Géssica Brandino
Folha
A busca e apreensão realizada pela Polícia Federal nesta terça-feira (18) na residência do casal Roberto Mantovani Filho e Andreia Munarão, investigado por hostilidade ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes e familiares no aeroporto internacional de Roma, foi questionada por especialistas em Direito ouvidos pela Folha.
A decisão da presidente do Supremo, ministra Rosa Weber, autorizando o procedimento está sob sigilo. Por causa disso, não há conhecimento sobre o conjunto de indícios que justifiquem a ação.
DISSE O MINISTRO – Na última sexta (14), o ministro relatou ter sido chamado na Itália de “bandido”, “comunista” e “comprado” por um grupo e que seu filho – o advogado Alexandre Barci de Moraes, 27 anos – sofreu uma agressão, fazendo com que os óculos caíssem no chão.
A PF afirmou que cumpriu os mandados “no âmbito de investigação que apura os crimes de injúria, perseguição e desacato praticados contra ministro do STF”. Foram apreendidos um computador e um celular.
Embora a agressão tenha sido repudiada, com base nas informações que são públicas até agora especialistas afirmam que as condutas dos suspeitos só poderiam, em tese, ser enquadradas como crimes contra a honra, lesão corporal ou vias de fato, como são chamados atos agressivos que não atinjam a integridade física e são crimes sem gravidade.
PENAS MÍNIMAS – Esses crimes são de menor potencial ofensivo, com penas de até um ano e aplicação de multa, com o agravante de terem sido cometidos contra um agente público.
A advogada e professora de direito penal da USP Helena Regina Lobo afirma que há uma discussão sobre a possibilidade de enquadrar os fatos como crime contra o Estado democrático de Direito. “Não me parece haver uma tentativa de abolição do Estado democrático de Direito a partir das condutas —a não ser que se comprove que elas estão inseridas num contexto maior. Além disso, não me parece haver vinculação com o contexto das condutas de 8 de janeiro, o que também dificulta a classificação.”
A mesma interpretação é feita pelos demais especialistas. Raquel Scalcon, advogada e professora de direito penal da FGV Direito SP, afirma que “por mais desagradáveis que sejam os fatos, não significam uma tentativa de abolir a democracia ou impedir o adequado funcionamento dos Poderes constituídos”.
É UM EQUÍVOCO – A professora de direito penal do Insper e advogada Tatiana Stoco também considera a classificação indevida, assim como a de perseguição, por pressupor uma continuidade da ação e não um encontro fortuito, como parece ser o caso, diz.
“O episódio é mais uma evidência lamentável do grau de hostilidade contra ministros do Supremo Tribunal Federal, fruto da polarização política instalada no país há alguns anos. No entanto, do ponto de vista jurídico-penal, classificar esse episódio como um ataque ao Estado democrático de Direito me parece um equívoco.”
Para o presidente do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), Guilherme Carnelós, a busca e apreensão foi uma resposta mais truculenta do que aquilo que virou o motivo do ataque.
BALA DE CANHÃO – “Como a busca e apreensão ferem o direito à intimidade, um valor constitucional, ela só deve acontecer quando é estritamente necessária e não pode ser uma medida inicial de investigação. É o Supremo Tribunal Federal agindo como vítima e querendo matar formiga com bala de canhão, o que é absolutamente desproporcional”, disse Carnelós.
Raquel Scalcon, da FGV, afirma que é difícil ver a busca como algo urgente, já que era possível fazer a apuração pelas imagens das câmeras e depoimento de testemunhas.
A preservação das imagens das câmeras de segurança do aeroporto de Roma foi solicitada pela PF para averiguar a conduta de brasileiros alvos de investigação. Esse pedido é feito por meio de cooperação internacional, e a versão dos acusados será confrontada com essas gravações.
PRIMEIRA INSTÂNCIA – O presidente do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), Renato Vieira, acrescenta que há ainda um problema de competência. O caso deveria ser conduzido na primeira instância, porque o empresário suspeito e demais envolvidos não têm foro especial, diz ele.
“Pelo que nós temos notícia, a competência não poderia ser do Supremo para estabelecer medidas como essas. Na inexistência de indícios que justifiquem, o feito deveria ser processado pela Justiça de primeira instância”, afirma.
Helena Lobo, da USP, diz que a representação de Moraes não é suficiente para atrair a competência da corte, o que seria possível se houvesse uma prova, ainda que testemunhal, de que o episódio de hostilidade faz parte de algo que coloque em risco o Estado democrático de Direito.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Em tradução simultânea, está tudo errado. O Supremo faz papel feio ao atribuir crimes gravíssimos a quem apenas xingou Alexandre de Moraes. E o pior é que a imprensa amestrada dá a maior força e esse tipo de denúncia exacerbada e delirante, levantando até a suspeita de que os manifestantes do aeroporto estariam envolvidos no financiamento de atos antidemocráticos. Realmente, parece que o Supremo e a imprensa não têm medo do ridículo. (C.N.)