
Charge do Nando Motta (brasil247.com)
Pedro do Coutto
O general Augusto Heleno compareceu à CPI do Congresso tentando se transformar numa testemunha de defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro na tentativa de golpe contra a democracia e contra o governo Lula da Silva, eleito pelas urnas de outubro, munido de um habeas corpus preventivo do ministro Cristiano Zanin que lhe garantia usar o silêncio quando bem entendesse.
O general Augusto Heleno, inicialmente, tentou se esquivar da convocação, mas não foi atendido pelo ministro Zanin, obtendo apenas o direito ao silêncio em pontos que julgasse críticos para si. Mas resolveu falar e responder a várias questões, e silenciar sobre outras. Silenciou, por exemplo, quando perguntado se havia tomado conhecimento sobre uma reunião de Jair Bolsonaro com comandantes militares propondo um golpe de Estado.
SILÊNCIO – No caso, evidentemente, o silêncio representou uma confirmação clara do episódio porque se ele buscava ser uma testemunha de defesa, se o fato não tivesse ocorrido ele seria o primeiro a contestá-lo. Não o fez. Houve momentos de atrito durante o depoimento que se estendeu por mais de oito horas, e transmitido diretamente pela GloboNews. No final da tarde, deputados e senadores ligados ao bolsonarismo saíram em defesa do general dizendo que a sua atenção à frente do Gabinete de Segurança Institucional foi ótima para o país.
Nesta turma, destacou-se o senador Sergio Moro que chegou a fazer uma comparação entre a invasão de Brasília e as depredação no dia 8 de janeiro, durante o governo Lula, com a não ocorrência de atos de vandalismo praticados enquanto o general Augusto Heleno era ministro do GSI. Moro, assim, adicionou um personagem ao seu desempenho no cenário nacional.
Foi o juiz do escândalo da Lava Jato, foi o ministro da Justiça de Bolsonaro, foi obrigado a se demitir em janeiro de 2020 pela investida de Bolsonaro contra ele na reunião ministerial, foi o assessor de Bolsonaro contra Lula da Silva na TV Globo e, agora, colocou-se ao lado de Augusto Heleno. As mutações são muitas e se revelaram ontem com intensidade e nitidez.
DESQUALIFICAÇÃO – Augusto Heleno procurou desqualificar a delação do tenente-coronel Mauro Cid sobre a participação dele na reunião do Alto Comando Militar. Mas foi desmentido pela foto exibida sobre uma reunião do Alto Comando na qual ele estava presente. É claro que o ex-ajudante de ordens não poderia participar da reunião do Alto Comando, mas, conforme a foto provou, estava presente nos trabalhos. Foi na condição de testemunha que ele propôs a delação negociada.
Augusto Heleno, no final da ópera, transformou-se, conforme eu disse, em testemunha da acusação, pelo silêncio e pela sua presença. As edições de ontem, O Globo, a Folha de S. Paulo e o Estado de S. Paulo publicaram amplas reportagens sobre o depoimento. No O Globo, matéria de Camila Tortelli. No Estado de S. Paulo, de Weslley Galzo, Augusto Tenório, Gabriel de Sousa e Monica Gugliano. Na Folha de S. Paulo, de Thaísa Oliveira.
Foi uma página importante na história da tentativa subversiva, pois o general Augusto Heleno apenas confirmou o acontecimento. Não teve condições interiores para negá-lo. Tentou escapar pelo silêncio. Não conseguiu. A CPI do Congresso reunindo deputados e senadores encerrará as suas atividades na próxima semana. Os fatos são o seu acervo real.
APAGÃO – A versão do Operador Nacional do Sistema sobre o corte de energia ocorrido em 15 de agosto de que a falha que interrompeu o abastecimento foi causada por geradoras eólicas e solares no Nordeste não convenceu o especialista Mário Veiga, acentuando que ocorreu um desalinhamento que não se explica pela geração de energia eólica e solar.
O problema ocorreu numa linha de transmissão do Ceará, mas afetou o Sudeste do país. O desligamento do sistema poderia ter sido restrito a uma área nordestina. Mário Veiga disse que houve um problema sério de desalinhamento de informação. O ONS foi apanhado de surpresa.
APOIO – Fernanda Perrin, Folha de S. Paulo de ontem, destaca a inusitada presença do presidente Joe Biden junto aos grevistas da GM, da Ford e da antiga Stellantis no centro automotivo de Detroit. Foi a primeira vez na história norte-americana que um presidente da República participa de um movimento grevista.
A atitude ajusta-se às eleições do próximo ano e decorre do fato de que as pesquisas apresentaram desempenho ruim do presidente. Ele estaria, segundo o Washington Post, atrás de Donald Trump. É claro que Biden não está firme na campanha e até tem dado sinais públicos de ter sido afetado pela idade. Ele está com 80 anos. Mas, se a situação de Biden não é boa junto ao eleitorado, a situação de Trump, a meu ver, está pior junto à Justiça.
As acusações se sucedem e agora a Justiça de Nova York aceitou denúncia sobre superestimativa do patrimônio com o objetivo de permitir acesso do grupo Trump a créditos bancários de níveis muito altos traduzidos em bilhões de dólares. Não é possível que alguém com tantas acusações contra si possa se candidatar livremente à Presidência do país.