José Carlos Werneck
A Constituição Federal prevê em seu artigo 101 que “o Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada”.
Assim, ao ler a espantosa decisão de Dias Toffoli, imediatamente constata-se que não se está exigindo notável saber jurídico para os integrantes do Supremo Tribunal Federal.
VÃ EXIGÊNCIA – Notável é aquilo que está acima da média do conhecimento de todos, algo que é admirável, extraordinário, que inclui saber acadêmico, livros publicados, reconhecimento nacional e até internacional como jurista. Na prática, este requisito nem sempre tem sido seguido pelos presidentes nas indicações.
O eminente jurista Ives Gandra Martins em um artigo lembrou que “a reputação ilibada e notório conhecimento, que a Constituição impunha e impõe para a indicação de ministro do colendo excelso, são critérios de tal forma subjetivos e de difícil avaliação que ao Senado Federal tem restado, apenas, papel homologatório da indicação”.
Na época, o artigo foi comentado pelo notável jurista e ministro aposentado do STF José Carlos Moreira Alves, que defendeu a nomeação nos moldes em que era e é feita, lembrando fato não despiciendo de que, na história do STF, tal tipo de nomeação não reduziu jamais a independência da Corte, nem a qualidade de suas decisões.
OUTRA POSTURA – Ives Gandra diz que hoje sua postura seria diversa daquela mencionada. “Em minha pessoal visão do Poder Judiciário, entendo que a função dos tribunais superiores é menos fazer justiça e mais preservar as instituições. Em outras palavras, justiça se faz nas duas instâncias inferiores, perante o juízo monocrático e perante o órgão de segundo grau, colegiado encarregado da revisão da decisão, mediante o oferecimento do recurso cabível”.
Para ele, a função dos tribunais superiores é preservar as instituições jurídicas e o Estado democrático de Direito, motivo por que, nesta pessoal concepção, apenas as causas que transcendam o interesse das partes ou que impliquem manifesta violação da lei, da Constituição ou da jurisprudência consolidada é que deveriam subir para essas cortes.
“Fosse sua função a de administrar justiça, como ocorre com as instâncias inferiores, em que o duplo grau de jurisdição é garantia constitucional, e teríamos uma multiplicação infinita de instâncias – quatro no mínimo, visto que há ainda outros tipos de recursos regimentais no âmbito dos próprios tribunais – para as seções ou para o plenário”.
E COMPLETA – “Dir-se-á que é o que ocorre hoje, mas tal ocorre por excesso de competências, algumas superpostas, o que transforma, em realidade, os tribunais superiores em terceira e quarta instâncias de administração da Justiça, e não apenas naquelas voltadas à preservação do direito e das instituições”.
Gandra ressalta que desde 1987 propugna por duas instâncias de administração da Justiça: “uma instância de uniformização (STJ), cabendo à Suprema Corte função de autêntica corte constitucional, acrescida de algumas competências de natureza jurídico-política para estabilização do direito”.
Evitar-se-ia, assim, que dez ministros do STF (o presidente só decide em plenário) recebessem mais de 100 mil processos, por ano, o STJ mais de 130 mil e o TST outros 130 mil.
TRIBUNAL DE CONTAS – “Na minha proposta, as cortes de contas seriam transformadas em órgãos do Poder Judiciário, com a função de controlar os gastos das entidades e órgãos públicos”, diz ele.
Gandra conclui o artigo afirmando não ver por que mudar sua atual posição, a não ser que se encontre um sistema que não prejudique essa concepção jurídico-política que deve conformar uma corte constitucional e suprema.
Mas é claro que está se referindo a nomeação de juristas realmente de notável saber e reputação ilibada, e não de amigos do presidente ou advogados de seu partido político, como ocorre hoje no Brasil.