razões para não acreditar em coisa nenhuma. Outra coisa é entregar a administração de sua cidade ao produto de uma vaia. Os candidatos pitorescos vestem-se com mantos radicais para nada. Fanáticos sem causa, são asteriscos que acabam esquecidos.

Tudo isso pode fazer sentido, mas falta incluir no quadro o fenômeno Jair Bolsonaro, saído da avalanche eleitoral de 2018. Seu filho Eduardo quebrou o recorde de Enéas, elegendo-se para a Câmara com 1,8 milhão de votos. Quatro anos depois, quando o pai disputava a reeleição, teve menos da metade de eleitores.

LULA NA CADEIA – A eleição de 2018 foi única e ainda reverbera. Lula, o principal candidato, estava na cadeia, trancado por decisão do Supremo Tribunal Federal, soprada pelo comandante do Exército. Poucos países passaram por experiências semelhantes.

A maré conservadora e antipetista elegeu os Bolsonaro. No Rio, o anônimo juiz Wilson Witzel capturou o governo do estado e foi deposto em 2021. O Supremo soltou Lula, os generais voltaram aos quartéis e, no Rio, o candidato de Bolsonaro, sem a plumagem dos pitorescos, patina.

As pesquisas dos próximos dias dirão qual foi o efeito da cadeirada de domingo no debate da TV Cultura e, na noite de 6 de outubro, virá o juízo final. O candidato Pablo Marçal é qualificado como “influenciador”. Trata-se de um vago anglicismo. Na mesma noite, se saberá se existe bolsonarismo, ou se ele é um vagão atrelado a um locomotiva conservadora.

OUTROS CACARECOS – O protesto encarnado por Cacareco era muito mais inteligente. O rinoceronte nunca disse besteira nem foi a debates. Para quem está a fim de jogar o voto fora, limitando-se a mostrar seu desconforto, aqui vão duas sugestões de candidaturas, de animais que alegram o Zoológico de São Paulo:

1 – Pepe é um chimpanzé, maior de idade.

2 – Sininho é uma fêmea de hipopótamo, filha da falecida Tetéia, a decana do pedaço.