No Dia Internacional da Mulher, meu coração, não sei por quê, bate feliz… 

Carinhoso - Braguinha - LETRAS.MUS.BR

Braguinha, um compositor realmente genial

Paulo Peres
Poemas & Canções

O compositor carioca Carlos Alberto Ferreira Braga (1907-206), conhecido como Braguinha ou João de Barro, fez uma belíssima declaração de amor ao colocar letra no famoso choro “Carinhoso”, um dos maiores clássicos da MPB, composto por Pixinguinha.  “Carinhoso” foi gravado por Orlando Silva, em 1937, pela RCA Victor. É a segunda música brasileira mais gravada, junto com Aquarela do Brasil (Ary Barroso), com 430 gravações. Só perdem para Garota de Ipanema (Tom e Vinicius), com 442 gravações.

CARINHOSO
Pixinguinha e Braguinha

Meu coração, não sei por quê
Bate feliz quando te vê
E os meus olhos ficam sorrindo
E pelas ruas vão te seguindo,
Mas mesmo assim foges de mim.

Ah se tu soubesses
Como sou tão carinhoso
E o muito, muito que te quero.
E como é sincero o meu amor,
Eu sei que tu não fugirias mais de mim.

Vem, vem, vem, vem,
Vem sentir o calor dos lábios meus
A procura dos teus.
Vem matar essa paixão
Que me devora o coração
E só assim então serei feliz,
Bem feliz.

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DIA INTERNACIONAL DA MULHER!
Paulo Peres

Quero parabenizá-la, dizendo que
não existe palavra capaz de definir,
peculiarmente, esta dádiva chamada
MULHER, maravilha infinita
que embeleza o cotidiano!…

Na criativa poesia de Lêdo Ivo, é possível mudar, mas continuar o mesmo

Homenagem a Lêdo Ivo – Educação Emocional e Terapia por meio de contosPaulo Peres
Poemas & Canções

O jornalista, cronista, romancista, contista, ensaísta e poeta alagoano Lêdo Ivo (1924-2012), membro da Academia Brasileira de Letras, no soneto “A Mudança”, afirma que se pode mudar e permanecer bem longe das mudanças, sendo, ao mesmo tempo, quem vive e quem morre.

A MUDANÇA
Lêdo Ivo

Mudo todas as horas.
E o tempo, sem demora,
muda mais do que fia.

Mudo mas permaneço
bem longe das mudanças.
Como uma flor, floresço.
Sou pétala e esperança.

Mudo e sou sempre o mesmo,
igual a um tiro a esmo.
Como um rio que corre.

Sem sair de onde estou,
de tanto mudar sou
o que vive e o que morre. 

Walter Franco e as velas abertas, sempre em busca de novos horizontes

Walter Franco – Wikipédia, a enciclopédia livre

Walter Franco morreu aos 74 anos

Paulo Peres
Poemas & Canções

O cantor e compositor paulista Walter Rosciano Franco (1945-2019), na letra de “Vela Aberta”, mostra que na praia o desejo por horizontes novos é constante e as velas abertas sempre despertam anseios de navegar. Nestes momentos percebemos que todos os povos possuem muito em comum e podem ser irmanados.  A música foi gravada por Walter Franco no LP Vela Aberta, em 1980, pela Epic/CBS.

VELA ABERTA
Walter Franco

Lá vai uma vela aberta
Se afastando pelo mar
Branca visão que desperta
Anseios de navegar

Meus olhos seguem a vela
Pela vastidão do mar
Ainda se torna mais bela
Na expressão do teu olhar
Expressão vaga e perdida
Que eu nem sei como explicar
Nela vejo refletida
Toda beleza do mar

Quero os horizontes novos
Que ele vai me ofertar
Sou irmão dos outros povos
Que estão para além do mar

Duas marionetes sem brio e a relação por um fio, na poesia de Jorge Ventura

Jorge Ventura, poeta e ator carioca

Paulo Peres
Poemas & Canções

O publicitário, ator, jornalista e poeta carioca Jorge Ventura, no poema “Marionetes”, destacou as dualidades sempre existentes nas relações entre as pessoas.

MARIONETES
Jorge Ventura  

Existe entre nós
um par com duas pontas.
Cada qual com dois prós,
cada qual com dois contras.

Puxa-se uma corda daqui,
outra dali,
mãos e pernas espalham-se
emaranhados
em movimentos manipulados,
sabe Deus por quem.

O vaivém dos gonzos
range os limites estipulados,
em meio a trapos, farrapos
e desculpas esfarrapadas.

Duas marionetes sem brio
e a relação por um fio

Num soneto de rimas perfeitas, Jorge de Lima vai perdendo a lucidez…

A POESIA DO BRASIL: JORGE DE LIMA (1893-1953)... E OS 100 ANOS DO LIVRO "XVI ALEXANDRINOS"...

Jorge de Lima, retratado por Portinari

Paulo Peres
Poemas & Canções

O político, médico, pintor, tradutor, biógrafo, ensaísta, romancista e poeta alagoano Jorge Mateus de Lima (1893-1953) em “Solilóquio Sem Fim e Rio Revolto”, conversa consigo mesmo e foge completamente da razão, num soneto de rimas absolutamente perfeitas.

SOLILÓQUIO SEM FIM E RIO REVOLTO
Jorge de Lima

Solilóquio sem fim e rio revolto –
mas em voz alta, e sempre os lábios duros
ruminando as palavras, e escutando
o que é consciência, lógica ou absurdo.

A memória em vigília alcança o solto
perpassar de episódios, uns futuros
e outros passados, vagos, ondulando
num implacável estribilho surdo.

E tudo num refrão atormentado:
memória, raciocínio, descalabro…
Há também a janela da amplidão;

E depois da janela esse esperado
postigo, esse último portão que eu abro
para a fuga completa da razão.

Entre o tempo e o destino, há um caso antigo, um elo, um par…

VÍDEO: Vital Lima e Nilson Chaves relembram 40 anos de composições históricas no #LibCult | Música | O Liberal

Vital e Chaves, dois grandes compositores

Paulo Peres
Poemas & Canções

O filósofo, instrumentista, cantor e compositor paraense Euclides Vital Porto Lima, com seu parceiro Nilson Chaves, na letra de “TempoDestino”, mostra o que poderia ocorrer caso o tempo ficasse parado. Essa música foi gravada por Vital Lima e Nilson Chaves no LP Interior, em 1986, pela Vision.

TEMPODESTINO
Nilson Chaves e Vital Lima

Há entre o tempo e o destino
um caso antigo, um elo, um par
que pode acontecer, menino,
se o tempo não passar?
Feito essas águas que subindo
forçaram a gente a se mudar
Que pode acontecer, meu lindo,
se o tempo não passar?
O tempo é que me deu amigos
e esse amor que não me sai
que doura os campos de trigo
e os cabelos de meu pai
Faz rebentar paixões
depois se entrega às criações
e assim mantém a vida…
Que acontecerá aos corações
se o tempo não passar?
Não mato o meu amor,
no fundo porque tenho amizade nele
que já faz parte do meu mundo
do tempo entre eu e ele.

Ao homem cabe pontuar a própria vida, mas não é preciso usar o ponto final

Bola de futebol... é um utensílio... João Cabral de Melo Neto - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

O diplomata e poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920-1999), no poema “Questão de Pontuação”, afirma que o homem que pontuar a sua vida é aceito por todos, mas ele só discorda do ponto final.

QUESTÃO DE PONTUAÇÃO
João Cabral de Melo Neto

Todo mundo aceita que ao homem
cabe pontuar a própria vida:
que viva em ponto de exclamação
(dizem: tem alma dionisíaca);
viva em ponto de interrogação
(foi filosofia, ora é poesia);
viva equilibrando-se entre vírgulas
e sem pontuação (na política):
o homem só não aceita do homem
que use a só pontuação fatal:
que use, na frase que ele vive,
o inevitável ponto final.

A Terra é a mãe da vida e quem a ama deve aprender a cuidar dela

Vital Farias, O Cantador

Vital Farias e a filha Giovanna

Paulo Peres
Poemas & Canções

O músico, cantor e compositor paraibano Vital Farias, na letra de “Não Jogue Lixo No Chão”, conclama as pessoas a repensarem as suas atitudes, sob pena de inviabilizarem a vida no planeta para as gerações vindouras. Esta música faz parte do CD independente Uyraplural-Giovanna Farias & Vital Farias, produzido pelo próprio Vital Farias em 2002, que marcou a estreia de sua filha e cantora Giovanna Farias.

NÃO JOGUE LIXO NO CHÃO
Vital Farias

Não jogue lixo no chão
Chão é pra plantar semente
Pra dar o bendito fruto
Pra alimentação da gente

O peixe que sai do rio
O amor que sai do peito
A água limpa da fonte
O sentimento perfeito

Não jogue lixo no chão

A natureza é quem cria
O amor imediatamente
Milagre que faz da vida
Bendito fruto do ventre

Não jogue lixo no chão

Não jogue lixo no chão
Nem rios, lagos e mares
A terra é nossa morada
Onde habita nossos pares

A terra que tudo cria
Não pede nada demais
Se tratada com carinho
Para vigorar a paz

Se queres sabedoria
Aprenda isto de cór
A terra é a mãe da vida
Útero ventre maior

Não jogue lixo no chão

O amor pode ser tão grande que não é necessário dizer nada…

Tribuna da Internet | “Prefiro tê-la jovem no meu sonho, do que velha, apertá-la nos meus braços…”Paulo Peres
Poemas & Canções

O advogado, político e poeta acreano José Guilherme de Araujo Jorge (1914-1987) ou, simplesmente, J. G. de Araújo Jorge, foi conhecido como o Poeta do Povo e da Mocidade, pela sua mensagem social e política e por sua obra romântica, como no poema “O Resto é Silêncio”, no qual  J.G. de Araújo Jorge mostra que, quando dois amantes estão um no outro, como se estivessem sozinhos, o resto é silêncio.

O RESTO É SILÊNCIO
J.G. de Araújo Jorge

E então ficamos os dois em silêncio, tão quietos
como dois pássaros na sombra, recolhidos
ao mesmo ninho,
como dois caminhos na noite, dois caminhos
que se juntam
num mesmo caminho…

Já não ouso… já não coras…
E o silêncio é tão nosso, e a quietude tamanha
que qualquer palavra bateria estranha
como um viajante, altas horas…

Nada há mais a dizer, depois que as próprias mãos
silenciaram seus carinhos…
Estamos um no outro
como se estivéssemos sozinhos..

E o poeta Vinicius, humildemente, colocou letra num choro de Pixinguinha…

Documentário mostra parceria entre Vinicius e Pixinguinha - Jorn

Vinicius e Pixinguinha, gênios da música

Paulo Peres
Poemas & Canções

O diplomata, advogado, jornalista, dramaturgo, compositor e poeta carioca Vinícius de Moraes (1913-1980), na letra do chorinho “Lamento”, confessa a tristeza do desamor e tenta a reconciliação. O choro “Lamento”, composto por Pixinguinha em 1928, foi originalmente apenas instrumental e somente em 1962 ganhou essa letra do Vinícius de Moraes. O chorinho foi gravado por Elizeth Cardoso no LP Muito Elizeth, em 1966, pela Copacabana.

LAMENTO
Pixinguinha e Vinícius de Moraes

Morena, tem pena
Mas ouve o meu lamento
Tento em vão te esquecer
Mas olhe, o meu tormento é tanto
Que eu vivo em prantos, sou tão infeliz
Não há coisa mais triste, meu benzinho
Que esse chorinho que eu te fiz

Sozinho, morena
Você nem tem mais pena
Ai, meu bem, fiquei tão só
Tem dó, tem dó de mim
Porque eu estou triste assim por amor de você
Não há coisa mais linda neste mundo
Que o meu carinho por você

Morena, tem pena…

Nas contradições do mundo, surge muita dificuldade na crença em Deus

A crença em Deus subsiste devido ao... Sigmund Freud - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

Formado em Letras (Português e Literatura), artista gráfico, músico e poeta carioca João de Abreu Borges (1951-2019) versificou seu “Antipanteísmo”, inconformado com a crença de que Deus e todo o universo são uma única e mesma coisa e que Deus não existe como um espírito separado.

Poetas que escreveram sobre a natureza foram com frequência adeptos do panteísmo. Um bom exemplo desta crença está em alguns poemas de Fernando Pessoa. O panteísmo ensina que Deus é todo o universo, a mente humana, as estações e todas as coisas e ideias que existem. A palavra panteísmo vem de dois termos gregos que significam tudo e Deus.

ANTIPANTEÍSMO
João de Abreu

Acho que chega, meu Deus,
De tantos ateus,
De tantos emigrantes
De suas próprias almas
Sem viver o que
aqui e agora
É só o que morreram
no passado
Ou quase no futuro
Não haverão mais de existir

Acho que chega, meu Deus,
Deixe-me sozinho,
Então,
Com meu corpo estranho
Que um dia irá partir

E eu nem tenho o direito
De saber
Para onde vão tantos sonhos
Tantos caminhos…

Um livro aberto você pode encontrar na cabeça de um poeta acordado

Ilka Bosse - Empresária Aposentada - Choupana I. C. Representação | LinkedIn

Ilka Bosse, poeta catarinense

Paulo Peres
Poemas & Canções

A pedagoga (formada em duas habilitações na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras), empresária aposentada, escritora, cronista e poeta catarinense Ilka Bosse, conhecida como Bailarina das Letras, tentou entender uma “Cabeça de Poeta”.

CABEÇA DE POETA
Ilka Bosse

Livro aberto tu encontras
na cabeça de um poeta acordado
Com a sabedoria tu te confrontas
entre estrofes ou poema inacabado.

É incógnita o que nesta cabeça contém
Pois vê o poeta tudo diferente, …do avesso
Querer entendê-lo? Acredito, já não convém
Pois o poeta que é poeta não tem endereço!

Ele vai folhando sua sabedoria nata
Deleita na natureza, beijando a verde mata
Sonha sua dor/desejo/alegria/emoção e paixão

À beira-mar, na areia, …onde edificou castelos
Em delírios volta à realidade, compõe versos belos
Morre o Poeta, mas fica, na biblioteca, seu coração.

“Pede a banda pra tocar um dobrado, olha nós outra vez no picadeiro…”

Parceria entre Ivan Lins e Vítor Martins rendeu mais de 100 músicas – Jornal da USP

Ivan e Martins, parceiros magistrais

Paulo Peres
Poemas & Canções

Na letra de “Somos todos iguais nesta noite”, em parceria com Ivan Lins, o compositor (letrista) paulista Vitor Martins compara o mundo a um circo, onde seguimos o ritmo da banda de fanfarra, em alusão à ditadura militar vigente no país de 1964 a 1985. A música intitula o LP Somos todos iguais nesta noite, lançado por Ivan Lins, em 1977, pela EMI-Odeon.

SOMOS TODOS IGUAIS NESTA NOITE
Ivan Lins e Vitor Martins

Somos todos iguais nesta noite
Na frieza de um riso pintado
Na certeza de um sonho acabado
É o circo de novo

Nós vivemos debaixo do pano
Entre espadas e rodas de fogo
Entre luzes e a dança das cores
Onde estão os atores

Pede a banda
Pra tocar um dobrado
Olha nós outra vez no picadeiro
Pede a banda
Prá tocar um dobrado
Vamos dançar mais uma vez

Somos todos iguais nesta noite
Pelo ensaio diário de um drama
Pelo medo da chuva e da lama
É o circo de novo

Nós vivemos debaixo do pano
Pelo truque malfeito dos magos
Pelo chicote dos domadores
E o rufar dos tambores

Hilda Hilst usa linhos e unguentos para o coração machucado pelo tempo

As mulheres em geral são chatíssimas;... Hilda Hilst - PensadorPaulo Peres
Poemas & Canções

A ficcionista, dramaturga, cronista e poeta paulista Hilda Hilst (1930-2004) usa o poema “Penso Linhos e Unguentos”, para os ferimentos que o tempo produziu no coração.

PENSO LINHOS E UNGUENTOS
Hilda Hilst

Penso linhos e unguentos
para o coração machucado de tempo.
Penso bilhas e pátios
Pela comoção de contemplá-los.
(E de te ver ali à luz da geometria de teus atos)
Penso-te
Pensando-me em agonia. E não estou.
Estou apenas densa
Recolhendo aroma, passo
O refulgente de ti que me restou.

Uma extraordinária canção, que virou peça de teatro, filme e novela de televisão

O Ébrio | Só Spaghetti Western

Propaganda do filme “O Ébrio”

Paulo Peres
Poemas & Canções

O cantor (tenor), ator e compositor carioca Antônio Vicente Felipe Celestino (1894-1968) lançou um estilo caracterizado pelo romantismo exacerbado, comovendo e arrebatando um grande público durante a primeira metade do século XX, através do teatro, do rádio, de discos e do cinema nacional.

A letra dramática da música “O Ébrio”, repleta de desventuras e imagens beirando a pieguice, era uma perfeita sinopse para o enredo de um filme, desde o prólogo falado à parte musical propriamente dita. Nesta, o contraste da primeira parte, no modo menor, com a segunda, no modo maior, contribui para ressaltar a tragédia do protagonista. “O Ébrio”, lançado em 1946, com Vicente Celestino no papel principal, obteve recordes de bilheteria.

A canção “O Ébrio” gravada por Vicente Celestino, em 1936, pela RCA Victor, também inspirou naquele ano uma peça de teatro e, em 1965, uma novela na TV Paulista.

O ébrio', filme inspirado na famosa música de Vicente Celestino, será  exibido nos EUA | Ancelmo - O Globo

Celestino, no filme “O Ébrio”

O ÉBRIO
Vicente Celestino

Nasci artista. Fui cantor. Ainda pequeno levaram-me para uma escola de canto. O meu nome, pouco a pouco, foi crescendo, crescendo, até chegar aos píncaros da glória. Durante a minha trajetória artística tive vários amores. Todas elas juravam-me amor eterno, mas acabavam fugindo com outros, deixando-me a saudade e a dor. Uma noite, quando eu cantava a Tosca, uma jovem da primeira fila atirou-me uma flor. Essa jovem veio a ser mais tarde a minha legítima esposa. Um dia, quando eu cantava A Força do Destino, ela fugiu com outro, deixando-me uma carta, e na carta um adeus. Não pude mais cantar. Mais tarde, lembrei-me que ela, contudo, me havia deixado um pedacinho de seu eu: a minha filha. Uma pequenina boneca de carne que eu tinha o dever de educar. Voltei novamente a cantar mas só por amor à minha filha. Eduquei-a, fez-se moça, bonita… E uma noite, quando eu cantava ainda mais uma vez A Força do Destino, Deus levou a minha filha para nunca mais voltar. Daí pra cá eu fui caindo, caindo, passando dos teatros de alta categoria para os de mais baixa. Até que acabei por levar uma vaia cantando em pleno picadeiro de um circo. Nunca mais fui nada. Nada, não! Hoje, porque bebo a fim de esquecer a minha desventura, chamam-me ébrio. Ébrio…

Tornei-me um ébrio e na bebida busco esquecer
Aquela ingrata que eu amava e que me abandonou
Apedrejado pelas ruas vivo a sofrer
Não tenho lar e nem parentes, tudo terminou
Só nas tabernas é que encontro meu abrigo
Cada colega de infortúnio é um grande amigo
Que embora tenham como eu seus sofrimentos
Me aconselham e aliviam os meus tormentos
Já fui feliz e recebido com nobreza até
Nadava em ouro e tinha alcova de cetim
E a cada passo um grande amigo que depunha fé
E nos parentes… confiava, sim!
E hoje ao ver-me na miséria tudo vejo então
O falso lar que amava e que a chorar deixei
Cada parente, cada amigo, era um ladrão
Me abandonaram e roubaram o que amei
Falsos amigos, eu vos peço, imploro a chorar
Quando eu morrer, à minha campa nenhuma inscrição
Deixai que os vermes pouco a pouco venham terminar
Este ébrio triste e este triste coração
Quero somente que na campa em que eu repousar
Os ébrios loucos como eu venham depositar
Os seus segredos ao meu derradeiro abrigo
E suas lágrimas de dor ao peito amigo

Um triste olhar, que enleva e que assombra, na poesia de Henriqueta Lisboa

Henriqueta Lisboa

Henriqueta Lisboa, poeta mineira

Paulo Peres
Poemas & Canções

A poeta mineira Henriqueta Lisboa (1901-1985), no soneto “Olhos Tristes”, tem a sensação de uma despedida através de renúncias repetidas.

OLHOS TRISTES
Henriqueta Lisboa

Olhos mais tristes ainda do que os meus
são esses olhos com que o olhar me fitas.
Tenho a impressão que vais dizer adeus
este olhar de renúncias infinitas.

Todos os sonhos, que se fazem seus,
tomam logo a expressão de almas aflitas.
E até que, um dia, cegue à mão de Deus,
será o olhar de todas as desditas.

Assim parado a olhar-me, quase extinto,
esse olhar que, de noite, é como o luar,
vem da distância, bêbedo de absinto…

Este olhar, que me enleva e que me assombra,
vive curvado sob o meu olhar
como um cipreste sobre a própria sombra.

Gil e Torquato envolvidos na geleia geral, cujo nome passaria a ser Tropicália…

Caetano celebra Torquato Neto: era um amigo inspiradíssimo e inspirador - Cidadeverde.com

Torquato e Gil, sempre inspirados

Paulo Peres
Poemas & Canções

O artista plástico, cineasta, ator, jornalista, poeta e letrista piauiense Torquato Pereira de Araújo Neto (1944-1972) é considerado um dos principais letristas do movimento Tropicalista, conforme mostra a letra de “Geléia Geral” que, “representa uma síntese dos cânones do próprio movimento tropicalista, além de ser modelo de seu contorno poético”, segundo o historiador Jairo Severiano.

Torquato Neto também é o autor da ideia de um “disco movimento”, e a música “Geléia Geral” foi gravada no LP “Tropicália ou panis et circensis”, em 1968, pela Philips, ao lado de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Tom Zé, Nara Leão, Capinan, os Mutantes e Rogério Duprat.

GELÉIA GERAL
Gilberto Gil e Torquato Neto

Um poeta desfolha a bandeira e a manhã tropical se inicia
Resplandente, cadente, fagueira num calor girassol com alegria
Na geléia geral brasileira que o Jornal do Brasil anuncia
Ê, bumba-yê-yê-boi ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê é a mesma dança, meu boi

A alegria é a prova dos nove e a tristeza é teu porto seguro
Minha terra é onde o sol é mais limpo e Mangueira é onde o samba é mais puro
Tumbadora na selva-selvagem, Pindorama, país do futuro
Ê, bumba-yê-yê-boi ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê é a mesma dança, meu boi

É a mesma dança na sala, no Canecão, na TV
E quem não dança não fala, assiste a tudo e se cala
Não vê no meio da sala as relíquias do Brasil:
Doce mulata malvada, um LP de Sinatra, maracujá, mês de abril
Santo barroco baiano, superpoder de paisano, formiplac e céu de anil
Três destaques da Portela, carne-seca na janela, alguém que chora por mim
Um carnaval de verdade, hospitaleira amizade, brutalidade jardim
Ê, bumba-yê-yê-boi ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê é a mesma dança, meu boi

Plurialva, contente e brejeira miss linda Brasil diz “bom dia”
E outra moça também, Carolina, da janela examina a folia
Salve o lindo pendão dos seus olhos e a saúde que o olhar irradia
Ê, bumba-yê-yê-boi ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê é a mesma dança, meu boi

Um poeta desfolha a bandeira e eu me sinto melhor colorido
Pego um jato, viajo, arrebento com o roteiro do sexto sentido
Voz do morro, pilão de concreto tropicália, bananas ao vento
Ê, bumba-yê-yê-boi ano que vem, mês que foi
Ê, bumba-yê-yê-yê é a mesma dança, meu boi

Bom de briga, o poema de Limongi vai em busca do afago do infinito 

Tribuna da Internet | “Quando o sonho do poeta desaparece e já não alcança a porta da alma…”

Vicente Limongi, jornalista e poeta

Paulo Peres
Poemas & Canções

Para o jornalista e poeta amazonense Vicente Limongi Netto, radicado há anos em Brasília, finalizar um poema é semelhante às “Dores do Parto”.

DORES DO PARTO
Vicente Limongi Netto

Poema bom demora a ficar pronto
trava momentos
ilude palavras
trapaceia o raciocínio
não existe aceno mágico
para alcançar o poema perfeito
é preciso serenar o tempo
ninguém é algoz de lembranças
o belo avança sem avisar
nasce indignado
filho amado e encantado
repele impurezas
tem asas amorosas
explode sentimentos
bom de briga
vai em busca do afago do infinito

Para sonhar nesta inglória vida, é preciso viajar no ideal da pureza

Paulo Peres
Poemas & Canções

A professora e poeta paranaense Helena Kolody (1912-2004), no soneto “Sonhar”, explica o tamanho do ideal, da viagem e da pureza de que necessitamos para sonhar neste mundo.

SONHAR
Helena Kolody

Sonhar é transportar-se em asas de ouro e aço
Aos páramos azuis da luz e da harmonia;
É ambicionar o céu; é dominar o espaço,
Num vôo poderoso e audaz da fantasia.

Fugir ao mundo vil, tão vil que, sem cansaço,
Engana, e menospreza, e zomba, e calunia;
Encastelar-se, enfim, no deslumbrante paço
De um sonho puro e bom, de paz e de alegria.

É ver no lago um mar, nas nuvens um castelo,
Na luz de um pirilampo um sol pequeno e belo;
É alçar, constantemente, o olhar ao céu profundo.

Sonhar é ter um grande ideal na inglória lida:
Tão grande que não cabe inteiro nesta vida,
Tão puro que não vive em plagas deste mundo.

“Triste é viver na solidão, na dor cruel de uma paixão”, cantava Tom Jobim

Tom Jobim tem seis entre as 10 músicas mais gravadas de todos os tempos no  Brasil - Metro 1

Tom Jobim, o grande mestre da MPB

Paulo Peres
Poemas & Canções

O maestro, instrumentista, arranjador, cantor e compositor carioca Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim (1927-1994) é considerado o maior expoente de todos os tempos da música brasileira e um dos criadores do movimento da bossa-nova, no qual compôs inúmeras músicas, entre elas “Triste”, cuja letra fala de uma paixão não correspondida que acaba em solidão. A música foi gravada no Álbum Elis & Tom, em 1974, pela Polygran.

TRISTE
Tom Jobim

Triste é viver na solidão
Na dor cruel de uma paixão
Triste é saber que ninguém
Pode viver de ilusão
Que nunca vai ser, nunca vai dar
O sonhador tem que acordar

Tua beleza é um avião
Demais prum pobre coração
Que pára pra te ver passar
Só pra me maltratar
Triste é viver na solidão